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sábado, 28 de outubro de 2023

Crónica de Maus Costumes 344

 

Em defesa de Joana Marques

 

            O subtítulo da crónica, talvez, não seja adequado, porque a Joana não precisa que a defendam. Aliás, a humorista ignora totalmente a existência de uma Nina M., pelo que estas palavras serão do seu total desconhecimento. No entanto, apetece-me dedicar algum do meu tempo a elogiar esta mulher, concentradinha num metro e cinquenta e três, que consegue colocar as redes sociais em polvorosa.

            Para quem possa desconhecer, a Joana Marques é filha do historiador e escritor João Pedro Marques. Do pai, li o seu romance Uma fazenda em África, com o qual aprendi a conhecer os primórdios do colonialismo português em Moçâmedes, Angola, uma terra, então, inóspita e cheia de perigos. São os colonos vindos do Brasil, desiludidos, que ensaiam uma nova oportunidade, em terras africanas. A incompreensão, a deslealdade, a ganância, o poder, a lealdade, a frustração, a vaidade e o amor são temas que atravessam o romance. Para muitos desses colonizadores, África foi um mundo incompreensível e cruel.

A Joana tem a marca dos bons genes. Ela é uma das guionistas que integra a equipa que escreve os textos que o Ricardo Araújo apresenta na rubrica Isto é gozar com quem trabalha. Para além disso, a Joana é locutora na Renascença, juntamente com a Ana Galvão e a Inês Lopes Gonçalves, responsáveis pelo programa As três da manhã, no qual se integra a rubrica Extremamente desagradável e que dá que falar da radialista, em termos desagradáveis, nas redes sociais. A Joana é frequentemente insultada, acusada de bullying, de não ter piada, pois à luz desses críticos, apenas sabe ofender e achincalhar os outros.

            Eu gosto da Joana. Desde logo, é uma lisboeta portista, o que já é suficiente para chamar a minha atenção, depois, é inteligente e perspicaz, elevando o humor a outro patamar. Gabo-lhe a paciência que revela para ouvir e ver todo o género de supostas figuras públicas e certos programas para apresenta as suas rubricas extremamente desagradáveis. A ironia e a piada da rubrica começam imediatamente com o título escolhido, porém, não é a Joana quem é desagradável, mas antes a maioria das personalidades com quem ela faz humor.

            Vejamos, há quem a deteste, afirmando que o que ela faz é bullying! Pois bem, é exatamente o inverso! Mal é o que essas personalidades fazem ao não se coibirem de dizer uma torrente de asneiras! A Joana não pode ser responsabilizada pela idiotice alheia! Ela apenas a expõe! Na verdade, a locutora nem precisa de muita criatividade para a construção da sua rubrica, porque as pessoas entregam-lhe o material pronto a consumir. É verdade que ela, coitada, precisa de uma paciência imensa para ouvir tanto disparate e insanidade, para depois fazer a triagem e alinhavar aquilo tudo! Como pode a Joana fazer bullying, se ela se limita a pegar nas declarações das próprias pessoas e apenas mostra o ridículo em que estas caíram?

Ora, não é a Joana que é má! São certas pessoas que não passam de gente inflada e oca, mas que se julga uma especialidade, quando apenas dizem banalidades e parvoíces, que a humorista sabe, exemplarmente e desagradavelmente, dissecar!

Se não fosse a Joana, ninguém sabia quem eram a Yolanda Tati, o Rafael Alex e outros que tais! Eu pelo menos, não saberia… Continuo sem saber muito bem, porque após a rubrica, então é que fujo a sete pés dessa gente, mas enquanto ouço, rio-me bem!

O verdadeiro problema da Joana é a coragem que ela revela ao fazer humor com gente influente do entretenimento, sem impor barreiras nem usar de paninhos quentes, tratando-os como a qualquer desconhecido. É isto que, fundamentalmente, não lhe perdoam.

