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quinta-feira, 30 de setembro de 2021

Apeteces-me com violenta ternura

Apeteces-me com violenta ternura

Feita de violetas e girassóis

Desejo a tua carne ausente

Beijá-la sofregamente

Como quem morde a saudade


Saciar-me de ti ao limite

Para suprir a extrema falha

A tua alma em mim

Assim, despersonalizada,

Como fora de minha pertença

Porque o teu verso é a minha carne




sábado, 25 de setembro de 2021

Crónica de Maus Costumes 247

 

Xenofobia e desumanização

                Parece que Portugal vai receber duzentas jovens afegãs, jogadoras de futebol, atividade que lhes é vedada no seu país pelo regime talibã. Soube da notícia, que não agrada a muitos, pelas redes sociais.

                Às vezes, questiono-me se as pessoas abrem as notícias para efetivamente ler ou se sabem mesmo ler, dada a quantidade de disparates que debitam. Se fossem comentários parvos, mas inócuos, não me irritariam, mas a substância, o veneno e o ódio destilado são uma realidade de difícil acomodação. Surgiram de imediato teorias da conspiração. Como se duzentas raparigas, que fogem da violência, da perseguição, da discriminação e da subjugação que lhes são impostas no seu país, fossem meios a utilizar num plano diabólico de tomada da Europa, estratégia levada a cabo pelos terroristas sanguinários. Depois, chegam os argumentos dos apoios e da falta de dinheiro, dos portugueses que passam muitas dificuldades e dos quais ninguém quer saber. Condescendo relativamente neste ponto. Há muito português a precisar de ajuda que não tem, mas os que falam desses também os instrumentalizam e só se lembram de que eles existem nestes momentos. São pedra de arremesso embrulhada num argumento frágil, mas ainda não vi ninguém a mobilizar-se contra a miséria.

                Assim, as miúdas ou são vistas como alguém que vem viver com o apoio do Estado português, entenda-se viver às expensas do contribuinte, ou como alguém que tem uma cultura muito diferente e, como tal, não se vai adaptar ou ainda, na pior das hipóteses, como peões de uma estratégia talibã para domínio da Europa. São apenas refugiadas que tentam preservar as suas vidas! Talvez seja conveniente explicar que o nosso país receberá uma certa quantia por este acolhimento, mas mesmo que assim não fosse, resta-me perguntar sobre o tipo de humanidade que queremos. Não será um princípio ético ou moral evidente auxiliar quem precisa? No meu entendimento, temos todos o dever de cooperar e de acolher o outro, sabendo respeitar as suas diferenças. Foi precisamente esta capacidade de cooperação em sociedade que permitiu que a espécie humana se protegesse, se desenvolvesse e se multiplicasse. Vivemos tempos estranhos. Uma era de individualismo exacerbado, em que o ego se sobrepõe ao coletivo e que faz com que se entenda a vida própria como mais importante do que a do outro.

Um egoísta manifesta amor exclusivo por si, mas o ser constrói-se com o outro, numa dialética de reconhecimento do seu igual, onde a cooperação, o respeito e a aceitação são a chave para a sobrevivência e bem-estar de ambos. Ao separarmos o “nós” do “outro”, ao vê-lo como alguém díspar, justificando-o com as divergências culturais, estamos a desmerecê-lo, a não o reconhecer como nosso igual, abrindo portas à desumanização. A História mostra que para pessoas absolutamente vulgares cometerem grandes atrocidades, basta convencê-las do demérito do outro, instigando o medo e o ódio àquele a quem não se reconhece como nosso semelhante, considerando-o alguém inferior a quem se pode retirar a sua dignidade, desumanizando-os, remetendo-os à categoria de animais que podemos subjugar. John Steinbeck relata-o cruamente no seu “Vinhas da Ira”. Após a publicação do romance que colocou a América a ler, deixando a nu as atrocidades de um capitalismo selvagem que sobrevive pela disseminação do ódio do norte-americano em relação ao seu compatriota, teve de se proteger com medo das possíveis retaliações. Acreditava que apenas a sua fama de escritor o salvara de um assassinato. Os californianos não suportavam os “okies”, oriundos do mesmo país, seus compatriotas, porque eram diferentes de si. Pobres, carregavam a miséria e a fome no olhar. Gente vilipendiada na sua terra de origem e também no oásis prometido e a ira que se forma num estômago consolado com pêssegos quentes impulsiona a ação com a esperança na mudança. Não os reconheciam como iguais e a partir desse pressuposto todas as atrocidades eram permitidas.

