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sábado, 25 de maio de 2019

Crónica de Maus Costumes 133


Mulheres

            Tenho muito orgulho nas mulheres da minha família. Hoje, quando o meu filho me perguntou se já tinha tema para a crónica que ainda tinha de escrever e lhe disse que sim e o assunto, questionou: “Então não vais escrever nenhuma sobre os homens?” “Provavelmente, não.” Respondi. Dou-me conta de que a minha família, talvez como uma boa parte delas assenta numa forte base matriarcal. As mulheres da minha família materna são espantosas. Falo no presente e algumas delas já desapareceram, não desaparecendo, porque se inscreveram na memória e quando isso acontece, dá-se a imortalidade, ainda que esta seja visível aos olhos de poucos. São aos meus e chega-me.
            Começo por recordar a minha avó Matilde, de quem a minha filha herdou o nome. Era analfabeta e tecedeira de profissão. Temos mantas e colchas tecidas pelas mãos da avó, no tear de madeira que me parecia enorme e onde dormia, ainda bebé, tanto quanto sei, tardes inteiras, embalada pela música ritmada do tear. Depois, dava más noites, segundo consta e não me custa nada imaginar que me faltava o compasso certo do tear ou seria a minha condição de notívaga a fazer-se sentir, desde cedo. Agora nem tanto, porque a vida, carrasco impiedoso, não o permite.
            A minha avó analfabeta e tecedeira, e que eu julgava que um dia ainda ia ensinar a ler e a escrever, respondia-me que “burro velho não toma andadura”. Era uma mulher austera e de poucas falas. No entanto, mostrava uma paciência infindável para me fazer comer, acabando, invariavelmente, por subornar a minha falta de apetite, com refrescos de vinho branco. Consistia na delícia de um copo cheio de água com um cheirinho de vinho e uma ou duas colheres de açúcar. Bem bom! Como diria o meu afilhado mais novo. Era a parteira da Freguesia e a única que domava o Sr. Vitorino, nos dias em que a demência era tão forte que se punha a percorrer as ruas todo nu. A sra. Ana (esposa) recorria à minha avó, que considerava que os tolos também se ensinam e de vergasta de videira na mão, que terá usado uma vez, lá o fez vestir-se e respeitar os bons usos e costumes. A partir daí, sempre que ouvia a minha avó, apressava-se a obedecer-lhe. Dizia-lhe: “ És boa tecedeira, és, mas quando te dá para teceres ao contrário…” Talvez o seu legado mais forte tenha sido a obrigação ética de ajudar o próximo, sempre que nos for possível. Era filha de segundas núpcias por parte do pai, no tempo de fome imensa. Tão mais fome se passava quanto mais alargado era o agregado familiar. A minha avó tinha uma meia-irmã, a minha tia Luzia, mulher muito bela, a quem fizeram uma filha e um desgosto. Criou-a sem pai. Tornou-se criada de servir, no Porto, para ganhar o sustento. Fê-lo estoicamente. Lembro-me de a ver passar, sempre com chinelos velhos, de dedo, um de cada cor e de julgar que ela devia ser tão pobre que nem dinheiro tinha para uns chinelos novos! Muito mais tarde soube que eram os esporões que lhe consumiam os pés e, tal como a Gabriela, não suportava os sapatos. Trazia-nos framboesas sempre que passava por nossa casa enquanto dava dois dedos de conversa com a sobrinha (minha mãe) e a irmã (minha avó).
            A minha Tia (a filha mais velha), matriarca que substituiu a minha avó, que morreu quando eu tinha apenas nove anos, seguiu-lhe as pisadas. Exemplo de tenacidade e resiliência, criou os seus cinco filhos sozinha, após a morte precoce do marido, aos quarenta anos. Uma mulher de trabalho, sempre disposta a ajudar, com uma capacidade de sacrifício incrível! Só havia um problema: tinham todos que bulir cedo, porque ela, ao romper do sol, já estava desperta. Coitado do meu primo, o filho mais novo, mesmo que quisesse dormir um pouco mais ao sábado e domingo, era um castigo! Levantar às 08:00 já era um abuso! Motivo para lhe chamar podricão e sei lá o que mais! Tudo suportou com uma força incrível. Era a conselheira da família, muitas vezes em jeito de descasca, se achasse merecido. Para mim e os meus irmãos é apenas a Tia (também já não está presente fisicamente, mas não a esquecemos). Aquela que sem nome se faz conhecida de todos e continua bem viva connosco.
            Gosto de pensar que alguma dessa genética me corre nas veias: a resiliência, a tenacidade e a força de carácter. Um terço do que foram já me chegaria. Eram maiores do que as suas circunstâncias. Admiráveis! Todas elas religiosas e de fé inabalável. Eu não o serei tanto e terei uma fé mais crítica, mas quero pensar que almas assim não terminam com o corpo. Não sei o que lhes acontece e não me apetece muito descobrir de momento. Teria que morrer e seria um aborrecimento… Gosto de pensar que há algo para além deste tempo que não me chega e me parece tão finito! Alguém que vai ler estas linhas há de sorrir, neste momento, e pensar “Lá está ela e as suas esperanças infundadas construídas unicamente sobre os alicerces do seu otimismo!”
Talvez seja, mas ainda assim, quero a existência de uma outra dimensão transcendental que me permita ser a melhor versão de mim, um “porto” cem anos, que enquanto por cá vagueou esteve a fazer um estágio de aperfeiçoamento, a preparar-se para o devir.

