O inesperado acontece
Quem se lembra da publicidade: “E se
de repente um desconhecido lhe oferecer flores, isso é impulse”? O “impulse”
era um desodorizante ou algo similar. O trocadilho com o nome sugere o impulso
que o odor do produto despertaria no homem mais próximo para oferecer flores à
dama.
Publicidade enganosa. Nem os
conhecidos, quanto mais os que nos desconhecem! O mais próximo que já estive
disso foi terem-me deixado, efetivamente, um ramo à porta de casa, mas seco e
morto, em sinal de desprezo pela minha indiferença. Foi merecido e granjeou uma
ponta de simpatia pela imaginação e pelo trabalho de o comprar e de o deixar
secar para me ser ofertado. Arrancou-me uma boa gargalhada e, claro, o trabalho
de o colocar no lixo. Também é o que dá não saberem que prefiro livros a
flores, porém, ainda bem, caso contrário, ainda me deixavam à porta um dos
escritos do Paulo Coelho ou coisa que o valha! Obviamente, tal acontecimento
remonta à minha época insana de juventude. Coleciono alguns pequenos remorsos,
mas também há homens que não facilitam… Faço o mea culpa por ter sido um bocadinho inconsequente e brincalhona,
mas sob uma ténue nesga de possibilidade de ir tomar um café, foi um choque
quando confirmei que disse que iria, mas que não tinha referido nem o mês nem o
ano… Eu sei… Não me porto sempre bem. Hoje, mais madura, não faria tal… Um
“não” seco chegaria. Eis o motivo do presente mais original que alguém já me
ofertou.
No entanto, deixa a pensar sobre a
psicologia masculina e a manifesta incapacidade de alguns em lidarem com a
rejeição, como se as mulheres, objeto do seu desejo, fossem obrigadas a ceder
aos encantos dos conquistadores. Ora, nunca fui propriamente mulher para ser
conquistada como troféu que se ergue alto, ganho em qualquer competição. Por outro
lado, os machos com a mania de D. Juan de trazer por casa, nunca me seduziram,
para além de me conseguirem irritar e dar vontade de os expor ao ridículo. A propensão
masculina para a posse de forma animalesca é absurda. Já deveriam ter aprendido
que a expressão “ a minha mulher” não significa que ela lhes pertença como qualquer
outro bem. Na verdade, significa: a mulher que ainda desejo, com quem estabeleci
um contrato e que se mantém válido, enquanto ambas as partes o desejarem. A mulher
não é um bem material, sem vontade própria, que possa ser entendida como propriedade
privada de alguém. É um ser dotado de livre arbítrio, de inteligência e de emoções,
capaz de fazer as suas escolhas, em plena posse de suas capacidades, não alguém
para subjugar ou agrilhoar. Valido o discurso para os homens, também. O verdadeiro
companheiro caminha ao lado, não à frente nem atrás, satisfeito pelo encontro que
a vida lhe proporcionou e orgulhoso do trajeto. Menos do que isto é nada. Poderá
não ser mais, mas isto é o mínimo exigível num relacionamento que se quer saudável.
Gostaria
que muitas mulheres tivessem esta consciência para não se deixarem subestimar nem
desprezar. A humilhação do outro é a arma dos incapazes.
Nina
M.
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