Sinto-me lisonjeada com as palavras
de Valter Hugo Mãe. Todos os professores que leram o seu último texto, onde ele
se refere ao papel importante destes na construção de um país, não podem ficar
indiferentes. Dizia também das marcas que um professor pode deixar nos alunos,
avaliando a sua própria experiência, recordando alguns dos que passaram pela
sua vida. Senti-me comovida. Não só pelas palavras, mas também pela ingenuidade
surpreendente, pela pureza absolutamente imaculada da sua boa vontade. Na
verdade, o autor, ao recuar no tempo, reconheceu-se como um adolescente
diferente. Tornou-se também um adulto diferente e a prova está no profundo
respeito com que trata e se dirige aos professores e na estupefação que revela
ao constatar os maus tratos sucessivos de vários governos à classe, levando-o a
dizer que um país que maltrata os professores “odeia e odeia-se”.
Francamente, hoje, já não sei se conseguimos tocar assim tão plenamente os
alunos. É verdade que nunca chegamos a todos, mas é difícil passar o legado do
conhecimento a quem se recusa aprender, fechando-se numa ignorância
absurdamente orgulhosa. Quem pisa diariamente uma sala de aula, sabe ao que me
refiro. Muitos, mas mesmo muitos alunos, mais do que aqueles de que um país
precisa, ostentam ufanos a bandeira do desconhecimento, esfregando-nos a sua
indiferença pelas matérias, não sei se numa atitude de desprezo pelo que somos
e representamos, se numa tentativa infrutífera de nos ofender. Como se lhes
fôssemos completamente alheios e tudo o que lhes dizemos ou queremos para eles
não faça a mínima diferença. Se nalguns é uma carapaça que usam para esconder
ilusões frustradas, noutros é mesmo assim e a esses, por muito esforço que
façamos, não os conseguimos alcançar.
A mim, começa a aborrecer-me a incapacidade deles e dos pais em
reconhecerem a importância da instrução nas suas vidas, porém, cega-me ainda
mais o comportamento maquiavélico de sucessivos governos contra o ensino, os
professores e, por consequência, os alunos. No passado dia cinco de outubro, fomos
brindados com mais uma pérola! Após análise cuidada dos resultados das provas
de aferição, eis que se constata que os resultados são uma catástrofe e a
brilhante solução encontrada passa pela formação contínua dos professores. A
sério?!
Curiosamente, os relatórios internacionais (PISA e OCDE) relatam uma
melhoria muito significativa nas disciplinas de Português e Matemática,
colocando-nos à frente de muitos outros países com tradição de bons resultados.
De que servem os resultados de umas provas que os alunos sabiam não contar para
nada?! Para chegarmos à conclusão de que os professores precisam de mais
formação? É o mesmo que começar a construir uma casa pelo telhado! Comece-se,
antes de tudo, a resolver os problemas da sociedade, nas famílias desestruturadas
e disfuncionais, façam-nas entender o valor da educação para que esse princípio
também chegue aos filhos. Valorize-se a figura do professor e da escola, local
de culto, porquanto nos dá o bem mais precioso: o conhecimento. Deixemo-nos de
experimentalismos a cada novo governo, ao sabor de novas sentenças; Faça-se uma
revisão curricular séria, que seja para manter. Pense-se numa via
verdadeiramente profissionalizante e exigente, de qualidade, para os alunos que
não querem prosseguir estudos universitários; reduza-se o número de alunos por
turma, entre tantas outras coisas. Estabeleça-se um pacto de regime em matéria
de educação, após debate sério com todos os partidos. Encontre-se um consenso,
porque os grandes temas nacionais exigem concordância e não a defesa de
interesses partidários e, por fim, sim, podem pensar na formação de
professores, porque estamos sempre dispostos a aprender!
O que mais me aborrece e me esmorece o viço de início de carreira é a plena
consciência de que os ataques à classe e à escola nunca são inocentes.
Parafraseando Sophia de Mello Breyner Andresen: “Perdoai-lhes, Senhor, porque
eles sabem o que fazem!”
Perdoai-lhes, Senhor, porque eles não leem Valter Hugo Mãe e porque eu não
sou capaz!
Nina M.
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