                Paradoxalmente, aquele que maltrata o outro, desumaniza-se em primeira instância a si mesmo. Ao roubar pela violência a dignidade alheia, está a perder a sua própria dignidade. Quando o coração do Homem deixar de sofrer pela miséria do outro, deixar de o reconhecer como seu igual, perdeu o estatuto de ser humano.

                Obviamente, quem chega tem o dever de respeitar a lei de quem acolhe, sem perder a sua identidade, porque em democracia há tolerância e respeito pela liberdade individual, desde que esta não faça perigar um coletivo.

                Sejam muito bem-vindas, meninas! Oxalá aqui possam reunir condições para continuarem a fazer o que gostam e lutarem pela vossa liberdade e pela liberdade das vossas conterrâneas. A vossa voz tem de se fazer ouvir e a vossa luta deve ser a luta de todos, mas em primeiro lugar, tem de ser a luta de todo o povo afegão. Haja coragem!

 

Nina M.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Outono

 Amanheço e é outono

Lugar de folhas castanhas

Desperta a alma do seu sono

Procura ver-se nas entranhas


Cores quentes outonais

Sob o pálido céu azul

Caem das nuvens vendavais

Vai-se a alegria com o vento do sul


O sol já não brilha como outrora

Chega a pequena brisa que fustiga

Torna-se mais opaco pela aurora

E a sua ausência castiga


Prenúncio do fim do dia

Mesmo se este vai a meio

Instalou-se a melancolia

Assim que o outono veio


Sem chilreios nem outras vozes

Só as bátegas nas vidraças

Bagas que escorrem velozes                         

A dar conta de desgraças


Fica sempre um vazio

No sensível coração

Com a partida do estio

Parece instalar-se a solidão


Estação mais triste, esta

Apesar das cores quentes

Sossego de fim de festa

Primeiro frio indecente


Não cansa um céu límpido

Nem o brilho de um sol quente

Desejo de um mar tépido

De uma alma sempre ardente


É outono. É velhice.

Nostalgia sem idade

Inverno precoce e cúmplice

Da nossa efemeridade.







segunda-feira, 20 de setembro de 2021

Cartas

  O mundo está mais seco!

  Já ninguém escreve cartas

  De amor...

  Só sms lacónicos e feios

 Como se de estenografia se tratasse.

 

Mas as emoções são redondas.

Plenas. Ufanamente espaçosas

E gostam de ocupar as suas linhas...


No mundo cruel e cínico

A doçura perdeu o seu lugar.

O poeta canta a amargura e o pesar...


Ninguém mais escreve 

Cartas de amor...

Guardam-nas desatualizadas

Amarelecidas e com sabor a bafio.


O prazer de abrir o envelope...

O coração desabrido...

Em ânsia de poesia suave

Não existe mais...


O algodão doce enjoa os adultos.

Mas que sabem eles de amor

E das cartas  não escritas?

De palavras perdidas por registar?


Que sabem eles do cheiro a tinta no papel?

Da letra desenhada a beijar a alma?

Das cartas amarelas pelo desprezo do tempo

Esquecidas no fundo da gaveta?


Ou talvez cartas nunca escritas e nunca recebidas...

Que sabem eles?


 






sábado, 18 de setembro de 2021

Crónica de Maus Costumes 246

 

Pedidos e pequenas vaidades

                Ora bem… Ireis perdoar o tema de hoje, que surgiu inusitadamente a pedido da filha. Seria para falar de campanhas, arruaças e eleições, mas não há como negar a solicitação ansiosa da pequena da casa.

