Afetos
Ter filhos que não são nem adultos nem crianças pequenas, que já têm
alguma autonomia, é chegar a casa e não os ver. Saber que estão no quarto, às
sextas, depois das aulas, quando têm autorização para jogar computador, porque
durante a semana é proibido.
Nem vivalma. Outro dia qualquer, à
entrada, receberia um habitual “olá, mãe!” do rapaz, que aos seus quase catorze
anos já não usa o “mamã” e, com sorte, antes de deitar, espreita para o quarto
para dizer boa-noite e, se for a pedido, lá se aproxima para o beijo, enquanto
ainda permite que lhe diga que o amo. Só à noite, antes de deitar, são
permitidas estas brejeirices de afetos, porque a adolescência não é fácil e à
clara luz do dia, uma carícia suave é enxotada com um empurrar de ombro e um
fugir de cabeça que não sei bem o que denuncia. Talvez um “ó mãe, já não estou
em idade destas coisas”. E eu penso: “ hás de cá vir rondar como os gatos e
esfregar essa mesma cabeça que afastas agora no meu braço, à espera do carinho
do dono. Quase um ritual mágico que respeito sem dizer uma palavra. A noite
trá-lo mais dócil e, invariavelmente, poiso sobre a nuca o beijo terno de mãe.
A gaiata, mais extrovertida e
barulhenta, corre-me braços dentro a pedir um abraço apertadinho, porque “hoje,
mãe, ainda não me deste um abraço e eu gosto de abraços”. Eu também, filha. São
curativos. Depois, afirma veementemente que me adora e eu digo que eu amo mais,
porque assim é da lei da vida, os pais amarem mais os filhos do que o inverso.
Ela garante que não. A minha pequena adorável, tão responsável e crescida para
a idade!
O inverso do irmão,
que é bom menino, mas infantil e adolescente, que dá mais trabalho. Será mais
desapegado e livre, perdido no seu mundo, no interior de si, feito de uma
teimosia e de uma certa atração para o abismo. Reconheço-lhe os sinais. Não
padece de ansiedade, ao contrário da pequena.
Serão
ambos o mundo mais certo que terei. O meu passado, presente e futuro. Não
viverei como a galinha que não larga os pintos. Quero-os autónomos e
independentes. Eu arranjarei sempre os meus silêncios preciosos e necessários,
mas o meu abraço-casa estará presente para quando precisarem e terão o mimo com
a satisfação disfarçada de sempre.
A
cada trovoada forte poderão continuar a refugiar-se no leito materno, porque é
sabido que as mães têm o poder extraordinário de afastar os males. Por isso,
ontem, se mal os via, foi só haver descarga elétrica barulhenta para os ouvir perguntar:
“ó mãe, onde estás?!” Foi quanto bastou para que me adentrassem, afiançando que
não era medo. Com jeitinho era só para tomar conta da mãe, porque é sabido que a
trovoada a deixa à toa…
Nina
M.
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