Celebrou-se “o dia dos namorados” ou o
dia de S. Valentim, no passado dia catorze. Subitamente, há apaixonados mais
entusiastas que se desdobram em gestos de carinho comercial e rumam às lojas e
supermercados em busca de bombons, flores, porta-retratos e ursos fofinhos que
seguram um coração que diz “I love you”! Isto para quem o dinheiro não abunda,
pois também se pode sempre engrandecer a data e procurar presentes mais caros e
condizentes com a ocasião. De repente, uma experiência gastronómica
extravagante ou quiçá uma viagem com direito a massagem e spa.
Se há mal nestes gestos? Absolutamente
nenhum. A mim apenas me soam a falso. Temos esse comportamento, porque nos
queremos manter cúmplices e alimentar o romance sem o qual as relações definham
e, para isso, qualquer altura é ótima ou apenas se cumpre com um ritual
instituído e arranja-se qualquer coisa para não parecer mal?
Não celebro, habitualmente, o São
Valentim, porque se cuidasse do meu enamoramento apenas nesse dia, ele estaria,
por certo, votado ao fracasso. Assim, cá em casa, é São Valentim todos os dias
do ano, uns com mais chama do que outros, como acontece em todos os lares. Mais
do que estar preocupados com o novo swatch que se pretende oferecer ao parceiro,
focamo-nos nos gestos do quotidiano que fazem com que uma vida a dois valha a
pena. Sinceramente, é bem mais importante que o meu marido seja um habitante da
casa e não um convidado, pelo que se partilham os afazeres domésticos. Sabe-me
bem melhor chegar a casa no fim do dia de uma sexta-feira e encontrá-la já
limpa e arrumada, por saber que os sábados entre as atividades dos dois filhos,
ajudas extra que se dá a alunos, almoço e jantar são uma correria só. Ter que
fazer tudo isso e ainda limpar a casa e passar a ferro é obra! Às vezes também
acontece, mas sempre que o pai de família está em casa, consciente desta rotina
desgastante, alivia a pressão com a limpeza. Fica a gastronomia e o engomar
para quem de direito…
Para mim, esta preocupação constante e
genuína vale bem mais do que qualquer presente. Seria bem mais fácil comprar um
lindo ramo de rosas uma vez no ano e esquecer todas as outras obrigações ao
longo do restante! Não, muito obrigada! Parece a história dos casais que se
agridem verbal e fisicamente na véspera e vão jantar no dia de S. Valentim! Poderia
apostar que o santo que lhe deu o nome, condenado à morte por casar os
apaixonados, cheio de bondade e coragem, apesar da proibição de Cláudio II,
imperador de Roma, vendo tal fenómeno, descasá-los-ia de imediato!
É-me difícil aceitar certas hipocrisias.
O amor e afeto genuíno são construções diárias que exigem dádiva, tolerância e
perdão mútuo. Exigem que se olhe mais para o outro do que para si mesmo e seria
muito importante que as pessoas entendessem que se ambos não estiverem
dispostos a abandonar os comportamentos egoístas, os relacionamentos tendem a
falecer e não é o dia de São Valentim que os vai salvar!
Assim, todos os dias são uma página em
branco que deve ser reescrita, preferencialmente, sem o erro cometido anteriormente,
mas não há garantias e todo o ser humano é falível. Então, são necessários o
perdão, a tolerância e a compaixão paciente do parceiro que se alimenta do
mesmo comportamento que vê refletido no reverso da medalha. Quem dá também quer
receber e se no amor não houver efeito boomerang, mais tarde ou mais cedo, a
fonte seca e onde antes corria água límpida, cristalina e vibrante, que
refresca os que a rodeiam, passa a existir terreno árido e inóspito, incapaz de
acolher vida!
O dia de São Valentim, à semelhança do
Natal, será sempre que o Homem quiser! Os gestos de carinho não precisam de
data marcada! Qualquer dia é oportuno e até pode ficar mais barato, se em vez
de oferecermos coisas, nos oferecermos sem reservas a nós mesmos, as nossas
palavras, as nossas músicas, construindo juntos uma sinfonia, um poema ou um
bailado. Haverá algo mais belo?!
Nina M.
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