A azia, o Compensan resolve, para a incapacidade de se rir de si mesmo não sei o que recomende, talvez uns episódios do Extremamente desagradável ensinem alguns a terem noção do ridículo.

 

Nina M.

 

 

 

 

           

sábado, 21 de outubro de 2023

Crónica de Maus Costumes 343

 

            Escola pública

            Li, por estes dias, uma publicação de uma colega que garantia haver, numa escola em Lisboa, um pseudoprofessor com o décimo primeiro ou décimo segundo ano, já nem sei bem. A colega não adiantava quaisquer outros detalhes para não expor a sua fonte.

A veracidade da situação foi posta em causa, mas inúmeros professores saíram em sua defesa, alegando a postura sempre correta da colega, o seu espírito de entreajuda e de cooperação, bem como nunca lançar falsidades com o objetivo de criar polémicas. Reconhecem-lhe, portanto, idoneidade e caráter.

Já não bastava a quantidade de alunos sem professor a certas disciplinas (a minha filha ainda não tem professor de Educação Visual nem de História), mas a ser verdade, não me surpreende. Já o tinha escrito há tempos, nesta rubrica, que iríamos voltar aos anos oitenta, em que qualquer bicho careto servia para ser professor. Não deixa de ser irónico que há alguns anos tivessem desejado impor uma prova que confirmasse e atestasse a aptidão e a competência dos professores contratados com menos tempo de serviço e de experiência, colocando em causa as instituições universitárias, responsáveis pela sua formação, pois depreende-se que se era necessário a prova de confirmação de qualidade, os docentes que as instituições punham cá fora, não exerceram o seu papel com a competência e a responsabilidade devidas. Ora, neste momento, esse problema não se coloca, pois pelos vistos, basta que se tenha o ensino secundário para se poder lecionar. Enquanto isso, gente licenciada (pré-Bolonha e pós-Bolonha), com pós-graduações e mestrados continuam obrigados ao ano probatório, não vá o diabo tecê-las e estes colegas serem incompetentes, mau grado os muitos anos de serviço (nalguns casos)! A situação é surreal! Kafkiana! Configura o absurdo dos absurdos!

É verdade que esta diferença na postura e de atuação diz respeito a tempos diferentes. O ministro da famosa PAC era o Crato, no tempo em que foi preciso diminuir a contratação dos professores, por meras razões económicas. Pela primeira vez, ao cabo de dezasseis anos de ofício, na altura, fiquei com um horário incompleto. Outro ano se seguiria. Atualmente, o responsável é o João Costa, que sabe há muito do problema da falta de professores e que desde o tempo do seu antecessor era anunciado. Continua a Fazer-se de cego e de surdo e anda a empurrar o problema com a barriga, resolvendo-o de forma sórdida e irresponsável. Já era mau que para se lecionar, se exigisse apenas um número reduzido de créditos em determinadas disciplinas, obtidos nas universidades (a lembrar os inícios dos miniconcursos), mas permitir que alguém que apenas possui a escolaridade obrigatória (atualmente é o décimo segundo ano) entre numa sala de aula como professor é deplorável! Revela a importância que o Governo dá ao pilar estruturante da sociedade e a uma das maiores conquistas de abril, que foi a escola pública para todos! Já envelheceram muito ou morreram aqueles que se bateram por esse valor e que acreditavam na escola pública como elevador social e redutor das assimetrias.

A boca dessa gente, quando enche o peito para discursar, nas cerimónias de abril, de que tanto gostam e das quais se sentem os donos e os arautos da liberdade, deveria encher-se de moscas, de tão fétida hipocrisia que propalam… Não passam de uma fraude.

Para eles, a situação não é problemática. Os seus filhos frequentam os colégios privados das elites. Tudo gente formada com enorme meritocracia e empenho! São os jotinhas do presente ou de um futuro próximo e os (des)governantes de um futuro um pouco mais distante. Na verdade, temos um republicanismo impregnado de velhos hábitos monárquicos. Filho de peixe sabe nadar e, por isso, filho, sobrinho, enteado de político, político será…  Também não há que admirar, basta procurar nos compêndios da História para perceber que o monárquico de hoje seria o republicano de amanhã e vice-versa. A desfaçatez e a ignomínia não têm limites.