Ao ver-me dirigir para o escritório quis saber se iria escrever a crónica e se seria ela o assunto. Disse-lhe que não e os grandes olhos castanhos arregalaram-se primeiro e entristeceram depois. Soltou o lamento: “mas amanhã é a minha festa! É a minha comunhão e tu não vais escrever sobre isso?” De maneira que cá estou a cumprir a petição que vai ser lida por quem de direito… Há rogos que não devem ser ignorados e sinto que este é um deles, porque tu, minha pequena, a par do teu irmão, sois pedaços da minha alma e pedaços da minha carne e do meu sangue, criados pelo milagre da vida. Pedido vosso com o intuito de vos sentirdes suficientemente importantes para a mãe, desde que feito dentro do que é razoável, só por motivo de força maior não será cumprido. Isto exclui certos bens materiais. Não são importantes e sabeis o que penso sobre isso, porque vos digo constantemente. Este miminho de te veres representada na escrita da mãe pode ser aplicado, desde que com conta peso e medida.

A Matilde vai ler perante uma plateia. Briosa como é, quis ter uma participação mais ativa na cerimónia e lê muito bem, mas anda preocupada. Será um aborrecimento se com o nervosismo a língua se enrolar e a palavra “eucarística” sair mal pronunciada. Quer muito superar o desafio com sucesso, mas há o receio de falhar e sei que quando chegar o momento, o seu coraçãozinho tenro baterá a mil.

Vai correr tudo muito bem, filha, mas se houver engano, também não faz mal, porque as nossas vidas estão cheias de fracassos e apenas alguns sucessos. Acredito mesmo que são necessários os tropeços para aprendermos com eles. Certamente, se tal acontecer, nunca mais esquecerás de que te enganaste a ler na tua primeira comunhão, mas também terás aprendido que errar faz parte da vida e que mesmo que nos esforcemos, nem sempre as coisas correm como queremos. Aprenderás a resistir, a minimizar o tombo e a prosseguir no caminho. Depois, apesar de tudo, estarás muito bonita no teu singelo vestido (que já experimentaste à exaustão) a celebrar com a tua família o momento que tanto anseias… A vaidade feminina que não dá tréguas desde cedo! O vestido que tem de condizer com a sandália, com o gancho de cabelo e o agasalho fino de malha. Tudo selecionado com afinco, pormenor, muito cuidado e esquisitice, porque nestas idades não se gosta de qualquer coisa. Não precisei de muita intromissão. Intuitivamente, a pequena descobre que o bom gosto exige simplicidade.

Espero que seja um dia feliz, daqueles que irás sempre recordar mais tarde. Eu fiz a minha primeira comunhão mais cedo. Tinha apenas seis anos e ainda hoje recordo a cerimónia, feita no Porto, com crianças que desconhecia, por motivos que não vou aqui relatar, mas sobretudo a prenda de que mais gostei: um boneco a imitar um bebé, mas tão grandinho, que punha a tua avó a comprar-lhe “baby-grows”. Quando saía com o “martelão” (como lhe chamava o teu avô, o que me enfurecia), as pessoas julgavam tratar-se mesmo de um recém-nascido. Recordo também o relógio da praxe oferecido pelo padrinho. Naquele tempo era assim… Depois, do almoço talvez se lembrem melhor os adultos, porque a tua mãe comia tão pouco e tão mal que o cardápio não tinha importância nenhuma.

Talvez, um dia, sejas tu a escrever as memórias da tua festa. O que a tua mãe quer é apenas que sejas feliz e que bênção divina possa sempre acompanhar-te.

 

Nina M.

terça-feira, 14 de setembro de 2021

Descida ao inferno

Quem desce ao inferno vai só.

Permanece só

E se o abandonar, regressa só.

É solidão que mata pela ausência

Do ser amado.

Nenhuma mão pode travar

A queda vertiginosa 

Paradoxalmente desejada

Porque no lodo do fundo da alma,

Na mais profunda dor,

Se encontra a verdade, 

A desolação destruidora, amante do cinismo.

