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quinta-feira, 31 de outubro de 2019

Ícaro

- És feliz, amor meu?
Anjo caído do céu...
Assim sem asas prostrado na terra...
- E alguém é feliz na guerra
Em meio do que não tem
Próximo do que almeja?!
Sei a cura para o absurdo
Tudo o que espanta o mundo surdo
Até descobri o ideal
Sei da esperança final...
Se sou feliz?!
A momentos para além do tempo
Sou Ícaro desassombrado
Comporto a mesma alegria
De quem se queimou no sol
E na terra vive prostrado
Porém sempre que sou tudo
Tempo infinito e absoluto
Poema vivo no coração de alguém
Sei não estar aquém...
A alma eleva-se por magia
Sem asas voa numa correria
Ao encontro do sagrado imutável
Se sou feliz?
Fui-o neste instante passageiro
Onde se inscreve o amor derradeiro

terça-feira, 29 de outubro de 2019

Caronte

Eis  o carrasco.
Chega Caronte à beira-rio
Atravessa o silêncio da noite
Pálido e frio
Observa sarcástico a rebelião
Dos que atrasam a partida
Não mostra pressa
Perde-se no sabor da tortura
Revolta sadia contra o tempo
Finitude injusta e prematura
Não é chegada a hora!
Nunca será a hora
Se a consciência não dorme ainda
Se o corpo balanceia no movimento...
Tirano, implacável, o tempo é surdo
Arrasta consigo as vozes que quer calar
Dor, angústia e solidão
Murmúrio, séquito de quem sobeja
Silêncio absoluto sepulcral
Cala a alma dorida, amarrotada da viagem
Mortalha do ser efémero
A vida... Essa foi agora
O depois... O que a morte quis

domingo, 27 de outubro de 2019

Crónica de Maus Costumes 153


Costela cristã
Já me disseram, por outras palavras, que a minha esperança e bonomia para com o outro reside na minha costela cristã. Sorri. Não tenho só uma costela cristã. Tenho várias. É a minha matriz cultural e a de quase todos os que nasceram neste país e a minha matriz educacional também. Não a larguei. Poderia tê-lo feito, mas escolhi não o fazer.
Assumo, assim, a minha identidade cristã, de pertença a uma comunidade católica. Também assumo as minhas dúvidas e as minhas críticas face a uma igreja (diferente de Deus) que nem sempre soube ou sabe dar o exemplo e que é falível, porque é feita de homens. Há erros mais desculpáveis do que outros. O que mais me inquieta e desgosta na posição da Igreja (entenda-se representante de toda uma comunidade crente) é o isolamento e a necessidade de ocultação de factos por sentirem que fragilizam a sua estrutura e a sua importância. A transparência será sempre o melhor caminho. Sinto que falha principalmente junto dos jovens. A sociedade não é mais a mesma e se é verdade haver valores imutáveis que devem continuar a ser preconizados, também não é menos verdade que o conhecimento torna as pessoas mais críticas e questionadoras, faz com que haja dificuldade em lidar e em acreditar em determinados dogmas instituídos. Ou se sabe valorizar a mensagem da Boa Nova, o essencial do Cristianismo, ou se perde a identidade. Sinto e vejo muitas vezes esta identidade perdida, à deriva, no seio dos que deveriam ser os primeiros a darem o exemplo.
Se escolhi permanecer ligada a esta comunidade, ainda que me recuse a embarcar na ideologia de rebanho, como a apelida Nietzsche, e, por isso mesmo, manter um espírito crítico, é devido à sua mensagem de amor. É o convite constante à vigilância do ego e o reconhecimento da imperfeição, fruto da vil condição humana. Porém, é sobre esta consciência de pequenez que se constrói o ser dia após dia, com paciência e numa tarefa árdua que exige resiliência, um exame introspetivo quase diário, a humildade de se reconhecer pequeno e ser que falha; a humildade para recomeçar diariamente um trabalho de Sísifo, que sabendo não alcançar a perfeição, permite, no entanto que se evolua. Tal só será viável se a mensagem frutificar e se houver terreno que a saiba acolher e olhar-se. É difícil confrontarmo-nos com as nossas angústias e olhá-las de frente, com o fariseu que habita em cada um e domesticá-lo, mas é do nada que se ergue o melhor templo.
Humano é o que erra e pede desculpa, o que fracassa e recomeça, o que assume a sua insignificância no universo, mas tenta fazer o melhor que pode com as circunstâncias em que vive. Humano é o que se preocupa em responder sem subterfúgios à sua consciência, a única a quem deve verdadeiramente justificações. Humano é o que nem sempre é corajoso, às vezes é frágil, mas luta para ser melhor. Eu vejo poucos seres humanos e muitos super-heróis decadentes. Como diria Pessoa, ou melhor, Álvaro de Campos no seu “Poema em linha reta”:

“Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
[…]
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?”
[…]
Vale certamente a pena ler na íntegra… “Tudo vale a pena/Se a alma não é pequena”.
Nina M.

sábado, 26 de outubro de 2019

Tempo

Tempo finito da realidade,
Querer-te-ia antes
Indistinto e perene
Ser de outra dimensão...
Tempo congelado
Tempo reunido
Manta de retalhos...
Nessas memórias de tempo
Mora a alma crua e gasta
Poder segurar-te entre as mãos
Antes de partires novamente
Revelar-te imortal e sem fundo
Permanecer nesse tempo irreal
De completude total
De quem chegou ao fim do mundo
Olhar-te
Ver-te inteiro
Encontro transfigurado
No tempo sacralizado

domingo, 20 de outubro de 2019

Hoje afasto o sonho

Hoje afasto o sonho
Quimera longínqua 
Sou tristeza enraizada
Sinfonia triste amargurada
O azul do céu espreitou
Só para me fazer sorrir
E entre as nuvens me mostrou
Estranheza pela angústia sentir
- És sol e abóbada celeste
Queria que acreditasse
Mas se o dia é agreste...
- O céu limpo faz milagres!
Não retira a poeira 
Em que se tornarão os ossos
Nem a carne nua e fria
Debaixo da sepultura escura
O que sobrará no tempo infindo?
O nada em que me tornei...
A possibilidade que não fui...
A memória gasta e escassa de alguém...
E entre o dia em que se nasce
E o dia em que se parte
Sobram dias de ninguém.
- Olha a tua obra, dizem.
Não sei se vale um vintém
Nem almejo imortalidade
Essa vinga nos genes que ficam
Quero só a paz serena de alma
Saciada!
Ou morrerei assim... Sempre
Sempre inconformada!

