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sexta-feira, 27 de julho de 2018

Crónica de Maus Costumes 92



                Escrevo no rescaldo de ontem, que para mim foi um dia triste.
            Compreendo que tenhamos opiniões diferentes e que temos de saber conviver com elas, em nome da tolerância e do civismo. No entanto, também tenho o direito de manifestar a minha em toda a sua plenitude. E hoje, só assim consigo limpar a alma. Sinto que os professores tiveram a oportunidade de apresentar um desfecho histórico, exemplar e honrado, se todos ou quase todos tivessem feito greve e ficavam mais do que salvaguardados, mas optaram por não o fazer. Claudicaram a um passo da meta. E não me rebatam este argumento, alegando que está visto que o Governo não está disposto a dar grande coisa, porque para mim, que andei a contrato durante vinte anos, sem saber o que são progressões (que até já prometeram e até agora ainda não chegaram) o dinheiro é a última das minhas preocupações! Sempre soube viver com o pouco que ganho e assim continuará a ser.
            Para mim, a luta sempre foi por um ideal maior e aqueles que me vão conhecendo um pouco melhor, já sabem que gosto de ideais. Defendi a dignidade de uma classe e uma questão que é da mais elementar justiça e, quanto mais me tentam acossar através da imposição do medo, mais sinto vontade de reagir.
            Não somos todos iguais. É um facto. E ouço constantemente: “Pensas que vais mudar o mundo”… Não. O mundo não se muda, mas posso mudar pessoas e as pessoas, globalmente, mudam o mundo. Ainda não desisti. Se estiverem atentos, já há movimentações nas redes sociais para se criar um fundo e processar o ME. Estou dentro, obviamente! Nem poderia ser de outra forma, por imperativo de consciência, no que ao uso de ética me diz respeito.
            Deixem só que partilhe algumas reflexões convosco. É desta forma, no respeito absoluto por leis execráveis, que surgem devagarinho, quase sem se dar conta os regimes totalitários.
            Após o Holocausto, os julgados em Nuremberga, também alegaram que se limitaram a cumprir a lei. Fenómeno que Hannah Arendt explicou com a banalização do mal. E a lei era uma atrocidade contra os judeus e outras minorias étnicas, reconhecida por todos atualmente.
Por mais que o paralelismo vos pareça exagerado, acreditem que é destas pequenas coisas, que aos olhos podem parecer menos graves, que se vai construindo uma ditadura. O que nos fizeram foi um atentado ao Estado de Direito, colocando-se um regime democrático em suspensão pelo tempo que deu jeito ao Governo! Eu recuso-me a aceitar isto passivamente. Fomos obrigados a aceitar? Desculpem, mas não fomos. A partir do momento que no email com vista à coação está escrito claramente que quem estiver de greve se encontra ao abrigo da lei, o caminho, para mim, continua a ser o mais óbvio… Medo? De quê?! De um processo disciplinar coletivo, que teria de ser analisado por um Tribunal Administrativo? Creio que foi o medo que paralisou os professores e lastimo. Se uma classe instruída, que deveria ser a garantia da intelectualidade, que tem por obrigação de saber defender-se da melhor forma, através dos meios lícitos ao dispor sente medo, então o vinte e cinco de abril nunca aconteceu!
E essa é outra das minhas dores. Os professores não dignificaram a memória dos que construíram e lutaram por abril. Se algum dia tiverem oportunidade, visitem o atual Museu Militar no Porto, antiga sede da PIDE, e ouçam a História que aquelas paredes têm para contar… Houve gente que entrou, mas ninguém viu sair. Gente que deu a vida por abril, para que nunca mais houvesse medo! O que eu vejo é uma classe que deveria saber disto e vive cheia de medo! E enquanto assim for, o respeito não chegará, apenas porque não nos sabemos fazer respeitar. Coloquemos os olhos nos trabalhadores da Autoeuropa ou na greve dos estivadores, de cada vez que acontece… Gente menos instruída e mais consciente dos seus direitos e dispostos a por eles pugnarem. Merecem a minha admiração.
Sinto ter feito tudo o que podia e o que a consciência me ditava e, por isso, não vivo o sabor acre da desistência. Carrego sim, desilusão, que também faz parte da aprendizagem da vida.
Aos que permaneceram firmes e souberam resistir até ao fim, o meu especial apreço. A mudança só pode vir por aí.
Agora, ide de férias e recuperai as energias consumidas…

Nina M.



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