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domingo, 1 de abril de 2018

Crónica de Maus Costumes 17



Morreu Mário Soares, uma figura incontornável da política portuguesa. Como figura pública, esforçou-se até ao limite por não desaparecer da cena política, ainda que estivesse em modo de reforma.
Aqueles que assim se comportam estão sempre sujeitos a despoletar nos cidadãos dois tipos de sentimentos, semelhantes na intensidade, mas contraditórios no seu conceito: amor e ódio. Desde que Mário Soares adoeceu e se soube que se encontrava em coma profundo, as redes sociais foram invadidas tanto por comentários abonatórios como por julgamentos desfavoráveis. Algumas observações eram absolutamente cruéis, desnecessárias e boçais.
Desengane-se quem considere que estou a defender o senhor. Na realidade, nem simpatizava com a pessoa, mas há um limite e regras de educação que devem ser respeitadas em toda e qualquer circunstância. Não me parece aceitável insultar com recurso ao vernáculo alguém que se encontra moribundo, muito menos desejar-lhe a morte. Francamente, repugno tal comportamento. Podemos detestar a pessoa, porém, há que respeitar o seu estado e a preocupação dos seus familiares! Causa-me espécie que, usando como subterfúgio a frontalidade, se ofenda grosseiramente o outro! Esse comportamento não se designa de honestidade, mas antes de rudeza e crueldade!
Como já afirmei, eu não simpatizava com Mário Soares, mas reconheço-lhe dois gestos pelos quais os portugueses lhe devem estar agradecidos: a sua luta para implantar a democracia no país e a entrada de Portugal para a União Europeia. Estes seus gestos merecem respeito. Pena não ter a idade suficiente para o ver no seu melhor. No vinte e cinco de abril, ainda não era nascida e quando Portugal integrou a União Europeia, eu tinha tenra idade. A partir de então, o que li ou ouvi a seu respeito ou o que escutei de ele próprio, confesso que não me fascinou e muitas vezes me irritou!
A descolonização apressada e vergonhosa, o negócio dos diamantes que quase lhe custaram a vida do filho, as negociatas com a sua fundação, o aproveitamento pelo facto de o filho ter sido o presidente da Câmara de Lisboa, o apoio a José Sócrates, o puxar do tapete a Manuel Alegre, seu suposto amigo até àquelas malfadadas eleições, o enaltecimento de Hugo Chávez, numa das suas preleções, enfim, tudo péssimo!
Mário Soares reunia o que eu detesto e desprezo nos políticos em geral: a suma hipocrisia! A desfaçatez com que fingia preocupar-se com o Zé Povinho para depois, em pequenos gestos, provar o contrário. Estava mais para aristocrata arrogante do que para protetor do indefeso. “ O que está aqui a fazer?!”, “Desapareça, homem! Desapareça!”
Merecia que lhe respondesse que estava ali a cumprir ordens, a trabalhar para que dos descontos que fazia, uma parte fosse para pagar os salários dos políticos, inclusive o dele. Diz quem já lhe vigiou a casa, que o senhor não tinha o respeito suficiente para cumprimentar quem estivesse à porta, como se o polícia, ao invés de ser um instrumento do estado ao serviço de todos os cidadãos, pago por todos os contribuintes, fosse um seu vassalo particular, por ele pago! Mesmo assim, ditam as leis da cortesia e a consciência dos que são humanistas que se cumprimente e respeite quem nos serve.
Nos últimos tempos dava comigo a pensar que ou a idade o estava a deixar ensandecido ou a vaidade por aquilo que já fizera em nome da liberdade, associada à longa vida, lhe causavam a ideia de que podia dizer e fazer tudo quanto lhe apetecesse, como se tudo lhe fosse permitido!
A História ditará, daqui a muitos anos, o balanço da sua vida política, analisará a sua atuação que ficará nos seus anais.
Como o comum dos mortais, faleceu o homem, não o santo nem o demónio. Façam-se as exéquias e paz à sua alma.
Nina M.



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