sábado, 19 de outubro de 2019

Crónica de Maus Costumes 152


Fernando Gomes e os meus amigos

                Quero começar esta crónica semanal manifestando o meu desejo de sinceras melhoras ao ex-jogador do meu FCP, Fernando Gomes, o nosso “bi-bota”, como é conhecido. Para os mais distraídos, Fernando Gomes ganhou, por duas vezes (em 83 e em 85) a “Bota de Ouro”, troféu atribuído ao melhor marcador da Europa, pela UEFA. Considero que este país nunca lhe reconheceu o devido valor. Talvez acontecesse se a camisola fosse de outra cor… Felizmente, ele vestiu de azul e branco a maior parte da sua carreira desportiva!
O Gomes está doente. Foi-lhe diagnosticado um tumor no pâncreas. Desejo vivamente que consiga debelar a maldita enfermidade. Quero agradecer-lhe por tudo quanto deu ao meu FCP e confidenciar-lhe o seguinte: nunca fui de ídolos. Não tive paixonetas de adolescência por atores, cantores, jogadores, o que quer que fosse… Ainda hoje sou assim. Gosto muito de um poeta em especial e de algumas personalidades das mais diversas áreas, isto é, gosto muito do trabalho deles e não deles concretamente, porque na verdade não os conheço. Assim, admiro-os pelo que fizeram ou conseguem fazer, mas não sei se os estimo, porque teria que os conhecer pessoalmente para o saber. O Gomes foge à regra.
Sou a irmã do meio entre rapazes e, como eles não gostavam de bonecas, de vez em quando, gostava eu da bola e sempre que jogávamos aos penaltis lá em casa, invariavelmente, eu encarnava o Gomes e não se falava mais do assunto. Eu era o Gomes e os meus irmãos que escolhessem entre os outros do plantel azul e branco. Eles recorriam a alguns estrangeiros, o mais velho, por exemplo, era o Zico, apelido pelo qual ainda hoje é conhecido entre os colegas da escola… Eu era invariavelmente o Gomes. Gostava tanto dele, que fiquei absolutamente desgostosa com a sua transferência para o Sporting, onde viria a terminar a sua carreira. Sei que a responsabilidade da transferência foi mais da estrutura do que da sua vontade. Assim, anos mais tarde, voltaria àquela que sempre foi a sua casa para trabalhar na direção do seu clube. O Gomes foi, portanto, quem mais se aproximou de um ídolo para mim, na tenra idade dos nove ou dez anos. Ai de quem se atrevesse a dizer algo de menos positivo em relação à sua pessoa! Nem o Paulo Futre ou o Rabah Madjer conseguiram ofuscar o seu valor aos meus olhos!
Pelo sonho, pela ilusão, pela alegria e vitórias proporcionadas, o meu gigantesco obrigada!
Ao refletir sobre este assunto, constato que cresci num ambiente masculino: dois irmãos e os meus primos com quem mais convivi pela proximidade etária, todos rapazes! Foi sendo assim pela vida fora! Na faculdade, o meu grupo de amigos era constituído maioritariamente por rapazes e tenho amigos homens que foram ou são fundamentais na minha história de vida.
Sinto-me em dívida contigo, Zé Silva. Serás o único que vou particularizar, por querer há muito tecer-te um agradecimento público. Já o fiz, mas não estavas presente e ainda não nos tínhamos reencontrado no facebook!
O Zé é responsável pelas minhas publicações. Antes dele, tudo ficava na gaveta. Certo dia, convidou-me para colaborar com uma rubrica no jornal “Viver Valpaços”, o que fiz durante três anos (o prazo da sua existência). O Zé nem sabia que eu escrevia ou como escrevia. Fizemos um acordo, disse-lhe: eu escrevo-te um texto, dou-to a ler e tu prometes-me que só publicas se considerares ter qualidade suficiente. Era uma gaiata de 25 anos, desconfiada do que conseguiria fazer, tal como hoje ainda. A ideia de mediocridade sempre me afligiu! Não melhorei nada, nesse aspeto! Sugeri que pedisse colaboração a outra pessoa.
 Resposta pronta: “Sónia, se quisesse um artigo sobre moda até poderia ser. Não é essa linha que pretendo.”
Surgiu, dessa forma, o meu primeiro texto público: “O reino do faz de conta”. Poderia ser perfeitamente uma crónica destas. Consistia numa crítica a um estado de coisas neste país!
Julgo que o Zé nunca compreendeu o significado dessas palavras. Reconhecia-me, ele, alguém que admiro e estimo pelo ser humano que é e pela sua vasta cultura, capacidade para poder com ele colaborar, sem nunca ter lido nada meu! Deduzo que terá chegado a essa conclusão através das nossas conversas, da nossa convivência. Na altura, Zé, estarias próximo dos 40 anos, mais velho, mais experiente, bem mais culto do que eu e, no entanto, vislumbraste, vá-se lá saber como, algum potencial. Se o gosto pela escrita existia, depois disso, entranhou-se definitivamente. Obrigada. Julgo que não serei caso único, mas quem assim entender que se manifeste.
Sou uma felizarda, porque as circunstâncias da vida têm-me trazido os amigos de que preciso para crescer, para evoluir, para não me deixar sossegar e exigir-me cada vez mais. A verdade é que o fazem mais os amigos homens do que as amigas mulheres (perdoem-me a franca honestidade). Identifico-me mais com os interesses masculinos do que com os femininos, salvo raras exceções (pronto, Lurdes Martins, já te identifiquei, podes sossegar…).
Pode parecer estranho a olhos alheios, mas não quero saber, porque tenho o pleno direito às minhas idiossincrasias e estou-me literalmente nas tintas para o que possam pensar! Não me interessam malas nem sapatos ou a cor da berra do verniz e tampouco a conversa constante sobre a escola ou os filhos! Também os tenho e também os amo, mas sou muito mais além de mãe. Recuso depositar-lhes a minha vida nas mãos e esperar a síndrome do ninho vazio! Hão de voar que é para isso que os crio e, quando tal acontecer, alegrar-me-ei por ter cumprido o meu papel.  A minha vida será preenchida com o meu ser.
Se é para ter uma conversa, deem-me a Literatura, a Poesia, a Arte, a História, a Sociologia, a Psicologia, a Filosofia e todos os domínios que pensem o Homem, a sociedade e a vida. Independentemente do género, venha até mim essa gente! Lamento, as ciências exatas são importantíssimas, mas não exercem qualquer fascínio em mim. Defeito meu, eu sei, mas tenho direito a ele!
Há em mim uma necessidade orgânica de me ligar a quem tem muito para me oferecer. Sou muito exigente, dizem-me constantemente em casa. Será a imperfeição que não consigo corrigir. Leio o que posso para aprender e evoluir, mas sempre se manifesta insuficiente, porque nunca terei tempo para ler o que preciso. Como ouvinte atenta que sou, aprendo também muito com os outros, assim eles possam partilhar o seu saber e bebo tudo sofregamente com ânsia de me cultivar. Ainda assim, sinto sempre ficar aquém. Nada nunca é suficiente e a ignorância que não quero mantém-se ao virar da esquina.
Aos meus amigos, na maioria homens que contribuem para afastar de mim tal cálice e manifestam interesses comuns, obrigada. Vou-me tornando uma versão melhor com a vossa indispensável ajuda. Sou um sorvedouro oportunista, reconheço-o, mas retribuo com o que me é possível… Perdoai se o saber não é tanto!
Nina M.  