Sei bem que os filhos só são especiais para os seus pais. Para os outros, são mais uns seres que povoam a Terra e que na imensidão do universo lhes coube a mesma sorte que a todos: serem nada! Não obstante, convinha a quem governa não esquecer da sua condição humana e deixarem de se sentir semideuses que dispõem as peças no tabuleiro de xadrez, porque acima deles também está o fatum, que os conduzirá, inevitavelmente, ao seu ocaso.

Uma sociedade instruída e dotada de espírito crítico não interessa a quem governa, porque se rebela e põe em causa a ordem social instituída e os princípios éticos em que ela assenta. A coletividade continua a precisar de gente que execute sem pensar nem questionar, que passe pela vida como um sopro leve de uma existência vã, enredada no trabalho e perdida nos prazeres. A melhor forma de o conseguir é assassinar a escola pública, esvaziá-la sub-repticiamente da sua função, enquanto esta, aparentemente, continua a cumprir com efeito para que foi criada.

Escabrosamente, estas decisões políticas (é disto que se trata) têm sido tomadas repetida e maioritariamente por governos socialistas (são estes que mais vezes têm exercido funções governativas, facto que é incontornável) e que neste assunto em particular, não têm revelado qualquer preocupação social para com os cidadãos que não podem pagar uma escola privada, mas que, ainda assim, deveriam ter direito a uma educação de qualidade. Não basta ter escola pública. É preciso que ela seja boa.

Urge o abandono da política da esmola, do assistencialismo e da caridadezinha enganadora para uma política de verdadeira ação de melhoria das condições de vida dos portugueses, de investimento na investigação, na escola pública, na saúde pública e na economia, nos projetos que possam trazer valor acrescentado ao país. Sem economia forte não há boas condições de vida.

Não me questionem como fazer, não estudei economia. Se o soubesse, estaria na política. Sou produto da escola pública, talvez das últimas gerações anteriores à sua decadência. Em prol dela e dos alunos continuo a trabalhar, apesar dos sucessivos golpes que lhe desferem.

É preciso que a sociedade acorde para o problema que já se faz sentir, porém, entre guerras, inflação, falta de habitação e carteiras vazias, a educação em Portugal não passa de um detalhe.

 

Nina M.

 

sábado, 14 de outubro de 2023

Crónica de Maus Costumes 342

 

Sentir pena dos culpados é trair os inocentes (Ayn Rand)

            O meu olhar deteve-se nesta frase que surgiu no mural do meu Facebook e fez-me pensar sobre ela. Pensar sobre algo que é dito fora do seu contexto pode ser perigoso, porque corre-se o risco de o seu sentido original poder ser subvertido. Ainda assim, a frase é forte para que se passe sobre ela sem refletir.

            Primeiro, quis saber a quem pertencia a autoria e, depois, chegar um pouco mais à pessoa. Ayn Rand foi uma escritora e filósofa norte-americana de origem judaico-russa, conhecida pelo sistema filosófico designado de Objetivismo e pelos seus romances. Nasceu em 1905, em S. Petersburgo e morreu em 1982, em Nova Iorque. Opunha-se ao coletivismo, ao estatismo e ao anarquismo, defendendo os direitos individuais, incluindo os direitos de propriedade, constituindo uma influência para os liberais e conservadores americanos.

            A frase é dura e eu não concordo com ela. Sentir pena dos culpados (partindo do pressuposto de que o são efetivamente) é sinal de que ainda resta humanidade em nós. Sentir compaixão pelo culpado pode significar que se lamenta o facto de ele não dispor de ferramentas internas que o impeçam de agir mal. Essa pena é o que permite que haja lucidez para não se agir com o culpado usando da mesma vileza, garantindo a nossa integridade. É o que evita o “olho por olho e dente por dente” e a escalada da violência. Não se responde a um ato bárbaro com réplica igual.

