Os filhos e a vida
Falava-me uma mãe da alegria que
sentiria em ver os filhos bem-sucedidos, na vida. Qualquer pai ou mãe se
preocupa com o futuro dos filhos e quer vê-los bem.
A
questão que importa colocar é a noção de bem-sucedido. Naturalmente, avaliamos
o sucesso pela nossa bitola e pelos nossos olhos e esquecemos que os filhos não
são objetos que nos pertencem, mas indivíduos autónomos, apesar de os
carregarmos no ventre e que não têm qualquer obrigação de satisfazer as nossas
expetativas que se traduzem, muitas vezes, na concretização de objetivos que
falhámos por culpa própria.
Nunca
idealizei qualquer profissão para os meus filhos. Serão o que quiserem ou
puderem ser. Se me perguntam, também vislumbro o futuro deles a passar pelo
estudo e lastimaria se assim não fosse, mas teria que o aceitar, porque o
sapato que me serve pode não servir aos outros. O que lhes desejo é a
capacidade de se autossustentarem, porque a mãe é mãe, mas não de gente que não
quer fazer nada. A forma como o vão fazer determinará se as suas vidas serão um
pouco mais fáceis ou difíceis. Por isso, se a ideia de sucesso e de felicidade
dos garotos for sair de mochila às costas para conhecer o mundo com meia dúzia
de trocos no bolso ao invés de um trabalho estável e razoavelmente bem
remunerado, saibam como amealhar os trocos para cumprirem o sonho. Quero que
saibam essencialmente o valor da autonomia e que aprendam a gerir a própria
vida em função das escolhas que fazem. Se é verdade que as circunstâncias nos
limitam, não é menos verdadeiro que as escolhas que fazemos são de nossa inteira
responsabilidade e temos que o assumir e pagar o preço necessário, sem
lamentações.
Sinto
compaixão pelos miúdos que se veem na obrigação de cumprir o sonho e as
expetativas dos pais, porque estão a ser sobrecarregados com um fardo que não
lhes pertence. Só será justo que cumpram o peso das suas decisões, não as dos
pais. De modo que de cada vez que os pais se intrometem na vida íntima do
filho, com o argumento de que sabem o que é melhor para ele, muitas vezes,
porque não aprovam o parceiro escolhido, outras porque não aceitam a orientação
sexual diferente da maioria, noutras situações, não aceitam a opção em relação
à profissão escolhida, dá-me vontade de lhes dizer que cresçam, que assumam os
seus fracassos e que os tentem remediar sem ser através da prole. São pais
ditadores que se tentam cumprir pelos filhos, porque não foram capazes de o
fazer apenas por si. São pais com vazios terríveis cuja vida gravita em torno da
paternidade, sem outro objetivo ou desafios.
Às minhas
crias, quero incutir-lhes apenas a capacidade de serem independentes, a vontade
de se tornarem gente com bons princípios, que assumem a vida como a querem
levar, sabendo que terão sempre de lidar com as consequências advindas da
escolha. Quero, portanto, que tenham a liberdade de escolher alicerçada na
responsabilidade. Quero que tomem a vida nas mãos conscientes de que nem tudo
são rosas, de que há muitos espinhos, mas que talvez a maioria deles sejam por
nós plantados. Quero essencialmente que tenham uma vida boa e lembro-me de
Fernando Savater em Ética para um jovem,
em que o pai deseja que o filho lhe diga que quer uma vida boa e ele, pai, o
esclarece sobre o conceito de vida humana boa e lhe explica que a condição de
humano implica a relação com os outros e que a casa mais sumptuosa, muito
dinheiro, as melhores roupas, entre outras coisas, não servem para nada nem
alegram na solidão, porque “se a solidão for completa e definitiva, todas as
coisas se volvem irremediavelmente amargas. A vida humana boa é vida boa entre
seres humanos ou, caso contrário, pode ser que seja ainda vida, mas não será
nem boa nem humana.” – diz Savater.
Por
isso, filhos meus, em vez de muitos e excessivos bens materiais, facilmente dispensáveis,
procurai quem vos cure a solidão e aquilo que vos alimenta a alma e tereis o essencial
que nenhum dinheiro pode comprar: uma alma sem vazio!
Nina
M.
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