quinta-feira, 17 de outubro de 2019

Difícil viver só entre a multidão

Difícil viver só entre a multidão
Sentir que se é só
Tanto quanto ao nascer e ao morrer
Só no caminho sinuoso do encontro de si
Renegar convites alegres de fútil companhia
E encontrar o sonho numa solidão equivalente
Abraçá-la como se abraça a gente...
Sina que sempre se adivinhou
Ao longe no destino que traçou
Caminho sem retorno de êxtase
As palavras ficam vazias, abstratas
Nem sinal de poesia!
Eu, que as venero e as amo!
Que nelas me queria poder fundir 
E delas me cobrir por inteiro
Estranha condição de ser infinito
De alma em revolução
E o fosso entre mim e os outros que não vejo
Vai-se cavando lento e moribundo
No movimento natural da ordem das coisas
Totalmente só no meio de tanto ruído
Só uma voz quero ouvir
Só uma voz quero seguir:
A do silêncio impoluto que escuta.

sábado, 12 de outubro de 2019

Delírio de poeta

Ser poeta é também saber dizer o que não sente
Dizer uma verdade como quem mente
E olhar-se só na sua crua nudez
Rasguem esses versos tristes
Apaguem a alma de quem os fez
Só trazem angústias as suas palavras
Dores e cinismos enrubescem a tez
Pesar de todos, de quem os lê!
Espíritos doentios e insanos
Atirem ao vento as folhas escritas
De palavras vãs, ilusórias e malditas
Abençoados poetas, boas almas proscritas
Que trazem à luz a mórbida podridão
Perdida algures, escondida talvez no coração

