Conversas…
Os miúdos são imprevisíveis. Quando julgamos que a curiosidade inata deles parece estar comprometida, alguns ainda nos vão surpreendendo.
Tenho um caso desses em sala de aula,
numa turma de sétimo ano, que a propósito de “O Cavaleiro de Dinamarca”, já me
fez perguntas surpreendentes sobre religião. A algumas pude responder, mas a
uma delas, especificamente, tive de lhe dizer que não sabia, porque ainda não
tinha morrido e nenhum dos meus mortos, até ao momento, se deu ao trabalho de
me vir dizer o que quer que fosse sobre o mistério. Ele interrogava-se sobre
como seria e estava a partir do princípio de que não haveria exatamente um fim,
mas também não sabe bem o que sobeja… Pudera! Nem ele nem ninguém!
O miúdo é distraído e não se
concentra. O seu pensamento viaja para todo o lado, mas não está na sala de
aula e só por lá permanece se surgir algo que chame a sua atenção e que foge,
normalmente, ao que é a aula em si. Tento sempre satisfazer a sua curiosidade,
na medida do possível…
Também os meus descendentes me
conseguem surpreender… Por estes dias, a minha pequena Matilde, enquanto almoçávamos,
atira-me com esta:
- Ó mãe! Eu quero saber o que é o
nada.
- Ah?!
- Preciso de saber como é o nada! Não
entendo.
- Bem… Pressuponho que o nada seja a
ausência de matéria e de pensamento… Ausência… No entanto, olha, havia um
médico muito famoso, o pai do escritor Lobo Antunes que, quando o filho lhe
perguntou se ele acreditava haver vida para além de morte, lhe respondeu que em
biologia o “nada” não existe…
O mais velho, entretanto, junta-se à
conversa…
- O nada é o vácuo. Se fores ao
espaço, podes falar, mas não te consegues ouvir, porque o som não se propaga no
vácuo, só no meio físico. Lá, é o nada.
- Então o nada é um lugar? Perguntei.
- Oh! Não percebes! É o vácuo. Não há
nada lá.
- E quando morrermos, ficamos
reduzidos a nada? – Perguntei-lhe.
- Olha, não! Há sempre átomos.
- Pois há. Ficamos em pó e mesmo que
esse se disperse ficam átomos… Então, repara, há matéria, sempre, mas haverá
ser? Há ser sem consciência?
- Ó mãe… Olha, não sei. Tudo quanto
existe são átomos.
Estive para lhe perguntar se havia
átomos na consciência… No cérebro, sim, mas a consciência é outra coisa… mais
imaterial …
Vem a pequena, novamente…
- Ó mãe, e o infinito? O Universo é
infinito…
- Então, o infinito é sem medida. Há
já cientistas que acreditam que o Universo não tem princípio nem fim e que não
surgiu com o Big-Bang, pois sempre existiu alguma coisa antes, os conjuntos
causais e que o Big-Bang foi um evento na formação do Universo.
Tenho de pesquisar enquanto se
conversa sobre estes assuntos, naturalmente…
- O universo é tão estranho! Eu não
percebo…
- Nem eu… É misterioso, queres dizer…
Depois, fiz uma pequena pesquisa e
fiquei a saber que não há região no Universo que apresente vácuo perfeito,
porque há sempre átomos e outras partículas, pelo que o vácuo é parcial. Pensei
no mais velho. Vou dizer-lhe isto. Faço um print e envio por WhatsApp. Às
vezes comunico-me desta forma com o “aborrescente” maior. Quando lhe quero dizer
certas coisas, mostro-lhe ou envio-lhe vídeos. Funciona melhor do que se ouvir
de mim… Teimam em ouvir as mães tardiamente!
Mais tarde, por gosto, fui atrás da
origem da palavra átomo. Vem do grego (a=não; tomo=divisão) e significa algo
que não pode ser dividido, pois acreditavam que os átomos eram indivisíveis e
eternos e que a matéria era composta por eles. Hoje, sabe-se que eles são divisíveis
e que podem ser rompidos ou destruídos por fissão nuclear (quebra do núcleo de
um átomo), processo usado nas bombas atómicas, mas é extraordinário que Leucipo
e Demócrito há 2400 anos tenham lançado a primeira pedra e adiantado a
existência de átomos! Estes gregos eram fantásticos!
Quanto a mim, estou como a minha Matilde,
o Universo é demasiado complexo para que possa ser cabalmente compreendido… A
sua existência continua envolta em mistério e a nossa também!
Tal como escreveu José Gomes ferreira,
nas “Aventuras de João Sem medo”, “É proibida a entrada a quem não andar
espantado de existir!”
Nina M.
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