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sábado, 13 de março de 2021

Crónica de Maus Costumes 223

 

As ilhas mágicas

Estou a acompanhar religiosamente, com a ajuda da box, o programa da RTP 1 “Mal-Amanhados – Os Novos Corsários das Ilhas”, que passa aos sábados, às onze da manhã, conduzido pelo comediante Luís Filipe Borges, mais conhecido por boinas, terceirense, e pelo escritor Nuno Costa Santos, micaelense. Trata-se de uma declaração de amor ao arquipélago onde nasceram, enquanto nos guiam por uma viagem gastronómica, paisagística, cultural e também de aventura, divulgando a identidade dos diferentes ilhéus.

Já estive várias vezes nos Açores e, se tudo correr bem, lá regressarei este verão para descobrir mais duas ilhas que ainda não conheço (Faial e Pico), redescobrir S. Jorge (belíssima) e a que melhor conheço, Terceira, onde vou amiúde e onde também não falharei, este ano. Os meus filhos adoram! Saltam de alegria quando sabem que vão aos Açores passar uns dias com as primas adotadas de coração e com o tio Carlos, que é o herói da criançada, por ter toda a paciência do mundo e ser amigo de fazer a vontade da canalha. De modo que estou a gostar imenso de assistir ao programa, de conhecer as particularidades, a história e a identidade daquelas gentes.

Não sei se por ir lá variadas vezes, se por ter lá a minha irmã de coração, certo é que adoro o arquipélago! Gosto de acordar de manhã e ir correr junto ao mar, gosto de ir ao mar depois de terminar a corrida, gosto da simpatia das pessoas, gosto da tranquilidade e da natureza, do verde que nos hipnotiza, das paisagens deslumbrantes e de um tempo que se faz de conversas, risos, amizade, simplicidade. Um tempo que se faz sem tempo contado. Gosto que a Terceira tenha lutado para se manter independente e o tenha conseguido, durante um certo tempo, durante o domínio filipino. O apreço dos terceirenses pelos touros deve vir da batalha da Salga. Gosto que a ilha tenha tido um papel importantíssimo nas lutas liberais. Foi de lá que D. pedro IV organizou o desembarque do Mindelo, com a participação do nosso Garrett. Gosto desta mesma ousadia que caracteriza a mui nobre, leal e invicta cidade do Porto. Gosto, essencialmente, de sentir no açoriano um profundo orgulho na sua terra e de ver que saem, muitas vezes para estudar, outras para ganharem mundo, quando o corpo jovem e a alma inquieta o pedem, mas de saber que desejam regressar a casa, ao ninho e às origens. O regresso ao ventre materno, à bruma em dias mais cinzentos, às paisagens exuberantes situadas num nico de terra abandonado no meio do atlântico, a cerca de mil e quinhentos quilómetros do continente. É no meio da natureza, no silêncio do paraíso ainda não estragado pelo homem, numa fajã, no cume de uma serra ou no meio do mato (como designam os açorianos o monte) que nos sentimos mais próximos de Deus e acreditamos na sua existência. Umas ilhas fantásticas, povoadas por desterrados, por vozes inconvenientes ao regime, nalguns casos, que souberam fazer da lonjura nova casa, com resiliência. Gosto da forma como o açoriano é ligado às suas tradições e atividades culturais. Nas pequenas ilhas proliferam bons artistas: cantores, músicos, escritores, fotógrafos… Têm imenso orgulho nos seus teatros amadores e filarmónicas, mantendo uma atividade cultural notável, que sabem valorizar e preservar. Gosto que o açoriano não seja o provinciano deslumbrado, aquele que vai à capital, que por lá permanece uns tempos e regressa com desdém dos que ficaram. Normalmente saem e regressam com vontade de empreender e de fazer evoluir a sua terra e as suas gentes. Regressam com a certeza de quem sabe que as ilhas são o melhor local onde podem viver, um paraíso raro e difícil de encontrar. Enfim, a sua pertença. Gosto de ver em cada ilhéu um Torga e o seu amor pelo Reino Maravilhoso.

Eu, que não sou açoriana e que não sei se gostaria de lá viver no inverno por precisar muito de sol e de me incomodar a chuva, sei que gosto cada vez mais de lá regressar no verão, de descobrir o que ainda não conheço… Os meus pequenos também, porque na sua inocência, como se fosse só uma questão de querer, perguntam muitas vezes:

- Mãe, porque não fazemos uma casa na Terceira?

- Por falta de dinheiro, filhos. Apenas isso.

Quem experimenta quer regressar. Como dizem os terceirenses: vais prová, vais comê e vais gostá! (Quem precisa do “r” final do infinitivo?)

Estou em falta para com esta gente, que terei que remediar antes do regresso e do périplo pelo grupo central. Falta a leitura do Nemésio “Corsário das Ilhas” e de Raúl Brandão “As Ilhas Desconhecidas”. Fica a promessa.

 

Nina M.

 

           

 

 

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