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sábado, 8 de fevereiro de 2020

Crónica de Maus Costumes 167


Às belas mulheres maduras

            Apesar da gripe que me debela e me tem deixado combalida desde sexta, julgo que a recuperação se dará a partir desta noite. Quem me conhece saberá porquê.
            Já há algum tempo que queria abordar esta temática, no entanto, por motivos que não interessam aqui explorar, foi sendo relegada para outra altura. Pois bem, chegou o momento.
            A sociedade ocidental é implacável com as mulheres em qualquer idade, mas principalmente, a partir do meio século, parece que lhes querem passar um atestado de óbito antecipado. Se há uns anos, no tempo em que o atraso de Portugal em relação a outros países europeus era notório, a imagem da mulher portuguesa não era a mais atrativa, de lá para cá muita coisa mudou. Lembro-me sempre das palavras da companheira de um dos meus primos, nascido em França, acerca das mulheres portuguesas. “Afinal, não é como dizem, afirmava ela.” Perguntei o motivo da admiração e a resposta foi que as portuguesas eram tidas em França como as mulheres de bigode. Ainda estudava na Universidade, por essa altura. Tive de lhe explicar, em traços largos, o Salazarismo e os seus malefícios. A falta de alimento, que era uma preocupação real, a mão-de-obra pouco qualificada e era essa que emigrava nos famigerados anos sessenta e a lenta recuperação após a entrada na União Europeia, à data CEE. Lembro-me também das mulheres de quarenta ou de cinquenta anos quando era criança e, de facto, a sua aparência denotava uma vida difícil, em que se adivinhavam os poucos cuidados que dedicavam a elas mesmas. As saias justas de costureira com pouco gosto e pouco ornamento reinavam. A maquilhagem era pouco usual e então as calças só chegaram nos anos sessenta! Que ousadia revelaram as primeiras mulheres ao vesti-las nos meios rurais! A educação religiosa e repressiva no que diz respeito ao papel da mulher teve os seus efeitos nefastos na sua imagem. Impunha-se a mulher recatada, que não usava decotes nem saias curtas e mostrava pouca pele… Esta era a imagem da mulher de família, esposa e mãe. À socapa , os homens procuravam o atrevimento de outros braços desnudos e menos rígidos e bem mais livres. Eram perfeitas para os entusiasmos da alcova, mas não para andar de braço dado na rua, onde a hipocrisia reinante impunha os seus cânones. A revolução demorou a chegar, mas veio!
            Hoje, as mulheres de quarenta e de cinquenta anos estão bem cuidadas. São belas e não se vê despontar qualquer pelo! Estranho, por isso, que a sociedade as considere acabadas. Lembro-me das palavras de um parvo jornalista francês que disse, a certa altura, que as mulheres de cinquenta anos não lhe interessavam. Desconfio bem que seria exatamente o oposto. Provavelmente, as mulheres de cinquenta anos, independentes, seguras, belas e exigentes é que não se interessariam por um suposto macho-alfa, que tem mais de parvo do que de macho. Poderá fazer boa figura ao pé de meninas de vinte, ainda tão ingénuas e sem saber nada da vida, quanto as ausências de marcas do tempo no seu corpo. Dá vontade de responder-lhe como certa altura respondi a alguém que criticava uma miúda mais fortezinha: “deves achar-te a última bolacha do pacote! Tu, bem mais redondo do que ela e atreves-te a emitir um juízo de valor pouco simpático sobre a sua silhueta!”
Na verdade, a generalidade dos homens não revela grandes problemas de autoestima. Não se incomodam com a barriguinha que omite os abdominais! Por que razão as mulheres se torturam constantemente com pequeninos pneus que não lhes retiram a feminilidade? Por que motivo algumas de entre nós julgam que a vida termina aos cinquenta, se essa poderá ser mesmo a nossa melhor fase? Há jovialidade suficiente, segurança, sabedoria e independência. Há consciência de si e do seu valor. Maturidade para saber fazer escolhas acertadas e não dar conversa a quem não o merece. Cada etapa da nossa vida é importante e o amadurecimento faz parte da vida. O que se perde em elasticidade e rigidez ganha-se em sabedoria e interesse. Não tenho qualquer dúvida de que gosto mais de mim agora do que aos vinte! Mais culta, mais interessante, em relação a mim mesma. Se começo a fazer comparações, de cada vez que ouço ou leio George Steiner, Leandro Karnal, Eduardo Lourenço, Pacheco Pereira, entre tantos outros, meu Deus, sinto-me muitíssimo pequenina e tão ignorante, com a humildade suficiente para reconhecer que nunca lhes chegarei aos pés… O sentimento feio da inveja surge nesses momentos. A única inveja que me reconheço é a do conhecimento e a da cultura. Nada mais. Ainda assim… Tão melhor do que aos vinte!
            Queria essencialmente fazer um apelo às mulheres maduras hodiernas: não se fechem para nada. Talvez o melhor da vida vos esteja reservado a partir deste momento. Continuem livres, belas e seguras de vós… A vida trará o resto. Só não vale ser cadáver enquanto por cá andarmos com saúde!

Nina M.


           



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