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domingo, 1 de abril de 2018

Crónica de Maus Costumes 36



Recordo uma viagem que fiz com o meu marido em que, por distração, deixamos o tempo passar e como castigo tivemos que fazer as quatro horas até ao destino em bancos separados e algo distanciados. Calhou-me ir sentada ao lado de um casal, já em fase bem adulta, mas aparentemente num relacionamento ainda precoce.
            A troca de carícias era uma constante, assim como as palavras que se adivinhavam doces e melosas sussurradas ao ouvido de forma insistente e misturadas com beijos longos e sedentos. As mãos libidinosas, malandras e urgentes percorriam e afagavam o corpo da amada… Eu ali: quieta, impávida, mas não serena. Olhava para o teto, para o lado contrário, enfim, tentava abstrair-me da cena de telenovela e fingia que não via. O azar foi tal que tocou-me o lado esquerdo do avião, o banco do lado do corredor, ou seja, nem para as nuvens conseguia olhar!
            Não eram dois jovens, mas adultos já quarentões ou no mínimo trintões bem lançados. O mais admirável é que se borrifavam literalmente para quem os rodeava. Como explicar este comportamento atípico senão pelo sentimento da paixão?!
            A paixão é indómita, cega, atrevida e manipuladora. Queima tudo ao seu redor e marca a fogo o coração dos apaixonados. Tanto purifica como destrói. Ah! Queria o nosso Eça que Carlos da Maia resistisse à chama do desejo atiçado pela paixão, porque foi educado para superar desafios e não sucumbir perante o ardor da paixão! Talvez não. Talvez já soubesse que contra a paixão nada pode a razão e tanto se perde o romântico como o realista. Toda a paixão consome e destrói. Acaba num vazio que deixa apenas ou saudade ou mágoa e quem sabe, às vezes, ambas.
            É melhor o amor, dirão muitos. O amor calmo e dócil, cúmplice e amigo, entrecortado por pequeninos laivos de paixão. É mais seguro, com certeza. Porém, sempre houve quem preferisse o quente ou o frio em vez do morno ou os desportos radicais. Tudo uma questão de adrenalina. Quem ainda não viveu uma paixão intensa talvez não compreenda. Se deseja viver tal, cuidado com o que pede! Pode ser abrasador, mas terá, por certo, um fim, caso contrário não é paixão. É amor.
 Nina M.

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