Seguidores

quarta-feira, 6 de novembro de 2024

O pêndulo


Oscila a vida
Como um pêndulo
Num perpétuo movimento
Num balancear seguro

Ambivalente
Entre a alegria e a tristeza
A paz e a angústia
O desejo e o tédio
O ser e o não ser

A vida é baloiço de jardim
Sob o sol e a chuva
É aquilo que existe
Entre Deus e mim

sábado, 2 de novembro de 2024

Crónica de Maus Costumes 393

 

Diferenças e convivência

               A convivência e coabitação não são fáceis. Há ajustes, tolerância e cedências necessárias perante visões de mundo diferentes e personalidades distintas. Há personalidades que não se ajustam, por mais que as pessoas gostem umas das outras, o que pode dificultar uma convivência sadia.

            Para que duas pessoas possam coabitar ou conviver sadiamente é necessário que, no mínimo, tenham valores e princípios alinhados e gostos semelhantes. Se for para ser amor, então, ainda são necessários mais um pozinhos mágicos de mais alguma, mas isto é o mínimo exigível. A famosa teoria de que os opostos se atraem até pode ser verdadeira, inicialmente, e ter muita piada, mas em algum momento redundará em fracasso. Com o tempo, os opostos afastam-se. Se não é fácil manter a proximidade com quem, de alguma forma, nos identificamos, fará com aqueles com quem estamos nos antípodas!

            Evidentemente, há diferenças superáveis e diferenças insanáveis. Os valores e princípios pelos quais orientamos a nossa caminhada e nos quais assentamos a nossa ética pertencem ao domínio do que não pode ser negociado. Se para alguém o valor da honestidade e da integridade for indispensável, por exemplo, não conseguirá permanecer ao lado de alguém que seja mais flexível e que use da consciência da manga larga em certas situações. Não compactuará com estratégias menos lícitas para alcançar os objetivos pretendidos. Se alguém pauta a sua vida por valores humanistas, não suportará a convivência com alguém muito moralista, mas pouco tolerante e discricionário. Nestes casos, talvez se esteja perante diferenças insanáveis. No entanto, também há as diferenças superáveis, que dizem respeito à personalidade, mas que se pode, com vontade, ultrapassar. Se uma pessoa gosta de dormir até tarde e a outra de se levantar cedo, basta que se respeitem para que nem um nem outro se incomodem mutuamente. Há quem diga que os relacionamentos terminam pelas pequenas coisas e não pelas maiores… Bem, eu entendo que podem terminar por uma infinidade de fatores e também pelas pequenas, porque a convivência é feita de irritações que se vão tolerando: as pequenas idiossincrasias de cada um que cansam ao cabo de uns anos e irritam sempre, mas que estão presentes, porque as pessoas são o que são, inconscientemente e, mesmo que façam um esforço, no sentido de minimizar o que irrita o outro, haverá sempre momentos em que o que se é se torna mais forte. Quando há um comportamento padrão que nos enerva, significa que é da natureza da pessoa e, provavelmente, tenderá a ser repetido, mesmo que seja alguém comprometido e esforçado.

            Perante isto, confrontando-nos com um comportamento ou maneira de ser que nos desagrada especialmente, só há duas atitudes racionais que se pode tomar e uma absolutamente irracional. Pode-se escolher o afastamento, apesar do amor ou da amizade por se entender que aquele tipo de postura só causa tristeza e mal-estar, um desconforto com o qual não se é capaz de lidar e uma angústia à qual se tem de pôr fim, a bem da sanidade mental. Isto é uma escolha racional. Por outro lado, a pessoa pode entender que o comportamento a incomoda verdadeiramente, mas que respeita o outro e ficará ao seu lado, esperando ver um esforço para minimizar o problema, não deixando de a apoiar e de estar ao seu lado. É também uma escolha racional e válida e que deve ser respeitada. A irracionalidade está, porém, na escolha de ficar, mas com o propósito de querer mudar o outro à força, por coação, manipulação, violência, seja o que for… Acontece que quem o faz torna-se numa pessoa tóxica, que exige do outro o preenchimento das suas necessidades e vazios. Ninguém é obrigado a suprir as necessidades do outro. Esse é um papel que cumpre a cada um em relação a si mesmo e não é justo que se queira mudar alguém, apenas para ver as suas necessidades atendidas. Todos temos o direito de não aceitar ou de não tolerar certos comportamentos, mas ninguém tem o direito de manipular nem de tentar colonizar o outro, tentar transformá-lo no que não é, na base da discussão e da força. O máximo que se pode fazer é tentar chegar a um entendimento confortável para ambos, se houver razoabilidade.

            Há pessoas matinais e pessoas notívagas. Há quem acorde a cantar de manhã e quem não suporte a cantoria nem nenhum barulho matinal. Há que respeitar essas personalidades que acompanham as pessoas ao longo da vida. Não adianta querer obrigar aquele que gosta de prolongar um pouco mais o sono a levantar-se cedo nem obrigar o que gosta de se levantar a permanecer na cama. Não se pode obrigar o outro a ser o que não é por mero capricho ou forma de encarar o mundo. Não adianta pedir ao ansioso para ter calma nem ao calmo para se apressar. Há que respeitar os tempos de cada um, desde que cada um cumpra com as suas obrigações nos prazos necessários.

            Enfim, sem estes reajustamentos e adaptações, a vida em sociedade torna-se infernal e é preciso que nos lembremos sempre de que o outro tem direito a ser quem é e o máximo que podemos fazer é escolher entre ficar, com uma dose extra de paciência para gerir as diferenças ou partir se as considerarmos insanáveis. Só não vale a pena querer mudar um comportamento padrão, porque, no final, ninguém muda ninguém e o desgaste é tremendo para ambos.

            Há, por isso, quem afirme que o amor é uma escolha diária e, a partir de uma certa altura, percebe-se claramente que também é isso.

 

Nina M.