Nina M.  



sexta-feira, 24 de maio de 2019

Cotovia

Não se aprisione pássaro livre e liberto
Cotovia serena de belo canto
Que se ergue ao céu em transcendência plena
Que de tão alto se elevar se enche de espanto
As asas não são as de Ícaro nem os pés de barro
Se a puxam e ela cai a pique em manobras desnorteadas
 Não se entrega vencida no cansaço da luta
Pássaro ferido que renasce da labuta
Maior do que a dor e das suas circunstâncias
Maior do que o tempo dos homens 
Fénix renascida das esperanças
No fecundo amor e de suas penas
Eis o seu canto cristalino, límpido e diáfano
Impõe-se sobre o mar, as estrelas e a lua
Sobre o Homem desalmado e de alma crua
Voa, pássaro ferido! Voa pela vida fora
Essa existência nobre e dura e que é a tua!

sábado, 18 de maio de 2019

Crónica de Maus Costumes 132


Livros


            Soube hoje (o facebook tem os seus encantos) que Einstein preferia oferecer livros a flores. Estas murcham rapidamente e há livros que permanecem uma vida! Se dúvidas houvesse no que concerne a inteligência do homem, com esta tirada, ficariam totalmente dissipadas.
            As flores são bonitas, de facto, mas eu é que sou como o outro… eu é mais livros! Provavelmente, tenho mais do que aqueles que conseguirei ler durante a vida e agora, com a idade, há certos vícios que vamos controlando melhor. Um bibliómano que se preze deve ter o mesmo problema que eu… dar-se conta de que comprou um livro repetido… Afinal tinha-o, mas tinha perdido o rasto, porque às vezes não é fácil encontrar títulos, no meio da profusão. Eu estimo os livros. Na verdade, namoro-os e como namorada ciosa, gosto de os acariciar e guardá-los para mim. Perdoem-me a franqueza, mas detesto campanhas de recolha de livros que já não servem! O quê?! A mim servem-me todos os que tenho e não dispenso nenhum, mesmo que nem o venha a ler… Reconheço-me, portanto, uma bibliómana poligâmica e ciumenta! Paciência…
            De momento, passeio um clássico. Vladimir Nabokov anda comigo, assim como o seu Humbert Humbert e a pequena Lolita. Esperava detestar veementemente o pedófilo, enojada com tal compostura, porém, a literatura, tem a proeza de nos fazer olhar o revés do hediondo e de nos pôr a tentar compreender. Não significa aceitar ou concordar, apenas a perceber certas motivações do comportamento humano, por horrível que este seja. Talvez por saber que é ficção, mas as personagens ficcionadas têm a mania de se me colarem à alma e não me largarem. Algumas para sempre. Eu queria repudiar o odioso Humbert Humbert, o pervertido, e dou comigo a sentir compaixão, pelo facto de ele viver um amor-obsessão que o cega, destrói e o leva a corromper a pequena ninfeta. Os clássicos são extraordinários na densidade das personagens! Não admira que o Humbert Humbert seja considerado uma das melhores personagens da história da literatura. Tão odioso e tão magnificamente pincelado!
Nabokov fala de sexo e de desejo erótico de forma elevada e elegante, sem recurso ao jargão e à ordinarice. Sublime. De cada vez que volto a um clássico, fico sempre com a impressão de que saio a ganhar. Sem modernices de polifonias, que às vezes confundem e dificultam a leitura, num texto escorreito, límpido, mas denso como o peso da vida, como convém, ninguém fica indiferente à prosa e tanto nos compadecemos do malvado pederasta quanto da menina demasiado precoce e atrevida.
Os livros são, por isso, uma imensidão de mundos que nos são oferecidos. Retratam a mísera e vil condição humana. Ler é olhar para dentro e enfrentar, muitas vezes, demónios; é perder-se nos outros para se encontrar, reconhecer-se nos erros e nas valentias, aprender a viver sem julgar apressadamente; é saber que não estamos imunes nem à desgraça nem à desonra e tentar não escorregar como as personagens mais torpes. Enquanto não se perceber esta ideia, a leitura e o livro serão sempre incompreendidos.
Nina M.
           




