Crescimento e aceitação
Não
é a primeira vez que me perguntam se gostaria de voltar a ter vinte anos.
Respondo de imediato que não. Sem titubear e sem hesitação. Normalmente
acrescentam: “mesmo sabendo o que sabes hoje?” A resposta é a mesma e
perentória: um rotundo não! De seguida, olham-me com alguma estranheza.
A
minha juventude foi vivida com intensidade, como a idade o exigia, num
equilíbrio entre a responsabilidade e o divertimento. Olhando para trás, há
coisas que poderia ter feito de outra maneira, mas que foram o que tiveram de
ser. Há muita gente que me deixa saudade e que foram importantíssimas para mim
e que me marcaram, assim como o meu percurso. Talvez algumas delas não saibam o
quanto, no entanto, tudo isso faz parte de um passado único e irrepetível e que
me pertence em exclusivo. De lá até hoje, até aos meus quarenta e quatro anos,
idade que assumo sem pejo, há muito ser construído e refletido. Muitas dores,
perdas, alegrias e sucessos… Escolhas difíceis e necessárias que foram feitas e
um trajeto de crescimento e de exigência pessoal que não é feito só de
facilidades. A descoberta de si é um processo longo e se nos exigimos um
projeto de SER mais difícil se torna. Assim, regressar aos vinte seria um
retrocesso penoso.
A
minha idade permite que esteja a borrifar-me para o acúmulo de gordurinhas, a
maior flacidez da carne e as rugas que vão despontando, sinal claro de
maturidade! Sou mulher, logo sou portadora de alguma vaidade… Não escondo que
gosto de gostar da imagem que o espelho me devolve e que me preocupo com a
minha saúde e bem-estar. Procuro sentir-me bem fisicamente, mas porque gosto
que assim seja e não porque a sociedade o impõe.
Em
cada ruga haverá uma história que pode ser contada, batalhas ganhas e perdidas,
um caminho individual, às vezes, doloroso e que fez de mim o que sou no momento
com ainda tanto para ser! Nunca poderia regredir, porque não voltaria a ser
“eu”. E o meu projeto de ser é baseado no que já fui, no que sou e no que quero
construir! Seria, portanto, um ser distinto e desconhecido. Na verdade, há uma
consciência tão profunda da fragilidade e um reconhecimento do fim inexorável
que a todos nos espera que me traz uma leve melancolia para matizar a alegria
com que muitos me caracterizam e reconhecem. Eu sei que sou finita. Sei que a
morte vai chegar de uma maneira ou de outra e sei que tenho de viver a minha
vida como ela é e não o que poderia ser se recuasse no tempo mais sabida.
Ninguém quer saber da efemeridade nem se preocupa em alcançar o absoluto num
tempo limitado aos vinte anos! E se houve os que o sabiam, alguns deles puseram
fim à agonia por antecipação. Aos vinte, a poesia era ainda incipiente, não se tinha
agarrado à pele!
Por
isso, não, obrigada. Fico mesmo assim, como sou, com a idade que me pertence e
as suas marcas naturais e irreversíveis, ainda com imensa vontade de viver e de
construir com o que a vida tiver para me ofertar. Consciente até ao tutano do
seu cinismo e das suas perrices, mas com a determinação de quem não a quer largar
tão cedo.
Talvez aos noventa me consiga sentar
e olhar para uma vida cheia com desapego. Pensar que a partir dali, mais dia ou
menos dia não fará a diferença e que quando a ceifeira me bater à porta a reclamar
a entrada, eu não lha vou negar.
Então, quem sabe não nos sentamos ambas
a rirmo-nos desbragadamente da idiotice de nos levarmos tão a sério para constatarmos
que não temos importância nenhuma na engrenagem do universo e que a cada peça velha
que deixa de funcionar surge uma nova para a substituir.
Nina M.
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