O ensino e os novos desafios
A escola está a passar por uma revolução e não falo
da pandemia que trouxe a horrível novidade do Ensino à Distância.
Evidentemente, foi a solução encontrada para minimizar os danos causados pelo
problema, mas julgo que a maioria dos professores preferirá a sala de aula e a
interação com os alunos. Se retirarmos o contacto direto no processo de ensino
e aprendizagem, estamos a desumanizá-lo. Os jovens precisam de ser estimulados
no que diz respeito ao relacionamento interpessoal, porque já usam os ecrãs
como uma extensão de si mesmos, preferindo a segurança de um diálogo por detrás
da tela ao risco de se verem olhos nos olhos com o interlocutor, reduzindo as
oportunidades para criarem empatia pelo seu semelhante.
Há documentos orientadores de uma nova prática, em
função do perfil que se pretende para o aluno do século XXI: a formação
holística de um cidadão, que revela competências em determinadas áreas do
saber, mas também competências sociais, emocionais, estéticas, comunicacionais,
entre outras, indo ao encontro do que vulgarmente os Projetos Educativos das
escolas apodam de formação integral do cidadão. Devo dizer que lido o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade
Obrigatória, é impossível não se concordar com o que o documento preconiza.
A dificuldade reside na sua operacionalização, mas como sempre, as escolas vão
avançando um pouco às escuras e experimentando novas formas de atuação e novas estratégias.
Não é fácil, mas faz-se o caminho percorrendo-o. Obviamente, não se está livre
de tropeços e enganos, mas servem as dificuldades para ensinarem as melhores
opções. Os professores vão fazendo formações, que são orientações relativamente
ao que se pretende, mas cabe à escola pensar e decidir a direção a trilhar para
alcançar o objetivo estipulado.
Não se operacionaliza uma mudança dessas, que
pretende colocar a tónica mais na aprendizagem do que no ensino, tornando o
aluno mais autónomo, proativo e mais responsável, sem o envolvimento do corpo
docente. Acontece que a mudança é necessária, mas para que ela seja possível, é
imperioso haver uma sala de professores motivada em busca do mesmo objetivo.
Neste momento, temos um corpo docente envelhecido e cansado em virtude dos
constantes ataques à classe por parte de sucessivos governos, especialmente,
desde o ano 2005. A campanha vergonhosa e que atentou contra a dignidade
profissional dos professores deixou marcas. Atualmente, temos um corpo docente
mais envelhecido e mais sobrecarregado. Temos governantes que maltratam constantemente
a classe e, depois, esperam dela todos os sacrifícios e abnegações.
Surpreendentemente, conseguem-no! Se por um lado é manifestação inequívoca do
empenho e da dedicação destes profissionais, por outro lado, não deixa de ser
estrategicamente errado. Quem nos governa sabe à partida, que mesmo ofendidos,
os professores não se negam a cumprir o seu papel, deitando por terra qualquer
força ou estratégia negocial.
A Flexibilidade Curricular está em marcha e as
escolas mobilizam-se para responder ao desafio, no entanto, gostaria que o
Ministério compreendesse que não pode apenas exigir, mas que tem o dever de
fornecer as condições para que as instituições de ensino o possam fazer. Não é
obrigando os docentes a uma prática de tarefas burocráticas desnecessárias, nem
com a formação de turmas enormes ou o aumento das horas de trabalho, que se
consegue a mudança. O professor não é um mero técnico, mas antes uma espécie de
artista que precisa de se construir ao longo da vida. Para isso precisa de tempo!
Falo de tempo para si e para o seu crescimento. Não pode ficar de tal modo
assoberbado pelo trabalho que se esqueça de si. Não deveria ser possível um
professor dizer que não lê, por exemplo, por falta de tempo! Eu trabalho com
palavras e ideias. Devo lê-las e pensá-las o mais que puder, primeiro porque
gosto e faz parte do meu equilíbrio e só poderei ser boa profissional se
estiver equilibrada, depois, porque serei tão melhor professora quanto mais
conhecimento e competências adquirir. Quem entrar numa sala de aula e se
limitar a trabalhar tecnicamente o texto que os alunos devem estudar, cumpre cabalmente
com a sua função, mas não com excelência! O extra reside na capacidade de
estabelecer analogias e inferências, alargar leituras e citar outros contextos,
exemplificando-os. Só o poderá fazer com o conhecimento que vai sendo construído
ao longo dos anos com as leituras cruzadas que faz. O professor que deixa de se
construir passa a ser um técnico, não um instigador de reflexões e da busca de sentidos.
Também é este perfil que se pede aos professores, mas é necessário que se compreenda
que não lhes podem cercear a liberdade criativa. Quanto menos tempo lhes é dado
para investirem no seu desenvolvimento, menos capazes serão de responder adequadamente
às novas exigências.
Nina M.
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