quinta-feira, 16 de maio de 2019

Quando ela vier

Quando ela vier...
Quando ela me levar...
De mansinho
Quem sabe repentinamente
Tanto faz!
Sabei que levo comigo tudo quanto amei
Quanto amei! Como amei!...
Com a fúria de ventos e águas
Marés cheias e vazas
Ao sabor dos caprichos da lua!
Não me enclausureis 
Não quero masmorras nem mausoléus
Dai-me a liberdade verdejante
Sob um pasto farto e fecundo
A servir-me de túmulo.
Prescindo do epitáfio
E de meus ossos desfeitos
Transformados em pó
Surgirá húmus fértil
Semente profícua a céu aberto
A teimar que não foi em vão.

sábado, 11 de maio de 2019

Crónica de Maus Costumes 131


Diversão não deveria ser indignidade

                À luz do que vem sendo habitual, nos últimos anos, esta semana, a Internet ficou pejada de imagens de jovens universitários, que supostamente se divertem numa Queima. Resistirei à tentação de cair num discurso moralista e puritano e até mesmo paternal. Também já tive as minhas queimas. Frequentei todas e diverti-me muito! Também nesse tempo havia excessos cometidos por uma juventude que fervilha de vida e que o corpo, demasiado pequeno, não consegue suster. É a lei da vida. É natural que assim seja.
                No entanto, a natureza da diversão divulgada impressiona qualquer um. Jovens mulheres seminuas, em plena posse das suas faculdades, que se deitam deliberadamente em cima de um qualquer balcão, com paparazzis de serviço que divulgam in loco o acontecimento nas redes sociais, parece-me tudo menos diversão. São imagens e pequenos filmes de cariz sexual feitos sem o mínimo de privacidade e de respeito pela própria intimidade. Desde shots estrategicamente colocados entre os seios e que jovens rapazes e raparigas vão buscar com a boca, numa espécie de jogo, para ver quem consegue beber sem pegar no copinho com as mãos, a beijos ostensivos entre belas meninas, quais Safos de quem se desconhece a poesia, até imagens mais degradantes em que, à frente de um grande público, se vê um jovem a beber da púbis da menina, que jaz deitada e sorridente, mesmo sabendo-se filmada ou outra que, de seios a descoberto, permite que a acariciem e escrevam sobre a pele, enquanto se veem umas mãos que passeiam freneticamente entre pernas… Tudo isto se pode encontrar…
Ora, a mim, para me parecer diversão, teria de ficar na esfera privada de duas pessoas, que partilham a sua intimidade.
                Ao ver as imagens lembrei-me dos cínicos da antiguidade, dos filósofos tão naturalistas que caíam no engano de viver como animais, também eles satisfazendo as suas necessidades eróticas em praça pública!
