Quando os filhos são fonte de inspiração.
- Ahahahah, Mãe! Adoro-te, sabias?!
- Até onde? Daqui à lua e volta?
- sim.
Vem o mais velho…
- Eu amo-te muito, mãe.
- Até à lua também?
- Huuummmm…. Até à Andrómeda! (Mal ele sabe que a mãe já lá esteve muitas vezes, na sua juventude – numa das discotecas da cidade onde estudou).
- E isso é longe, filho? (Sorria sem que ele visse).
- É outra galáxia, mãe!
- Ah! Então é amor suficiente – respondi.
- Sabes, mãe, tenho muito orgulho em ti - replicou.
- Porquê? – Perguntei.
- És muito trabalhadora. Estás sempre a trabalhar. Estavas a corrigir coisas e ainda vais fazer a crónica…
Ri-me.
- Que remédio! – Disse. Temos de trabalhar.
- Olha, mas tenho orgulho, porque podias escolher ser vadia, que eu sei que há mulheres assim… Que não querem saber de nada… Nem dos filhos…
- Ai é? Então e os homens? (Perguntei para saber se haveria alguma questão de género para resolver…)
- Esses? Ainda há mais! Olha, só querem beber e droga e não trabalham, mas o pai também não é assim.
- Pois não, respondi. Se assim fosse não era casado comigo.
- Porquê? Descasavas-te?
- Divorciava-me. É assim que se diz. Ou nem teria casado. Precisamos de quem nos ajude, não de quem nos prejudique.
Terminamos o diálogo com “ainda bem que nesta casa o único preguiçoso é o filho. Assim as coisas correm bem.” Riu-se e retirou-se.
Detesto o papel de mãe babada. É natural que todas as mães sintam orgulho na prole, mas quando é exagerado, soa-me a gente vazia que se apraz apenas com a conquista dos filhos, o que poderá significar que já não têm nada para conquistar por si. Sobrará, tarde ou cedo um vazio muito difícil de preencher. Não resisti, porém, a eternizar o momento doce e as declarações amorosas deles. Naturalmente, também lhes faço muitas e gosto de aproveitar estas, enquanto o pudor não os impede de desbragarem a alma. Com a idade ficamos mais contidos, mais austeros e carregamos um amor envergonhado de pais para filhos e vice-versa. Lembro-me de ser meiga com os meus progenitores, principalmente, com o meu pai a quem me lembro de beijar incessantemente. Não acompanhava o gesto com palavras. Penso que no meu tempo (e já pareço alguém muito idoso a falar) o amor era posto em gestos e não em palavras. Há quem diga que é o que verdadeiramente conta, porque as palavras, levam-nas o vento, porém, para mim, elas têm um valor especial e não devem de todo ser desperdiçadas. No entanto, se o amor é real pode ser dito também, porque lhe acrescenta beleza e transcendência. Não me lembro de ouvir os meus pais dizerem que me amavam, mas não duvido um segundo do amor deles. Sempre dispostos a deixarem as suas coisas para auxiliarem os filhos, antes de tudo.
Hoje, com os seus 82 anos, o meu pai passou por cá, devidamente mascarado e numa visita rapidíssima, para entregar um bolo-rei fresquinho, acabado de confecionar na pastelaria de confiança e os rebuçados da tosse de que os netos tanto gostam. É uma forma de contar o seu amor. Sei-o aliviado por ter ouvido as notícias e sentir que não lhe roubam o Natal, a companhia da filha e dos netos (sempre certos na noite de consoada) e quem sabe de todos, no almoço do dia vinte e cinco, conforme a usança. Por mim, assim que possa, refugiar-me-ei o mais que puder em casa. Deixar que passem uns dias para vermos se há o Natal habitual.
Leio-lhes nos olhos a preocupação e a saudade. O afastamento e a ausência cansam, principalmente aos que sabem ter um futuro bem mais curto que o passado. Verem-se privados, nesta altura da vida, do que lhes faz bem e do que os deixa felizes é tornar o tempo que lhes sobra mais insípido e mal passado…
Os netos anseiam tanto quanto os avós pela festa em família… Seja por palavras, seja por gestos, o amor familiar faz-se presente, tal como deve ser.
Nina M.
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