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sábado, 28 de março de 2020

Crónica de Maus Costumes 174


O MEC e as suas diatribes

Gostaria muito de poder evitar este assunto, mas continua na ordem do dia e os disparates que vou ouvindo e lendo são tantos que a paciência esgota-se…
Sou frequentemente acusada, cá em casa, de não ter meio-termo. Ou tudo ou nada! Ou oito ou oitenta! Talvez nalguns assuntos assim seja, mas noutros vejo-me bastante ponderada e racional! É como a questão de ser faladora: depende dos dias, da companhia e da vontade, que não é sempre a mesma… Aliás, depois de muito observar, constato que afinal, nem sou tanto assim!...
Nestes dias, quem percorre as redes sociais assiste a dois tipos de neurose dos profissionais de educação, que é como quem diz professores: ou se desfazem em lamúrias devido à exaustão psicológica e emocional pela situação em que se encontram e quase nos parecem uns desvalidos sem sorte na vida ou colocam-se nos antípodas disto e vangloriam-se pela sua modernidade e facilidade de adaptação aos novos tempos e oportunidade para colocar em prática a tão desejada flexibilidade, apesar de ninguém saber muito bem como fazê-lo, principalmente nesta situação! Depois, vem a tutela, com a suas habituais mãos: a esquerda cheia de nada e a direita vazia!
Quanto ao primeiro caso, caros colegas, compreendo o vosso cansaço. Também gostaria de pisar a minha sala de aula (talvez haja uma que eu dispensasse, pensando bem…) mas de todas as outras tenho saudade! Gostaria imenso de poder abraçar e dar um beijinho e um abraço apertado a muitos dos meus colegas (escuso de vos referenciar… Sabeis muito bem quem sois!), também passo boa parte dos dias a escrever e-mails, enviar e-mails, preparar tarefas, corrigir tarefas, corrigir testes (tive tempo de dar os que estavam previstos), conferenciar com os alunos, com os colegas, enfim… fazer o trabalho o melhor que posso nesta fase difícil e completamente inesperada, tal como todos vós! Acresce que também sou mãe e também tenho de controlar os e-mails, que chegam até à exaustão, com fichas e tarefas!
_ Ó mãe, mãe, mãe, mãe! Como faço para enviar isto? E agora esta ficha… O que é para fazer nesta pergunta?!
_ Calma! Irra! Que me gastam o nome e eu sou só uma e também estou a trabalhar!
Continuo a ser inteiramente professora em casa e não consigo despir a farda! Cansa. Como cansa!… No entanto, não sou mulher de muitas lamúrias. Como ter a desfaçatez de me lamentar perante os milhares que têm que enfrentar o maldito vírus de frente, sempre preocupados com os que deixam em casa, com receio de lhes poder trazer a doença para dentro de portas?! Ah! Quase esquecia… Há alguém nessas condições em minha casa! Como lamentar-me sabendo das doze ou catorze horas que os profissionais de saúde fazem, muitos deles sem irem a casa para estarem com os seus?! Pensando nisto, a gritaria dos meus quase me parece melodia afinada!
Depois, penso no segundo grupo, que também me consegue encolerizar, os profissionais que adoram expor evidências, ufanos da sua competência, profissionalismo e modernidade!
- Ah! Os meus alunos estão a adorar esta modalidade!
Aqueles para quem o ensino à distância é a oitava maravilha e tecem rasgados elogios à potencialidade dos recursos tecnológicos como estratégia a utilizar no ensino! Para esses só me apetece gritar:
- Eu quero a minha sala de aula! Quero o relacionamento interpessoal e poder olhar os alunos nos olhos! Por boa que seja a ferramenta, nada substitui o calor humano! Pobres de espírito os que ainda não aprenderam nada com a covid-19! Vai para a sala e usa a tecnologia e então assim é que te vais sentir o máximo! Ufa!...
Finalmente, a tutela! Tanto tempo para esboçar um documento com diretrizes de ensino à distância?! Francamente, meus senhores, quase tudo o que escreveram, as escolas já estão a implementar sem a vossa colaboração! Na aflição, as escolas, na figura dos seus diretores e com a colaboração dos seus profissionais docentes e não docentes trataram de minimizar o impacto desta crise! A tutela assistiu de cadeira, soube enviar o recadinho de que ninguém estava de férias, observou e aplaudiu o empenho, que normalmente caracteriza a classe nestas ocasiões. Às vezes até há quem seja mais papista do que o Papa! Na verdade, o que nós precisamos de saber ainda não sabemos: como vai funcionar exatamente o terceiro período? Haverá seleção de matérias para os anos sujeitos a exames? Haverá prolongamento de datas para realização dos exames? O terceiro período será alargado? Garantem todas as condições de equidade para que os alunos possam acompanhar o ensino à distância?! Ah! Nem todos os meninos têm computador! Alguns nem Internet têm! O que diz a tutela? Resolva a escola, estabeleça parcerias com as autarquias, como quem diz, nós fazemos como Pilatos e lavamos as mãos (bem que é preciso esse cuidado de higiene nos dias que correm)! A maioria dos meninos tem telemóvel… Já se desenrasca e todos sabemos como o português é extremamente célere no desenrascanço e na boa vontade! Contudo, já agora… À tutela já lhe ocorreu estabelecer parcerias com os prestadores de serviço da Internet para que os alunos possam ter pacotes de acesso ilimitado, por exemplo?! Não?! Quem o deverá fazer? São também as escolas?! Talvez isso não interesse para nada e o fundamental seja criar mais uma equipa de monotorização e avaliação de boas práticas, que no final do ano letivo elabore mais um relatório, mais um papel, para que o MEC fique com a evidência de como correu tudo bem, apesar de alguns constrangimentos… Afinal, a tutela coordena extraordinariamente bem sem grande esforço, lá diz o ditado: “Vale mais um bom mandador do que um bom trabalhador!” Comprovadíssimo, meus caros senhores!
Finalmente, passada esta histeria coletiva ensandecida, que tenhamos a sorte de olhar à nossa volta, para os nossos lares, e podermos concluir que a tragédia da morte não nos atingiu! E assim, talvez todos os relatórios e preocupações desmesuradas com o que é importante, mas apenas secundário, possam fazer algum sentido! Há quem possa ter três ou quatro meses da vida suspensa e há os que podem perder a vida definitivamente…
Pela vossa saúde e dos outros, permaneçam em casa!
Nina M.



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