Reacionarismo
Ao que parece, por estes dias, o Sr.
Engenheiro Carlos Moedas, candidato à Câmara Municipal de Lisboa, pelo PSD e
CDS, terá tido um comentário pouco elegante e muito machista sobre a Mónica
Bellucci, a bela atriz e modelo italiana, no programa do Ricardo Araújo
Pereira. A intenção terá sido provavelmente aligeirar a conversa e fazer uma
piadita que soou a piadola de mau gosto.
Segundo o senhor engenheiro, a dama
em questão já não será a embaixadora ideal para Lisboa, por já ter uma certa
idade… Ora, em primeiro lugar, eu vi uma fotografia da senhora para uma
campanha publicitária da Cartier e vejo tudo menos uma mulher acabada! Bellucci
transpira beleza, sensualidade, mas também elegância e bom gosto. Mais do que a
beleza plástica é a ideia de sofisticação que a Cartier está a vender. Qualquer
mulher ficaria encantada se fosse portadora da beleza, elegância e da
sofisticação desta senhora, do alto dos seus cinquenta e seis anos. Muito mais
interessante e atrativa que qualquer gaiata. Evidentemente, a campanha é o
engodo que se sabe. Não é por ostentar uma joia Cartier que a beleza e a classe
se apoderam da mulher. A elegância prende-se muito mais com a atitude do que
com os objetos caros que se pode ostentar. Nem todos a possuem.
Numa pesquisa rápida, percebe-se de
imediato que o senhor engenheiro foi muito infeliz. Associar Bellucci a Lisboa
seria fazer da cidade uma mulher madura, sim, mas belíssima, independente,
segura e sofisticada. Que melhor imagem se pode desejar? Porém, não é o
episódio infeliz que me preocupa sobremaneira e até penso que o candidato não
teria qualquer intenção de ofender ou de minimizar a bela italiana, mas o
desejo de atribuir à capital qualquer toque de modernidade e procurar uma musa
inspiradora da juventude?! Nada disso importa. Incomoda-me realmente é o
discurso enraizado que traduz a sociedade ainda marcadamente machista e esta,
sim, deveria já estar fora de moda. Com esse comentário, mesmo que não fosse a
intenção do candidato, está implícita a ideia de que a mulher só é atraente e
sensual até determinada idade. Depois, fica fora de prazo. Ora, senhor
engenheiro, ocorre-me fazer uma brincadeira um pouco ordinária e dizer-lhe que
deve ter um caixote do lixo invejável! Irrita-me esta exigência e pressão para
com a mulher, que faz com que tantas de nós se sintam feridas na sua autoestima
porque se acham gordas, barrigudas, velhas e sei lá o que mais!
Cavalheiros, vamos lá ver se nos
entendemos, as mulheres da minha faixa etária e até mais novas podem apreciar
um George Clooney, mas nem todos os cinquentões que por aí circulam têm esta
atratividade! O que pretendo dizer sem paninhos quentes é que muitos homens
exigem das mulheres qualidades que eles não têm! As marcas da idade não vos
tornam, forçosamente, mais charmosos e apetecíveis! Nalguns casos, sim, noutros
nem por isso! O Ricardo Carriço está muito mais apetecível, neste momento, do
que nos seus trinta, por exemplo. Porém, não é um caso muito vulgar… Vós,
homens, também sois contemplados com as entradas, a barriguinha proeminente, as
cãs (na melhor das hipóteses) ou calvície noutros casos! Também perdeis a
juventude, aquela que exigis que a mulher mantenha ao longo da vida… A biologia
é infalível e todos nós, sejamos homens ou mulheres, envelhecemos. É factual e
irrevogável. Vale mais aceitar isso e tentar envelhecer bem. Não adianta
procurar uma eterna juventude que não existe, que vai sendo prolongada com o
ácido hialurónico e o botox e que culmina, tantas vezes, numa desfiguração e
numa artificialidade indesejáveis.
As
gordurinhas e a flacidez, as rugas e a celulite são provas de vida e de
existência. Compreendo que as mulheres queiram gostar da imagem que o espelho
lhes devolve e que façam alguma coisa para o alcançar, que se cuidem. Todas
gostamos, não serei hipócrita e não corro os meus dez quilómetros à toa, mas
daí a viver em função de uma imagem e de um corpo é apenas absurdo! É um
insulto à inteligência com que se foi dotada. O que diz da mulher o elogio “és
muito bonita”? Absolutamente nada. Quem o é nada fez para o ser. É mero fruto
das circunstâncias e da natureza divina. Quanto muito poderá agradecer aos
genes dos progenitores. Por outro lado, por que razão agradar ao elemento
masculino é importante? Na natureza, é exatamente o inverso! O pavão macho é
quem tem a bela cauda e aquele azul estonteante para agradar à fêmea! Esta
pressão social para que a mulher seja sempre bela e jovem é insuportável e só
serve para engordar o bolso da indústria cosmética e das cirurgias plásticas
cada vez mais em voga. Francamente, incomoda-me que as mulheres se preocupem
mais com a sua aparência do que com a sua essência. Compete a cada uma de nós
descobrir o seu papel. Encher a nossa existência mais ou menos bonita com a
melhor essência que conseguirmos. Se me dizem “és uma mulher bonita”. Agradeço,
por educação, mas nada me acrescenta, porque não tive qualquer responsabilidade
nisso. Porém, se me dizem, “pensas bem ou sabes pensar” fazem-me brilhar os
olhos, porque aí talvez já tenha algum mérito. Um sobrescrito muito belo sem
uma missiva bem escrita lá dentro carece de substância e isso nem o cirurgião plástico
mais habilidoso poderá arranjar…
Certamente,
hoje, a Mónica Bellucci será inteiramente mulher. E que bela mulher, diga-se!
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