Começo
o texto por uma declaração de interesses: sou professora e apartidária. Rios de
tinta têm enchido as páginas da imprensa escrita e há um ruído imenso
resultante de uma verborreia prosódica dos programas de comentário dos canais
generalistas.
Após a reunião entre o Ministério da
Educação e as várias forças sindicais, ambas as partes selaram um compromisso.
Na realidade, o que os sindicatos conseguiram para os professores foi uma mão
cheia de nada e a outra cheia de ilusões.
Esta pressuposição ganha contornos reais
quando ouvimos o Sr. Presidente da República declarar que ninguém deve ter a
veleidade de acreditar que tudo permanecerá igual após uma crise como a que o
país teve que suportar, pois é sabido que devemos retirar ilações das dificuldades
e corrigir o que de mal foi feito, a fim de se evitarem novos dissabores.
Acredito que o Sr. Primeiro-ministro, ao ouvir tal comentário, tenha rejubilado
e já deve ter agradecido a almofada que o ampara de uma possível queda de
popularidade provocada pela deceção causada nesta classe socioprofissional, se
bem que o mesmo já tivesse alertado para a necessidade de não comprometer
futuramente as contas públicas.
Todos compreendemos a preocupação, que é
legítima. Na verdade, os professores também concordam em tese com esse facto e
consideram que é fundamental manter as contas públicas controladas. Ao
contrário do que se pretende fazer crer, os professores não são uns
irresponsáveis alienados da realidade e, por isso, apenas requerem a
contabilização do tempo de serviço prestado e nunca foi exigido qualquer
pagamento de retroativos. Apesar desta postura, a classe docente tem sido
fortemente mimada com alguns atributos: incompetentes, miseráveis,
corporativistas cheios de privilégios, entre outros… A reação aos insultos é o
que me preocupa. É natural que perante tanta simpatia, se perca a paciência e a
meiguice, mas discordo que se escolha o instinto mais primário e irracional: o
insulto, ao invés de desmontar os argumentos apresentados, alguns deles, falsos.
A nossa formação e profissão assim o exigem. Ao ver as inúmeras respostas, nas
redes sociais, que caem no opróbrio fácil e pouco digno, sinto que essas
invetivas não me representam e expõem o que de pior há em nós. Mantenha-se a
serenidade, porque os combates verbais são vencidos com inteligência, não com
ofensas. Sei que a honestidade intelectual não tem existido por parte de quem
comenta, mas mostremos quem são os responsáveis pela educação em Portugal e
mantenhamo-nos efetivamente superiores a esses azedumes.
Bastaria apresentar o número elevado de
professores que auferem pouco mais de mil euros, os anos que levam até entrarem
nos quadros, os quilómetros percorridos, o afastamento da família e a
explicação cabal de que a progressão automática não existe, que para mudar para
determinados escalões são necessárias aulas assistidas, formação e a
classificação mínima de bom, de que as escolas dispõem de reais mecanismos para
sancionar efetivamente o mau profissional, assim o queira fazer.
Quanto aos doutos comentadores e
jornalistas, saibam que manipular a opinião pública com falsidades é imoral, é
uma ação bastante torpe. Essas pessoas serão responsáveis pelo olhar
desconfiado das crianças e jovens em relação ao seu professor. Contribuem para
a desvalorização da escola e retiram a autoridade do docente. Note-se que
autoridade é diferente de autoritarismo! Não confundamos os conceitos, porque
este último, felizmente, há muito se perdeu; a autoridade, infelizmente,
também… E não me refiro só à autoridade docente, mas à base de tudo: a
autoridade parental! Saberão porventura que em muitas escolas os professores
são a melhor referência que os alunos têm? São amigos, confidentes,
conselheiros, tutores… a voz da razão, o pilar de princípios e valores, em
contextos desfavorecidos e desestruturados?!
Esses senhores refletem essencialmente
um enorme desrespeito e ingratidão para com quem lhes abriu as portas para um
mundo novo, porque ninguém nasceu ensinado e as competências mais básicas, mas
importantíssimas, vão-nos sendo ensinadas desde o jardim de infância.
Desengane-se quem tem a suprema arrogância de julgar que o saber que comporta é
totalmente externo ao professor. Mentira. É intrínseco, goste-se ou não.
Sr. Primeiro-ministro, enquanto seres
pensantes, os professores já perceberam há muito que o intuito é impedir que
uma grande maioria alcance o topo de carreira. Façamos assim: sejam honestos e
admitam-no! Depois, reúnam com as forças sindicais e chegue-se a consenso!
Volto a insistir: nem todos podem alcançar o último patamar,
numa profissão onde todos exercem sensivelmente as mesmas funções?! Pois
bem, que todos possam aspirar ao máximo, conforme as possibilidades do
país. Seria um procedimento mais honesto, mais digno e mais aceitável. Ao
contrário de muitos, não considero que haja mentiras aceitáveis na política!
Nina M.
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