Crónica de Maus Costumes 151


Rescaldo           

            Uma semana após o ato eleitoral e o mesmo ainda dá que falar, apesar de o resultado ser o que já se adivinhava!
            Curiosamente, neste momento, nem se discute se foi o Costa que realmente venceu ou o Rio que não soube ganhar… Parece, então, que estes dois senhores não têm grandes novidades para oferecer aos cidadãos. Bem analisada a situação, entre os dois maiores partidos do centro, um mais virado à esquerda e o outro à direita, as diferenças nem são assim tão assinaláveis! Às vezes interrogo-me sobre o motivo de tanto circo no hemiciclo se quando a oposição passa a Governo é mais um pouco do mesmo! Ah! Já sei… A laranja do Passos Coelho tornou-se demasiado liberal! Verdade, mas essa também nunca foi a génese do partido. A sua verdadeira identidade foi criada e reside no programa do tempo do falecido Dr. Francisco Sá-Carneiro, a quem dei um beijo, num dos seus comícios (tinha uns meros cinco anos e toda vaidosa e triunfal atirei em casa com uma certa admiração que tinha dado um beijo ao senhor Carneiro, que era um homem e não um bicho!). Certo é que o momento me ficou na memória. Estava ao colo da minha prima Alexandrina, jovem já espigadota, que me atirou contra o candidato, a quem espetei um beijo na bochecha direita, se a memória não me atraiçoa. Pouco mais tarde, lembro-me de ver o ar de estupefação dos meus pais ao saberem da morte do político, num suposto acidente de aviação. Quando questionei, a resposta terá sido: o Sr. Carneiro a quem deste um beijinho morreu, porque o avião onde ia caiu. Foi a primeira vez que tive contacto com o espírito português sebastianista e messiânico sem sequer imaginar o que isso era.
 O país ficou órfão, tal como há muitos séculos, no rescaldo de Alcácer-Quibir. Sá-Carneiro era o novo D. Sebastião e, tal como ele, não sobreviveu para conduzir o país ao Quinto Império tão desejado por Padre António Vieira e por Fernando Pessoa!
            De lá para cá, as desgraças económicas e políticas sucedem-se: quatro bancarrotas, todas durante a governação PS. Ninguém ensina economia a essa gente?!
Depois, vêm as laranjas mecânicas arrumar a casa e arrumam tudo tão direitinho que espremem o sumo todo! O povo farta-se do espancamento e já esquecido da desgraça económica anterior renovam a confiança e a história vai-se repetindo, repetindo, repetindo ad infinitum e já ninguém tem paciência! Talvez por isso ninguém queira saber que o António Costa tenha apenas conseguido mais uns meros 120 mil votos e o Rio tenha levado uma sova, apesar de não considerar isso uma hecatombe. Por mim, se conseguissem reunir o melhor dos dois partidos, sem fazerem da política um saco de gatos metidos ao barulho, seria magnífico. Um novo partido com a junção do melhor dos dois mundos, deixando de fora todos os incompetentes e oportunistas que ambos carregam e talvez, talvez pudéssemos começar a almejar algo de novo.
            Enquanto tal não acontece, entretém-se a opinião pública com falsas notícias, enxovalhos e falta de respeito para quem soube conquistar o eleitorado. Se querem contestar Joacine e o Ventura (por este último não nutro a menor simpatia) façam-no com argumentos válidos e ideias do que se pretende para o país, não com ataques diretos e desprezíveis às pessoas. As ideias existem para serem debatidas, no entanto, sempre com o respeito devido pelo indivíduo. Gozar com a gaguez de alguém não é aceitável. Diminuir o outro por fatores externos à ideologia e disparatados é cobardia. A representação destes partidos na Assembleia deveria fazer refletir os políticos de tradição, tal como a elevadíssima abstenção! O afastamento cada vez maior entre o cidadão comum e a política dá origem a fenómenos estranhos. Trump e Bolsonaro não surgiram do acaso…
Já agora, mete-me sempre muita confusão ver gente a encarniçar-se (e bem) contra o fascismo, mas depois aceitarem placidamente o comunismo, que é capaz exatamente das mesmas aberrações, como o provam os mais variados exemplos. O último e mais recente é o Maduro, de quem tanto gosta o nosso BE e o Partido Comunista! Um povo submetido à ideologia marxista é tão espezinhado e sofredor quanto o que é submetido ao fascismo. Como ainda não se percebeu isto?! Como é possível os partidos não se demarcarem destes figurões?!
Regimes totalitários sejam eles de direita, sejam de esquerda, nunca mais!
Nina M.

           


quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Queria escrever ...

