As ilhas mágicas
Estou
a acompanhar religiosamente, com a ajuda da box, o programa da RTP 1
“Mal-Amanhados – Os Novos Corsários das Ilhas”, que passa aos sábados, às onze
da manhã, conduzido pelo comediante Luís Filipe Borges, mais conhecido por
boinas, terceirense, e pelo escritor Nuno Costa Santos, micaelense. Trata-se de
uma declaração de amor ao arquipélago onde nasceram, enquanto nos guiam por uma
viagem gastronómica, paisagística, cultural e também de aventura, divulgando a
identidade dos diferentes ilhéus.
Já
estive várias vezes nos Açores e, se tudo correr bem, lá regressarei este verão
para descobrir mais duas ilhas que ainda não conheço (Faial e Pico),
redescobrir S. Jorge (belíssima) e a que melhor conheço, Terceira, onde vou
amiúde e onde também não falharei, este ano. Os meus filhos adoram! Saltam de
alegria quando sabem que vão aos Açores passar uns dias com as primas adotadas
de coração e com o tio Carlos, que é o herói da criançada, por ter toda a
paciência do mundo e ser amigo de fazer a vontade da canalha. De modo que estou
a gostar imenso de assistir ao programa, de conhecer as particularidades, a história
e a identidade daquelas gentes.
Não
sei se por ir lá variadas vezes, se por ter lá a minha irmã de coração, certo é
que adoro o arquipélago! Gosto de acordar de manhã e ir correr junto ao mar,
gosto de ir ao mar depois de terminar a corrida, gosto da simpatia das pessoas,
gosto da tranquilidade e da natureza, do verde que nos hipnotiza, das paisagens
deslumbrantes e de um tempo que se faz de conversas, risos, amizade,
simplicidade. Um tempo que se faz sem tempo contado. Gosto que a Terceira tenha
lutado para se manter independente e o tenha conseguido, durante um certo tempo,
durante o domínio filipino. O apreço dos terceirenses pelos touros deve vir da batalha
da Salga. Gosto que a ilha tenha tido um papel importantíssimo nas lutas
liberais. Foi de lá que D. pedro IV organizou o desembarque do Mindelo, com a
participação do nosso Garrett. Gosto desta mesma ousadia que caracteriza a mui
nobre, leal e invicta cidade do Porto. Gosto, essencialmente, de sentir no
açoriano um profundo orgulho na sua terra e de ver que saem, muitas vezes para
estudar, outras para ganharem mundo, quando o corpo jovem e a alma inquieta o
pedem, mas de saber que desejam regressar a casa, ao ninho e às origens. O
regresso ao ventre materno, à bruma em dias mais cinzentos, às paisagens
exuberantes situadas num nico de terra abandonado no meio do atlântico, a cerca
de mil e quinhentos quilómetros do continente. É no meio da natureza, no
silêncio do paraíso ainda não estragado pelo homem, numa fajã, no cume de uma
serra ou no meio do mato (como designam os açorianos o monte) que nos sentimos
mais próximos de Deus e acreditamos na sua existência. Umas ilhas fantásticas,
povoadas por desterrados, por vozes inconvenientes ao regime, nalguns casos, que
souberam fazer da lonjura nova casa, com resiliência. Gosto da forma como o
açoriano é ligado às suas tradições e atividades culturais. Nas pequenas ilhas
proliferam bons artistas: cantores, músicos, escritores, fotógrafos… Têm imenso
orgulho nos seus teatros amadores e filarmónicas, mantendo uma atividade
cultural notável, que sabem valorizar e preservar. Gosto que o açoriano não
seja o provinciano deslumbrado, aquele que vai à capital, que por lá permanece
uns tempos e regressa com desdém dos que ficaram. Normalmente saem e regressam
com vontade de empreender e de fazer evoluir a sua terra e as suas gentes.
Regressam com a certeza de quem sabe que as ilhas são o melhor local onde podem
viver, um paraíso raro e difícil de encontrar. Enfim, a sua pertença. Gosto de
ver em cada ilhéu um Torga e o seu amor pelo Reino Maravilhoso.
Eu,
que não sou açoriana e que não sei se gostaria de lá viver no inverno por
precisar muito de sol e de me incomodar a chuva, sei que gosto cada vez mais de
lá regressar no verão, de descobrir o que ainda não conheço… Os meus pequenos
também, porque na sua inocência, como se fosse só uma questão de querer,
perguntam muitas vezes:
-
Mãe, porque não fazemos uma casa na Terceira?
- Por
falta de dinheiro, filhos. Apenas isso.
Quem
experimenta quer regressar. Como dizem os terceirenses: vais prová, vais comê e
vais gostá! (Quem precisa do “r” final do infinitivo?)
Estou
em falta para com esta gente, que terei que remediar antes do regresso e do périplo
pelo grupo central. Falta a leitura do Nemésio “Corsário das Ilhas” e de Raúl Brandão
“As Ilhas Desconhecidas”. Fica a promessa.
Nina
M.
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