Um absurdo sem retorno ou redenção

Uma alma cega, surda e muda,

Uma alma morta e desfeita

Partida em ínfimos pedaços 

De impossível reparação.

O inferno é isto.

Se dele se regressa, 

É-se ténue lembrança de quem se foi,

De carcaça rija a amparar indiferente

Os golpes e as dores da existência...

Porque a dor maior ficou lá caída,

Último grito de resistência.

Porque o inferno é isto...

sábado, 11 de setembro de 2021

Crónica de Maus Costumes 245

 

O limite de cada dor é uma dor maior (Émile Michel Cioran)

 

Não podia, pela razão que alguns conhecerão, deixar de prestar a minha sincera solidariedade e o meu profundo pesar a todos os pais que perderam um filho. Não me ocorre nada pior que possa afetar tanto a sanidade de uma mãe ou de um pai. Quando tal acontece é a realização do nosso maior receio. É o meu medo maior. Será o de tantos outros.

Ao longo da minha vida, já fui várias vezes confrontada com esta injustiça. O primeiro caso de que tenho memória foi com um primo (filho do meu padrinho), que morreu afogado no rio. Eu era miúda e tenho memória da mãe do meu primo Nuno, que veio uns dias para minha casa, a convite da minha mãe, por certo. Apática, de preto integral, sentada numa cadeira e de olhar parado por detrás dos óculos grossos, enquanto a minha avó Matilde, que morou connosco depois do desaparecimento do meu avô, tentava fazer com que reagisse, supervisionando os afazeres na cozinha. Não lembro mais nada, mas tenho esta imagem gravada. Sem compreender a dimensão, sabia que a Maria Emília estava lá pela tristeza de ter perdido o Nuno.

Hoje, sendo mãe, compreendo o alcance de tamanha dor. Não era tristeza. Era destruição, vazio profundo e absurdo. É muito difícil combater o absurdo e quando a vida contraria a lei natural e nos retira o chão sobra quase nada.

Mais tarde, assisti à infelicidade dos colegas com quem trabalhei, que perderam os dois filhos que tinham (um rapaz e uma rapariga), num acidente de viação, no IP4. Os irmãos viajavam no mesmo carro. O mesmo olhar perdido, a mesma ausência de sentido, a procura da filha no casaco dela e que agora a mãe vestia, como quem a resgata ao infinito…

Recentemente, um amigo de longa data que perde o único filho, por motivo de doença prolongada. Sinto o mesmo pesar, a mesma incapacidade e a mesma impotência para ajudar, porque tudo me parece débil, inócuo e em vão. Não há palavras nem gestos que levem a dor embora ou que curem o sofrimento e cubram o vazio. Acredito que o absurdo só pode ser curável pelo amor, mas mesmo este me parece falível em tamanha dor. Talvez ajude a resistir… Sei apenas que esta fatalidade exige uma coragem imensa e uma vontade férrea para suportar a dor dos dias, para reaprender a viver, para aceitar a perda, para viver no sofrimento até ser capaz de o transformar em saudade apaziguada e ninguém sabe como fazer… Creio que só mesmo o tempo será o agente não do esquecimento, mas da aceitação e da resignação… Depois… O que cada um faz dessa fatalidade dependerá da sua personalidade. Há quem ceda ao cinismo e à amargura, há quem desista da vida, há quem use a experiência para ajudar outros que passam pelo mesmo processo, há quem consiga encontrar algum sentido e vencer o absurdo, enfim… É sempre uma resposta pessoal, sem haver certo ou errado, apenas pessoas que tentam sobreviver o melhor que podem e como sabem.

Desta forma, não hesitei um segundo em assinar a petição que circula nas redes sociais a solicitar mais dias de nojo para estas perdas. Esse tempo extra que é pedido não vai curar a alma dos progenitores, mas talvez lhes possa dar o tempo de que necessitam para se reorganizarem internamente, em busca da sua reconstrução.

