Aproxima-se mais um momento de avaliação
e sinto-me em modo de desabafo. A Educação há muito anda doente e as
prescrições para a cura têm sido sucessivamente inócuas, apesar de algumas
estatísticas mostrarem o contrário. Os dados estatísticos, como se sabe,
oferecem diversas leituras, consoante as variáveis dos óculos que temos postos,
quando se interpretam os números.
Ninguém duvida que atualmente a taxa de
analfabetismo é residual, mas se falarmos de iliteracia, o caso muda de figura,
apesar do relatório PISA evidenciar grandes melhorias. Resta saber qual o
perfil de aluno que integrou a avaliação!
Diz-me a minha perceção e a de muitos
colegas que esta evolução é manifestamente insuficiente. Não fizemos nenhum
estudo, mas trabalhamos diariamente no terreno e o que vemos, ouvimos e corrigimos
é absolutamente desencorajador e frustrante.
Admito a minha extrema dificuldade em
lidar com quem se recusa aprender, porque essa tarefa implica dedicação e
esforço e atualmente a sociedade educa para o hedonismo fácil, o que não passa
de uma falácia.
Devemos repensar seriamente se é este o
caminho que queremos seguir. Construiu-se a tese (com a qual eu até concordo e
compreendo em teoria) de que a retenção não é a chave para o sucesso. Só faz
com que o aluno se desmotive e não acredite no seu potencial. Nos inícios do
século passado talvez fosse assim, mas hoje, francamente, não me parece. Na
realidade, a retenção não melhora rigorosamente nada, pois o aluno não vai
conseguir superar as suas dificuldades só porque ficou retido. Verdade, porém,
o problema é mais grave. Na maioria das vezes, o aluno não sabe, porque não
quer fazer o esforço para aprender. A doença da geração que desponta é a da
preguiça e a culpa é nossa (pais e professores), que lhes retiramos todas as
pedras do caminho, para que os meninos não tenham que ultrapassar qualquer
dificuldade. Criamos crianças indolentes, nada persistentes e quando isto se
alia à pouca valorização do saber, o estrago é enorme! Esta geração não quer
saber, porque o conhecimento dá trabalho e estes jovens nunca precisaram de
trabalhar para conquistar o que tanto lhe apetecia, pois os seus progenitores e
familiares, muito solicitamente, apressaram-se em suprir as suas carências.
Resultado: alunos pouco aplicados e pouco disciplinados.
Os alunos que evidenciam dificuldades,
mas demonstram querer superá-las, deveriam ter verdadeiros planos de
recuperação: apoio nas disciplinas em que essa dificuldade se manifesta e uma
hora por semana não é suficiente! Quanto aos que não fazem por inércia, há que
sofrer as consequências! Ao invés, no sistema, facilita-se, colocando todos no
mesmo plano. Perpetua-se a ideia de que se consegue alcançar os objetivos sem
esforço, enquanto se contribui para o engrossar das estatísticas de sucesso de
que os nossos governantes tanto gostam! Aluno que não evidencia saber porque
não cumpre com as tarefas na sala de aula, porque se recusa a passar a matéria
para o caderno, porque se alheia da aula, porque não cumpre com os critérios
instituídos, porque não sistematiza devidamente as aprendizagens, tudo em nome
da preguiça, deve ser, sim, penalizado com a retenção! Infelizmente, não é o
que acontece. Devo confessar que me incomoda ouvir colegas dizerem: “Não posso
ter menos de cinquenta por cento de negativas!”. Porquê?! Curioso, porque aos
professores de Português e de Matemática acontece com frequência! Exijamos na
medida do que trabalhamos!
O facilitismo gera incompetência e
inaptidão. É triste ouvir professores universitários dizerem que nas teses dos
seus mestrandos dedicam muito tempo à correção do português, porque os alunos
não sabem escrever! Que geração se está a formar?
É este o estado deplorável da escola pública, em que
quase basta que o aluno respire para ser bem-sucedido. Entretanto, quem nos
governa e aqueles que podem têm os seus filhos nas privadas. O segredo destas
escolas passa por vários fatores: a matéria-prima de que dispõem, o trabalho
exigido e, em algumas, critérios de avaliação pouco ortodoxos. Eu, que já
acompanhei alguns meninos que frequentam colégios privados, vejo a quantidade
de trabalho de casa que lhes é exigido, em todas as disciplinas! Se os alunos das
escolas públicas trabalhassem o mesmo, os resultados seriam menos díspares.
Depois, ouvimos aos miúdos os
comentários: “Eu quero ir para CEF. Lá é que não vou fazer mesmo nada!” Como se
fizessem muito! O pior é que têm razão! Se transitam sem esforço, vão trabalhar
para quê?!
Sejamos sérios. Nem todos querem estudar
ou se sentem motivados para tal, é um facto, no entanto, a solução não pode ser
empurrá-los para CEF ou profissionais até aos dezoito e dotá-los de um diploma
de nono ou décimo segundo anos, sem que eles se predisponham a adquirir o que
deve ser apreendido. Já agora, valeria a pena mudar os programas e dotá-los de
uma componente essencialmente prática, nestes cursos, porque se pretende criar
bons executantes e não falsos doutos! Se calhar não precisam de ler os
Lusíadas, poderiam ficar pelo João de Barros!
Nós, professores, devemos assumir sem
medos a realidade das aprendizagens, contrariando os surpreendentes milagres
que se operam nos finais de ano letivo, desde que tenhamos a consciência
tranquila do dever cumprido, sempre com empenho. Sei que parece um ideal, mas
eu sou da geração dos que gostam de ideais pelos quais vale a pena lutar! Se o
resultado for uma taxa de insucesso superior ao que é aceitável, talvez os
nossos governantes comecem a olhar para o ensino público com a seriedade que
lhe é devida!
Nina M.
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