Confinamento e irritações
Pressuponho
que o longo confinamento que vivemos não deixa ninguém saudável, tanto física
quanto psicologicamente. No que respeita a condição física, para mim não fez
grande diferença, dado que continuei ativa e com as corridinhas habituais. No
entanto, a componente mental começa a evidenciar exaustão, devido à situação
que se arrasta já há um ano. É muito tempo de clausura e a vida monástica nunca
foi uma opção para mim.
A
capacidade de colocar a situação em perspetiva também me faz saber que sou uma
afortunada, sem grandes razões para o queixume. Aliás, sou pouco dada a isso…
Concedo-me o direito à lástima durante um tempo, porque todos nós precisamos de
um período de adaptação, mas tento sempre enquadrar a situação na devida
moldura, para perceber que os meus motivos para o agastamento são ridículos se
comparados com tantos verdadeiros problemas reais. A partir do momento em que
mantenho o trabalho, o salário, a minha saúde e dos que amo, não há lugar para
reclamações sob pena de cair no ridículo… Não falarei, portanto, do tanto que
me falta, por considerar que o melhor a fazer nesta situação é olhar para o
tanto que me sobra. Porém, se há algo em que o confinamento começa a fazer das
suas é no que diz respeito à irritabilidade. Se a estupidez por si só já me
causava algum prurido, neste momento, sinto sérias dificuldades em lidar com
ela e vejo a minha paciência esgotar-se num ápice, perante algumas situações.
Incomodo-me,
desde logo, com a minha classe profissional e com as queixas de alguns bebés
chorões que nunca estão satisfeitos com nada. Desconfio que a única solução
para essa gente era ficar de papo para o ar em casa, sem fazer nada e ver o
dinheirinho a cair na conta ao final do mês. Eu também gostaria que me saísse o
euromilhões, não para ficar inativa, pois não teria paciência para tal, mas
para fazer única e exclusivamente o que me apetecesse e aquilo de que
verdadeiramente gosto e que para aqui não vem ao caso…
Falo,
obviamente, das vacinas e dos comentários chorosos (e estúpidos, já agora)
sobre a obrigatoriedade ou não de a tomar e os medos exagerados que muitos
revelam. Se falamos em desconfinar, aqui
d’el-rei quem me acode, porque é
um perigo e nem pensar… Sem vacina deveríamos todos recusar regressar à escola!…
Onde já se viu?! E catrapumba! Cá vêm os discursos miserabilistas de fazerem da
classe carne para canhão, etc e tal! Muito bem. Vamos desconfinar e os
professores vão ser vacinados. Era o que haveria de faltar! Vamos servir de
cobaias e não veem os problemas que têm surgido por esse mundo fora?! E chegam
logo os arautos da desgraça a anunciar que daqui a dois anos é que vai ser
bonito, porque vai começar gente a morrer em barda por causa dos coágulos
originados pela vacina e sei lá o que mais… Ufa! Haja paciência!...
Meus
amigos, não se querem vacinar? Não vacinem. Não são obrigados a isso, mas
depois não se lamentem por se sentirem inseguros e se, eventualmente, contraírem
a “gripezinha” lembrem-se também de que não podem prever possíveis sequelas
futuras. A vacina pode causar efeitos secundários graves em alguns de nós?
Pode. Tal como qualquer medicamento. A comunidade médica iria permitir que se
inoculasse em massa a população com algo que fosse mais prejudicial do que
benéfico, já depois de toda a testagem que foi efetuada? Obviamente, que não!
Deixemo-nos de teorias da conspiração sem nexo e confiemos nos cientistas que
têm vindo a trabalhar arduamente para nos devolverem a normalidade o mais
rapidamente possível! Lembram-me aqueles pais modernaços e inconscientes que
optam por não vacinar os filhos contra o sarampo, por exemplo. “O meu filho não
foi vacinado e nunca apanhou!” Pois não! Grande parvo! Só não apanhou por haver
imunidade de grupo já que a larga maioria se encontra inoculado. Deixássemos de
o fazer e logo se veria… Por essa ordem de raciocínio, ainda hoje teríamos
gente a morrer de tuberculose… Perco as estribeiras com isto! Depois, há
aqueles que não sabem se serão vacinados na área de residência ou na área da
escola, pois trabalham a muitos quilómetros de casa e se sentirem efeitos
secundários como faço para voltar para casa? A sério? Isso é alguma questão? Se
tiver algum problema muito sério será transportado para o hospital, se sentir
uma ligeira indisposição lá terá que a aguentar ou pedir a alguém que o vá
buscar. Como faria caso se sentisse mal num dia normal de trabalho?!
Não
há paciência! Gente que gosta de complicar e que para cada solução encontrada
adora arranjar um novo problema com a esperança que seja insolúvel!
Tudo
isto me causa uma ligeira irritaçãozinha, mas a grande urticária surge com a
passividade das agendas políticas, dos interesses partidários e da apatia de
muitas ONG, muito defensoras dos direitos humanos quando por qualquer razão
oculta lhes interessa, mas muito relapsas noutras situações. Ando há uma semana
a tentar digerir a ira que se apoderou de mim, por uma situação que se arrasta
há tempos e que parece a ninguém indignar. Falo de Moçambique. Hoje uma
manifestação, em Lisboa, pró-desconfinamento, contra o uso de máscara, à luz do
que se encontra agendado noutros países europeus, porque de facto o uso da
máscara ou o cartão que indicará a nossa vacinação contra a COVID e que constitui
um grave atentado contra a nossa liberdade é que é indecoroso! Decapitar meia-dúzia
de crianças e chacinar comunidades, isso não interessa nada, porque se passa bem
longe de nós! Talvez se lhe pegar por outro lado, muitos senhores possam sentir-se
verdadeiramente ofendidos, indignados e começar a pressionar a comunidade internacional
a intervir naquele território, para se tentar pôr cobro ao desmando. Atenção, que
vou dar uma novidade: os moçambicanos são negros! Gente! São negros que estão a
ser chacinados! Será que assim resulta?! Mamadou, Ascenso Simões, bloquistas em geral,
alguém me ouve, por favor?! Querem agilizar algumas das vossas ações para chamar
a atenção para esta barbárie?! Serei a única alma a quem ferve o sangue, treme o
intestino e cai na raiva por se sentir impotente?
Fartinha
desta santa e honrada hipocrisia de uma sociedade tinhosa da qual me apetece fugir,
mas sem a qual não posso viver! Ó dilema!
Como diria o ilustre Fernando, na voz do seu Álvaro, “É o sono da
soma de todas as desilusões,/ É o sono da síntese de todas as desesperanças […]”
Nina M.
Sem comentários:
Enviar um comentário