Não consigo abandonar o
estado de perplexidade sempre que me deparo com a intolerância. É muito fácil
desprezá-la e condená-la, quando se trata de temas agregadores como questões
raciais, religiosas ou políticas, na sua génese. O problema surge quando no
quotidiano, durante os nossos afazeres, esta nos atropela, num descaramento
brutal e inclemente.
É fácil dizer-se eu sou tolerante. Não tenho nada contra os negros. Em
seguida, no trânsito, no futebol ou onde quer que seja gritamos: “Ó preto!
Desampara-me a loja!”. De facto, o discurso não se coaduna, muitas vezes, com
as nossas ações.
Flui-me o pensamento a propósito dos queixumes de alguns colegas de EMRC,
que sentem a sua disciplina menosprezada por muitos, incluindo colegas de
ofício, pelas opiniões emitidas de forma muito assertiva, às vezes a fugir para
a indelicadeza. O pensamento que lhes perpassa a mente será: Para quê fazer
perder tempo aos miúdos com esta disciplina que não lhes interessa para nada?
Outros, justificando a sua opinião com argumentos que julgam mais sólidos
dirão: Por que motivo num estado que se diz laico, se faculta uma disciplina de
cariz religioso? Já é tempo de acabar com a concordata! Para isso, teríamos de
promover o ensino das religiões das minorias, para haver igualdade.
Perante tal, será bom relembrar algumas questões, desde logo a não
obrigatoriedade da frequência da disciplina, resolvendo-se o problema da
tolerância para com quem professa outra fé e, por outro, o facto de a
disciplina, apesar do nome, não se centrar meramente na abordagem do
cristianismo e não ser, como alguns acreditam, uma catequese.
Em EMRC, os alunos também ouvem falar de outras crenças. Lembro-me que o
primeiro contacto que tive com os princípios de outras religiões foi em EMRC!
Enquanto professora, já acompanhei visitas de estudo de EMRC a um templo Hindu,
a uma mesquita e a uma sinagoga, exemplo de tolerância e de multiculturalidade.
Talvez seja bom refletir sobre o facto de a nossa identidade, enquanto
portugueses e europeus, assentar numa matriz judaico-cristã! Assim sendo, a
existir uma disciplina em que os valores e princípios transmitidos e que são
veiculados também pelas várias religiões, que a escolha recaia sobre a fé que a
maioria do país em questão professa!
Devo dizer que há professores de EMRC extraordinários e que desenvolvem
projetos interessantíssimos com os seus alunos, procurando fomentar e
desenvolver a sua componente humanista, na defesa de valores como a tolerância,
a generosidade, o aperfeiçoamento constante de si próprio que o ser humano deve
procurar. A mim, parece-me que o mundo está sedento destes valores e de gente
que seja capaz de os defender.
Não compreendo, portanto, a malquerença por parte de alguns, até porque só
está nessa sala quem quer! Muito me apraz ouvir o meu pequeno dizer que de
todos os professores, aquele de quem mais gosta é o de Moral! Espero que o
professor me complemente na tarefa de lhe transmitir princípios que também são
cristãos, mas antes de tudo são humanistas, que me ajude a passar-lhe a
mensagem de que a empatia pelo nosso semelhante é um dever de consciência, que
a partilha e o espírito de cooperação e de entreajuda devem estar sempre
presentes. Como professora, procuro transmitir essas mesmas premissas, mas não
vejo melhor espaço para o fazer do que a aula de EMRC, onde se treinam
competências para o exercício de uma cidadania consciente e responsável!
Não entendo, portanto, o agastamento em torno da disciplina. Não são
crentes? Têm o direito de não o serem e, como tal, podem não frequentar, mas
não têm o direito de menosprezar o trabalho alheio, tantas vezes bem feito e
que enriquece todo o ser humano! Não têm o direito de hostilizar quem escolhe
frequentar e muito menos tentar demover os que pretendem inscrever-se. A
tolerância não é feita pela metade!
Nina M.
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