            Não pude deixar de pensar no conflito israelo-palestiniano, onde só há lideranças culpadas e cidadãos inocentes, em ambos os lados. Desta forma, a argumentação que vou lendo nas opiniões polarizadas relativamente ao conflito não é sustentável e só o amplia. Retroceder historicamente e dizer-se que quando o Estado de Israel foi criado, já existia a Palestina com palestinianos ou que já no tempo de Jesus aquele lugar era designado de Palestina pode ser verdadeiro, mas não resolve nada, porque mesmo nessa altura, independentemente do nome, conviviam muçulmanos, judeus e até cristãos, portanto, a Palestina será terra de todos sem que uns se queiram impor aos outros. Então, quando se alega que se é para retroceder historicamente, também Portugal seria território de muçulmanos, acusando os outros de desconhecimento histórico, eu não posso deixar de me interrogar se essas pessoas saberão que antes dos muçulmanos estiveram os celtas, os iberos, os romanos, os suevos e visigodos, tudo antes da invasão muçulmana, em 711. Depois dela, deu-se o movimento da reconquista cristã, expulsando-os da Península. Portanto, dizer que Portugal seria dos muçulmanos é exercício de retórica. O mesmo que é aplicado à Palestina, quando uns alegam que originalmente a terra era dos judeus, fundamentando com passagens bíblicas do Antigo Testamento, mas esquecendo que não foi Deus que ditou o texto. Toda a Bíblia foi escrita por homens e comporta quer a interpretação destes quer os seus interesses. Ler a Bíblia literalmente é o mesmo que ler literalmente poesia. É apenas estúpido. A discussão sobre a antiguidade e pertença destes territórios em concreto parece a discussão sobre quem nasce primeiro, se o ovo se a galinha. Evidentemente, se a discussão se centrar na história mais recente, desde a fundação do Estado de Israel, poderá fazer mais sentido. É verdade que Israel foi alargando as suas fronteiras a cada guerra travada e não o deveria ter feito nem a comunidade internacional o deveria ter aceitado. Também é verdade que os países árabes, em abono da verdade, nunca estiveram dispostos a aceitar Israel e o objetivo de alguns é a extinção deste Estado. Não há inocentes no processo. Há dois povos sofridos que não se entendem. Uns que viram o seu território diminuído e outros que viveram séculos escorraçados e massacrados, de forma apátrida. Interrogo-me se haveria esta questão se a Europa não tivesse feito o que fez aos judeus… Reis e Governos incompetentes que não souberam manter quem lhes trazia riqueza. Portugal está em dívida pelo massacre dos judeus, em 1506, no reinado de D. Manuel. Este teve, pelo menos, a clarividência de pôr fim ao motim com as tropas reais e de castigar os culpados. No entanto, as mais de 4000 vidas não foram recuperadas. No resto da Europa, por essa altura, o cenário terá sido pior e sem falar do progrom, no século XX! A tentativa de remediar a situação após a Segunda Guerra Mundial, arranjando uma pátria onde este povo, finalmente, pudesse ter descanso, terra também associada às suas origens, não correu bem. Uns sentiram-se invadidos e os outros acossados.