Queria escrever ...
O mais belo poema de amor
Como uma palavra simples
Atirada ao vento sem pudor
Ou a chuva miúda de verão
Que sempre soa a bela canção
O amor sublime e transcendente
O que não está ao alcance da mão
Poder...
Transformar a natureza e o ser
Alcançar a "divina loucura" de Platão
E que faz todo o Homem estremecer
Ser...
O poeta inspirado da coisa indizível
O pintor aprimorado das emoções
Mas escorregam as palavras
Como fio de água por entre os dedos
Líquidas e furtivas
Fecham-se ambas as mãos
Presunção inocente de quem quer
Aprisionar a poesia vadia
Em vão...
Ela nasceu para ser livre e inteira e magia
Não é, porém, maior que o amor que canta
Antes a sua fiel escrava e que espanta
À espera do absoluto da vida
Da sorte que lhe soprará o verso perfeito
E assim mostrar ao mundo
A sua beleza...A grandeza desmedida

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Sinto o cheiro cálido da melancolia

Sinto o cheiro cálido da melancolia
Leve e suave odor a rosas
Pétalas já desmaiadas
Adivinham-se no ar plácido
Foi a tristeza que te embalou
Levou-te o brilho de meus olhos
És ânsia amaciada por amor
Sorriso do silêncio e da solidão
Nas mãos vagas e vazias
O sabor da felicidade que se quer guardar
Encerra-a no espírito último
Onde se guardam as coisas sagradas
E onde sempre se volta para sonhar

sábado, 5 de outubro de 2019

Crónica de Maus Costumes 150


Ainda assim, viva a República!