Pede-se respeito e compaixão. Compaixão não no sentido da simples comiseração, mas no sentido para o qual a decomposição da palavra aponta (com +  paixão), ou seja, com passionis, étimo latino que significa ação de sofrer, de suportar, remetendo para a Paixão de Cristo. Assim, sentir compaixão, no sentido de sofrer com os que sofrem ou se quisermos seguir o modernismo linguístico em voga, sermos empáticos com o outro e a sua dor.

O limite de cada dor é uma dor maior, diz Cioran. Estes pais atingiram o limite do limite, porque não há dor maior.

 

Nina M.

 

 

 

terça-feira, 7 de setembro de 2021

Perda

 A vida nem sempre é milagre belo

Se os trilhos se embaraçam e nos confundem

E as implacáveis rodas do tempo esmagam

As flores singelas ainda mal nascidas 

Dor aguda, sentido desfeito

Um vazio enlutado dentro do peito

Fere a revolta de luta perdida

Esmigalha a vida o homem com o seu peso

Ao ver acordar um novo dia na vida

Sabê-lo sempre triste e nunca ledo

Neste desterro de sofrimento perene

Permitam os deuses a emoção

de passo a passo dia a dia

Poder reencontrar a alma em combustão


A Miguel Torga

 Duro douro vinhateiro de socalcos

 Plantado à força da enxada

Sustentas as montanhas

Com as tuas leiras...

Erguem-se ao céu em oferenda aos deuses

o néctar sato extraído pelas mãos

Sagradas do Homem às cepas viçosas

Monte engalanado pela vinha

Até onde os humanos olhos alcançam visão

E no meio desta dureza um canto urgente:

O poeta a elevar a voz que lhe vem do coração



Crónica de Maus Costumes 244

 

Revisitações

Hoje, viajei no tempo. Adentrei nas minhas memórias e adentrei na História do país. Recuei 20 anos e em simultâneo remontei à época dos romanos.

Visitei a belíssima Acqua Flaviae e descobri-lhe outro olhar. Ferida pelo Tâmega, erige-se colina acima, mantendo parte das suas muralhas históricas, a lembrar séculos de vigilância do alto da sua torre. Intocável e invencível. Qual coroa cimeira com a cidadela de vielas estreitas e casario colorido (a lembrar-me a beleza da Ribeira, da Invicta. Só Florença me causa essa impressão).

Hoje, não fui ao "quarto escuro" nem ao Faustino e nem ao "Ar de bar" nem à "Livreiro" (a livraria que era do costume). Não deixei de sorrir ao perceber ainda a existência de "O Príncipe" e de o "A romana". Lugares frequentados em tempos e que se mantêm de pé, apesar do tempo, a lembrar a minha própria duração...

Hoje, Chaves tinha outra luz e outro olhar... O sol brilhava a pique, cruzado com o brilho dos olhos dos meus filhos... Sem a neblina terrível de inverno que a gelam e a tornam agreste. Hoje, o sol queimava a ponte romana de Trajano, intacta, solene e altiva. Bastião do império e um dos baluartes flavienses, a par com o Forte de S. Francisco... Guardiões de uma História rica de valentia e de episódios castiços... Repentinamente, eram as segundas Invasões Francesas ou a implantação da República. Só no resto de Portugal, porque à cidade fronteiriça ela (a República) chegaria apenas dois anos mais tarde e, mesmo assim, Paiva Couceiro não descansou e tentou inverter a História. Os Paços da Cidade a ladear a grande torre, de frente para a praça e para as vielas, vigilantes, a ver quem passa. Aos pés, o espelho de água, as poldras, as Caldas, enfeitados pelo verde dos belíssimos jardins e parques... A casa onde outrora vivi, com o meu nome inscrito, como se aguardasse a visita que tardou... 

A cidade estava mais bela ou o meu olhar mais atento e melancólico. Um tempo que não volta, mas que se inscreveu na memória... E esta, sempre seletiva, escolhe guardar as boas recordações. Recordar é viver, porque significa literalmente voltar ao coração.

Quem não a conhece não sabe o que perde.

Há cidades pequeninas lindíssimas e acolhedoras, no nosso país. Chaves é uma delas e merece que lhe pousem o olhar.

Nina M.