                Questiono-me o que leva as jovens a tal comportamento. Jovens mulheres que se deixavam acariciar e filmar com satisfação perante olhares indiscretos, como se fosse um comportamento natural! Um arrepio percorre-me a alma. Em primeiro lugar, porque sou mulher e, depois, porque sou mãe! Talvez um dia, queira mostrar este texto à minha filha, para que ela não confunda diversão com indignidade. Tal comportamento não é rebeldia, não é ser ousada e muito menos moderna! Revela apenas uma enorme falta de respeito por si mesma, objetificando-se, transformando-se numa coisa em que qualquer um pode tocar!
 Se algum dia te quiser mostrar estas linhas, filha, sabe que a mãe não é nem moralista nem puritana e nem feminista. Apenas considera a mulher um ser divino, a obra mais perfeita de Deus, se Ele existir. A mulher é elegância, beleza e sensualidade, não é um pedaço de carne que qualquer um pode pegar. No entanto, os outros só te poderão ver assim, se tu te vires assim primeiro e, para isso, a preservação da tua intimidade é crucial. É muito bom entregarmo-nos a alguém e todos os jogos, desde que desejados por ambos, poderão ser admissíveis, mas no recolhimento e na privacidade de quem se quer muito bem. Este comportamento não dignifica a mulher e põe em causa o respeito que ela almeja conquistar.
                Não deixa de ser curioso o facto de que todas as imagens perturbadoras que vi serem de meninas. Não vi rapazes nus em poses provocatórias e a ostentar o que quer que fosse! Serve para provar o quê?! Que a mulher é dona do seu corpo e pode fazer com ele o que bem entender?! Que a mulher tem o mesmo direito à liberdade sexual que o homem?! Ou apenas parvoíce de uma idade em que não se medem as consequências e em que não se lembra que uma vez na Internet, na Internet para sempre?!
                Quanto aos voyeurs que não resistem a colocar tudo quanto veem no mundo digital, mesmo que se trate da vida alheia, talvez fosse melhor arranjar algo de útil e de produtivo para fazerem…
                O que vi não foi um excesso de juventude, foi uma obscenidade feita de forma consciente e com alegria pateta que apenas expõe ao ridículo quem se prestou a tal papel e, por mais compreensivos que possamos querer ser, não é comum ver-se mulheres a levantarem camisolas, enquanto afagam os seios nus em troca de uma bebida gratuita!
                A sério, meninas?! As prostitutas são mais caras e mais dignas!

Nina M.









quinta-feira, 9 de maio de 2019

Quero que a tristeza me embale

Quero que a tristeza me embale
Tome conta de minha alma nua
Acaricie as minhas entranhas amargas
Me console do medo da solidão
Nesta noite fria e demorada
Vou sentir o fio da lâmina fina e afiada
Numa valsa válida e sensual
Roubar-me só da imperfeição amargurada
Não me leve a angústia amiga
De que é feita a vida sem ilusões
Não me leve a poesia do olhar
Nem a harmonia de minha voz...
Quero uma tristeza crua para me embalar
Devolver-me ao sopro perdido
À minha ténue liberdade, à minha vida desmedida