Apesar da situação difícil para todos, não é legítimo aceitar ações terroristas bárbaras, atrocidades animalescas, em que bebés e crianças são decapitadas. Isto não é de gente. Demasiado demoníaco. Ações destas que são realizadas sob o slogan de querer libertar a Palestina não podem ser levadas a sério. Ações destas tornam os palestinianos reféns e carne para canhão. O Hamas conseguiu o que pretendia: impeliu Israel a agir. Depois de um ataque a civis, a jovens que se divertiam num festival, iria haver reação, naturalmente. Não serve o argumento de que os israelitas também causaram muitos danos ao povo palestiano, ainda que seja verdade, mas nunca desta forma tão desavergonhada e cruel de querer apenas gerar caos e usar os próprios cidadãos como escudo humano. É o que fazem esses cobardes sem escrúpulos. Sujeitam os próprios irmãos à carnificina, porque se misturam e se escondem no meio deles, forçando uma intervenção cega e catastrófica no que à perda de vidas diz respeito. O Hamas não quer libertar a Palestina, quer antes exterminar Israel. No entanto, o Hamas não é o povo palestiniano nem o seu legítimo representante. Para haver paz duradora, seria necessário a total destruição das células terroristas e a sua não aceitação pelo próprio povo e o reconhecimento de dois Estados equitativos: o palestiniano e o israelita. Cada um com a sua cultura, tradições e respeito mútuo. Há, porém, Estados vizinhos que preferem ver toda a região em polvorosa, por não saberem viver em paz.

Chegar ao século XXI e ver que o Homem não aprendeu nada ao longo da História é desconcertante, desolador e gerador de angústia. Todos caberão, mais cedo ou mais tarde num buraco de dois metros e quarenta de comprimento por um de largura. Haverá necessidade de tornar a sua existência e a dos outros deplorável?

 

Nina M.

 

 

           

quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Se na tua pele nua

Se na tua pele nua
Compuser uma sonata
Em dó maior e de prata
A alma te entrego crua

E o corpo que jaz
Agora em descanso
Após esse delírio manso
Que o desejo satisfaz

Ao mistério se abandonou
Ser matéria em vazio 
De uma alma que é rio
E na corrente se evaporou

Sombra etérea e divinal
A fixar a eternidade
Num Instante... Raridade
Em demanda do seu Graal













sábado, 7 de outubro de 2023

Crónica de Maus Costumes 341

 

Violência e terror

               Só ao final da tarde me apercebi do ocorrido em Israel, pelas redes sociais, que me davam contam da notícia. Li sofregamente como quem não acredita e imediatamente a televisão foi ligada em busca de mais informação.

            Uma das primeiras imagens que vejo é um prédio a ruir. Inevitável não nos lembrarmos do onze de setembro, principalmente, depois de ouvirmos os detalhes sobre como o ataque foi perpetrado.

            Israel não é inocente na conjetura global. Há muito deveria ter resolvido a questão da Faixa de Gaza e deveria abdicar dos colonatos, situação que contraria a lei internacional. Os israelitas deveriam compreender melhor do que ninguém o que é sentir-se um povo sem pátria, pelo facto de eles o terem sentido na pele e de terem sido alvo de perseguições inadmissíveis ao longo da História. Não deveriam passar de agredidos a agressores. A comunidade internacional deveria, sim, pressionar Israel, no sentido de libertar o espaço que ocupam da Faixa de Gaza, desde 1967. Os cidadãos israelitas e palestinianos inteligentes e moderados compreendem que o povo (de ambos os lados) não tem responsabilidade no conflito. Há palestinianos a trabalhar em Israel ou nos colonatos israelitas. Estabelecem contactos e até laços. Ainda não estive em Jerusalém, mas pelo que já li vive-se cosmopolitismo e convivência religiosa entre judeus, cristãos e muçulmanos.