            Há coincidências felizes! Reparo no número redondo e gordo desta rubrica: cento e cinquenta! É um bom número! Representativo das crónicas semanais quase sem interrupções, que têm vindo a ser urdidas há cento e cinquenta semanas. Que melhor dia haveria para o celebrar que este 5 de outubro em que se comemora a implantação da República e em simultâneo o dia professor?!
Festejo duplamente: sou republicana por convicção e também sou professora. Convém, porém, referir que os motivos para a celebração se prendem apenas com o ideal que a República e o professorado representam e não pelo facto de possuir grandes motivos para festividades.
O meu republicanismo prende-se com o facto de acreditar e defender que todos os cidadãos nascem livres e iguais em direitos e deveres e que, apesar das dificuldades e até das oportunidades diferentes, todos, sem exceção, podem aspirar a contribuir para os desígnios da nação, caso se considerem capacitados para tal. Os monárquicos poderão alegar que a casa real seria mais adequada, pois a educação dos príncipes, futuros representantes da nação, é feita com zelo, para que estejam à altura do desafio. Não contesto, mas peca por falha grave: a de se basear o acesso aos mais altos desígnios do país no fator hereditariedade, sem que os cidadãos possam escolher livremente o seu representante. A esse sistema falta a democracia plena exercida através do direito ao voto. Tudo o que implique dano na liberdade de cada um não terá o meu acolhimento.
No entanto, sou obrigada a reconhecer que a República tem falhado imenso com os cidadãos. Não deixo de pensar que vivemos num regime quase feudal sob a capa de pretensa democracia republicana! Os impostos pagos aos senhores, na Idade Média, são agora pagos ao Estado. Lá como agora: as regalias obtidas pelo pagamento das taxas continuam aquém do desejável! O problema é antigo: investimentos errados e desvios indevidos. Desta forma, o povo, para não dizer a arraia-miúda, continua a ver uma boa parte do seu rendimento esmifrado para senhores, mas atualmente, camuflado sob a capa da boa intenção do bem comum! Acresce o seguinte: apesar de teoricamente todos os cidadãos poderem chegar ao Governo da nação, o que a História nos põe em evidência é o facto de se perpetuar uma espécie de hereditariedade na ocupação dos cargos governativos! É caso para dizer: “filho de peixe sabe nadar!” Durante anos, entre a tarefa de governar e a de fazer oposição, os rostos vão sendo os mesmos e com tradição familiar. A diferença reside no facto de terem sido eleitos. Ora bem, não é totalmente verdadeiro, uma vez que elegemos apenas o representante de um partido e não todos os elementos de um governo. A democracia não é pura na escolha de um governo, pelo que se pensarmos bem, ainda encontramos laivos de uma Monarquia embutida. Já agora, o nosso Portugal tão peculiar não implementou a República em todo o território em 1910! Os flavienses apenas hastearam bandeira dois anos mais tarde (1912) e andaram às turras com o Paiva Couceiro e as Invasões Monárquicas. Quem conhece um pouco da História local, fica a saber que os rostos que circulavam nos Paços do Concelho na Monarquia eram os mesmos no tempo da República! Seriam convicções bastante flexíveis! De modo que de lá para cá pouco ou nada mudou! Esvai-se assim o meu ideal de República, aquele em que acredito verdadeiramente e desejo para o meu país…
Estabelecendo a ponte com a flexibilidade que querem na Educação, parece-me que poderia ser uma estratégia proveitosa, mas acredito que se trata mais de um meio para atingir determinado fim! Não vislumbro um verdadeiro interesse em fazer com que os alunos aprendam mais e melhor e sejam justamente avaliados em função da evolução e das aprendizagens reveladas. Fico com a impressão de que se trata de uma forma de se atingir mais rápida e eficazmente uns almejados números na literacia para fazer boa figura nos estudos da OCDE. Não obstante, a quem interessa ter cidadãos livres pensadores e questionadores de uma ordem instituída? Por certo, não às elites que nos têm governado. Quem leu Aldous Huxley e George Orwell saberá que nada melhor do que o pensamento instigado e controlado em massa para evitar a rebelião e eliminar o pensamento crítico. Quanto mais ignaro o povo, melhor para o governante. Em Orwell até o extermínio da palavra acontece. A inexistência do lexema liberdade gera a impossibilidade de nela pensar, já que o pensamento é formulado com o verbo! De modo que também na sociedade orwelliana e também de Huxley havia uma espécie de Índex e as narrativas históricas eram constantemente reformuladas, repetidas à exaustão até se inculcarem na memória coletiva. Uma mentira repassada infinitamente torna-se verdade! Isto há coisas! O que a literatura vai buscar! Como se tal fosse possível! O problema é que enquanto se fornece o circo ao cidadão, (televisão, internet, jogos…) o político aprende realmente com os livros! Há que causar dependência do que não se precisa e ir retirando e fornecendo o brinquedo consoante a necessidade. Mantém-se o povo entretido e esbaforido, com o objetivo de ter acesso a uma falsa necessidade criada pelo mercado e quando se quer ser bonzinho, permite-se que lá chegue um pouco mais rápido. Assim, com papas e bolos se enganam os tolos.
Os professores, esses seres que por aí vão pululando e que têm a obrigação de serem analíticos e desejarem formar cidadãos críticos, têm de ser afrouxados, manietados e contaminados pelo desânimo. Pode ser que assim a angústia seja tão forte que se deixem seduzir pelo pensamento comum e em vez de serem ovelhas tresmalhadas passem a conduzir o rebanho pelo trilho de todos!
Faço honra a José Régio e ao seu “Cântico Negro”: “Não sei por onde vou/ Não sei para onde vou/ - Sei que não vou por aí!”

Nina M.



sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Não sei se são mentira ou verdade

Não sei se são mentira ou verdade
As narrativas que me invento
Mas sei serem um bom placebo
Para adoçar o pensamento
Viajo para além de mim
Crio mundos, uma nova dimensão!
Que fazer quem nasce assim
Pródigo de imaginação?!
Tão real este sentir
Da personagem que pari
Sorrio ligeiramente ao vê-la
 A ser idêntica a si
Cavalgo na fantasia
No universo do impossível
Deliciosa essa harmonia
Inversa ao real tangível...
Viver dentro e fora de mim
Com toda a consternação
Não é meio nem um fim
Apenas intrínseca condição!
Formulo novas existências e fascínios
Etéreas emoções reinvento
Diálogos improváveis mas tão reais
Fruto só do pensamento.
Perco-me dentro de mim!
No labirinto que me adentra
Nele me vou procurar
Se é ilusão não me assusta
E lá desejo morar
Que é na casa do meu ser
Onde sempre me vou encontrar.