sábado, 4 de maio de 2019

Crónica de Maus Costumes 130


Perda de tempo

            Tentei resistir ao assunto da ordem da semana : recuperação integral do tempo de serviço de professores, o número mais conhecido de Portugal 942! Naturalmente, se efetivamente se verificar, nada mais justo. Ver-se-ia cumprida uma promessa que o governo se apressou a fazer, mas tardou em cumprir.
            Aborrece-me o assunto por ler e ouvir sempre o mesmo teor de comentários e as birrinhas de politiqueiros há muito desprovidos de ideal, que se dizem muito defensores das liberdades de abril, mas que na primeira oportunidade, perante uma democracia que os contraria, ameaçam bater com a porta e acenam com a suposta terrível situação de termos um país à deriva, sem governação!
A sério, senhor primeiro-ministro?! Acha mesmo que os portugueses se preocupam com esse facto, se o país, nos últimos anos, mais parece um manicómio em autogestão?! Por favor, tenha um pingo de decência! É que já teve melhores oportunidades para apresentar demissão por imperativo de consciência, sabe?! Quer que lhe lembre a tragédia de Pedrógão?! Sim, com certeza, foi uma fatalidade terrível, mas também Édipo a sofreu e não deixou de se sentir responsável.
A todos os outros que embarcam na fantasia de que os professores levarão o país à ruína, tenham juízo e indignem-se com o que deve ser fator de indignação: políticos corruptos, promiscuidade entre política e o setor financeiro, injeções de somas incomportáveis numa banca que financia e favorece meia-dúzia, etc., etc… Se os professores poderão abrir precedentes para outras lutas corporativas do setor público? Pois com certeza e com toda a legitimidade! Empenho e perseverança é o que se aconselha a enfermeiros, forças de segurança, entre outros… Não precisam é de usar o pseudoargumento de que os professores estão a ser beneficiados. Não estão! Apenas recuperarão o que é seu por direito. Insistam no vosso propósito sem invejar o alheio…
Quanto ao senhor primeiro-ministro, que tanto quis ocupar o poder, com a legitimidade que a constituição prevê, é um facto, mas com toda a imoralidade de quem não ganhou as eleições, esta fita é com que propósito? Fazer dos professores o bode expiatório usando da falácia para contaminar a opinião pública? Tratar-se-á de um plano ainda mais maquiavélico, no sentido de deteriorar a educação a tal ponto que não se eduque nada, já que uma população ignorante é facilmente manipulável? Não me diga que anda a ler Maquiavel…
Lembro só os recentes casos de eleições ganhas por populistas ignorantes e o crescendo da extrema-direita, na Europa. Estes movimentos radicais nunca surgem por acaso. A classe política tem uma grande responsabilidade no surgimento destes fenómenos, porém, enquanto país de brandos costumes e de politiqueiros profissionais, continua-se a assobiar para o lado… Depois, se no desespero e na desesperança a população vota atabalhoadamente ou nem vota, é o descalabro e o valha-me Deus!
De modo que por mim, se quiser pedir demissão, sinta-se à vontade. De qualquer forma, tenho a certeza de que surgirá novo messias no horizonte com vontade de governar este país ingovernável, com palavras esperançosas e vontade de se tornar uma glória nacional! Vira o disco e toca o mesmo! Nós, por cá, simples mortais trabalhadores, continuaremos a assistir a este estado de coisas impávidos e serenos, porque uma revolução com cravos é coisa difícil de se fazer e muito trabalhosa. Era até necessário que nos incomodássemos seriamente com as grandes questões nacionais e até quem sabe começar a valorizar a ética na política. Vejam só tal disparate!
Nina M.
           

quinta-feira, 2 de maio de 2019

Como me amas? - Perguntas

Como me amas? - Perguntas
Com a alma toda!
Com o sol do meu olhar
E o mar aberto do meu sorriso
Amo-te com vontade déspota
E o desespero de um condenado
Com as minhas ambivalências e contradições
Com mais alma na alma...
Amo-te com a renúncia de um rei
E a subserviência de um escravo
Amo-te mesmo quando não gosto de ti
E quando foi isso se não sei dizer?!
Amo-te com o peso do mundo
E com a leveza do ar
Amo-te assim, originalmente,
Num espanto maravilhado da existência
E neste encantamento sou livre.

Entristeço, amor, ao saber tua tristeza

Entristeço, amor, ao saber tua tristeza
Ver a tua angústia, aperta-me o peito
Não temas. Nada receies. É de minha vontade
Contigo partilhar o leito
Dá-me o riso do teu canto
A serenidade de um beijo leve e doce
Abandona a agonia de uma hora má
Junta-te a mim e à minha alma sã
De mãos dadas partiríamos
Para onde quer que fosse

Leveza

Se um amor dedicado pesar
E uma leveza surgir no horizonte
Que seja para da terra me levar
Em ascese absoluta seja fonte
Cavalo alado erigido ao céu
Nas suas asas me eleve e inspire
Assim nasce o verso belo, puro e cristalino
Seja água da cascata de um monte
E se essa leveza também pesar
Que me trespasse aérea e letal
O corpo quente de um simples mortal
Exalte o espírito e o transcenda
Em celeste e excelsa companhia
A leveza de tão leve que se renda
À serenidade e ao som da harmonia