Já no tempo de Cristo, pela Páscoa, o ambiente em Jerusalém fervilhava. Os Judeus, que mantinham a sua autoridade religiosa, expressa no sumo sacerdote Caifás, deviam obediência às leis do Império Romano, representado por Pilatos, responsável pela manutenção da ordem na cidade. Jesus foi um agitador das águas. Por um lado, sendo ele judeu, questionava a lei judaica, deixando Caifás numa posição vulnerável e receoso de perder a sua influência e poder. Pilatos só queria que naqueles dias, em que Jerusalém se enchia de peregrinos, a ordem e a lei romana fossem respeitadas. Era essa a sua função e pretendia cumpri-la. Não queria que chegasse até Tibério César rumores sobre a sua incapacidade para conter rebeliões. Ora os discursos de Jesus, através dos quais veiculava a Boa Nova e o episódio dos vendilhões do templo tê-lo-ão, de certa forma, marcado como um possível promotor de contendas. Quando os príncipes dos sacerdotes decidem entregá-lo a Pilatos, eliminando a concorrência, Pilatos julgá-lo-á como alguém que desafia a ordem e não por questões religiosas, até porque estas competiam a Herodes. Pôncio Pilatos tratava apenas dos impostos e das rebeliões contra Roma. Na verdade, a condenação de Jesus foi meramente política. Pilatos fez a vontade a Caifás, mantendo as boas relações com a autoridade religiosa judaica, serenando os ânimos e mantendo a ordem. Enfim, cumprindo com o papel para o qual foi designado.

Jerusalém sempre foi um caldo em ebulição, uma panela de pressão. Parece que os ventos da História chegam aos dias de hoje e tem faltado vontade política para a resolução de contendas. Árabes e Judeus, todos querem a bela Jerusalém. No entanto, o ataque de hoje, levado a cabo pelo grupo terrorista Hamas, contra civis, e fazendo deles alvo e reféns, além de inqualificável contribui para o agravamento de uma situação já por si complicada. O país, sentindo-se ferido de morte, vai querer ripostar e sentir-se-á legitimado para o fazer. Gostaria de estar enganada, mas prevejo dias muito sangrentos. Entenda-se que o ataque não é lançado por uma nação, mas por um grupo terrorista, com o apoio do Irão, financiador de armamento e que gosta de lançar o terror dentro e fora da própria nação. Sabendo-se que o Hamas se escuda nos civis e sedia-se nos seus prédios para montar o terreno de operações, adivinha-se uma carnificina. A Intifada (uso a expressão, porque as ações terroristas já foram justificadas com o nome de Deus) não ficará sem resposta e ao longo da História, a cada guerra, Israel foi tomando território, num crescendo de ódio e de intolerância entre povos. Foi o que aconteceu na designada Guerra dos Seis Dias, que terá sido uma ofensiva israelita preventiva, com o objetivo de impedir uma invasão concertada entre vários países árabes, que pretendiam acabar com o Estado de Israel, criado em 1948. Creio que Netanyahu não negociará com terroristas, não se sentará com representantes do Hamas, pelo contrário, tentará eliminá-los. O golpe festejado por estes e pelo Irão tornaram as ambições de paz mais longínquas. Creio que o facto de Gaza se encontrar dominada por terroristas torna ainda mais difícil a resolução do problema. Todos os esforços que se tinham vindo a desenvolver e os encontros entre as autoridades palestinianas e israelitas, que permitiram pequeníssimos passos para se encontrar a paz, se esboroaram. Resta saber como as nações vizinhas se comportarão mediante o eterno conflito. É preciso contenção para que não sejam sobretudo os palestinianos civis e que nada têm a ver com o Hamas, que já vivem em condições tão difíceis, a pagar a fatura.  

Não obstante, com grupos terroristas que se autoproclamam Estados, que atacam civis sem qualquer ética, sem se importarem com o próprio povo, no qual se respaldam e para quem as suas vidas são apenas danos colaterais, também entendo que não se negoceia. Caberá à Autoridade Palestiniana um papel importantíssimo, não legitimando ações terroristas, lançando o diálogo diplomático em prol da paz entre as nações.

Nina M.

 

Só ao meu coração

Só ao meu coração
Devo fidelidade

Passe o tempo
Desça habitual o sol

A poisar sobre o oceano
Sucedaneamente
E de modo natural

Quem nele habitar
Aí permanece

Intacto e inteiro
Onde só o amor reside

Sem que qualquer alheia
Vontade o possa extirpar

Senhoreia-se
E ciente da nostalgia
Vive a Dor vã do regresso
Sempre imperfeito