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sábado, 14 de março de 2020

Crónica de Maus Costumes 172


Coronavírus e responsabilidade social

            - Mãe, achas-me bonita? – Pergunta-me a Matilde.
            - Não acho. Tenho a certeza absoluta de que és bonita. – Respondo.
            Depois de um abraço apertado (não os consigo evitar em casa, confesso. São tão habituais e frequentes que nos esquecemos…), diz-me:
            - Tu também és.
            Para que haja a perpetuação deste tipo de diálogos nas famílias, principalmente, entre netos e avós, é necessário haver prevenção nos dias que correm. Custa-me compreender que, apesar do exemplo italiano e espanhol, Portugal continue mais a reagir do que a prevenir. Quem me conhece sabe que nem sou alarmista, prefiro o otimismo, mas há momentos em que a situação nos obriga ao realismo e a verdade é que nas próximas semanas o número de infetados aumentará exponencialmente! Também não estou em pânico, mas estou preocupada. Tenho filhos em casa (biológicos e uma adotada até ao final do ano, que também será sempre minha) e um marido que terá que estar na linha da frente, quando a isso for chamado. Tenho pais com a idade bonita de 82 e 75 anos! A única tia materna que me sobeja tem 78! Nada é linear. Sabemos disso. Há duas semanas perdemos um primo de 64 anos, de ataque cardíaco fulminante, sem que nada o fizesse prever. Era alguém saudável, praticante de exercício físico e que abandonou o famigerado vício do tabaco ao ver o pai morrer aos 55 anos, vítima de um carcinoma pulmonar. Vi-o a agonizar várias vezes por não conseguir respirar sem a ajuda de oxigénio… O meu tio Zé! Como gostávamos dele! Aparecia sempre por volta das dez, em casa da minha mãe, aos domingos. Era connosco que tomava invariavelmente a sua tigela de cevada com sopas de pão, depois de já ter tomado o cimbalino e ter bebido o seu mata-bicho. Também invariavelmente, a sua irmã, minha mãe, lhe moía o juízo por conta do bagaço matinal sem forro no estômago. Nessa altura, eu tinha dez anos. Anteriormente, em maio, tinha falecido a minha avó, de doença natural (cinco anos após o meu avô, que depois de uma poda, caiu redondo no chão, sem apelo nem agravo, no dia 30 de dezembro de 1980). Deve ter passado os genes ao neto, que agora faleceu do mesmo modo. Em novembro de 2016, faleceu a minha TIA. A que não tinha nome por ser demasiado grande para nele caber! Estou farta que me morra gente e nem fui ao lado do meu pai! Também sei que é inevitável não passarmos por estas situações, mas não temos que as antecipar, pois não?!
Ora, mediante o cenário que o país atravessa, custa muito as pessoas adotarem comportamentos cívicos e protegerem-se a si, os seus familiares e os outros? Não seria essa também a função de quem nos governa? Até quando vamos reagir em vez de prevenir? Há muito deveria haver controlo nos aeroportos e fronteiras. É agradável? Não, mas morrer ou contaminar outros também não me parece boa ideia. A partir do momento em que se tem a consciência clara da transmissibilidade rápida do vírus, deveriam tomar-se as medidas necessárias para circunscrever ao máximo a sua proliferação! Temos o exemplo de Macau, mas preferimos o italiano ou espanhol, que significa correr atrás do prejuízo. Dependendo do número de infetados em simultâneo, poderá não haver capacidade nos nossos hospitais para atender toda a gente! As entidades internacionais alertam e aconselham a irmos além do que nos dizem para fazer! O que esperamos? Uma hecatombe?
A crise económica será uma realidade. É uma questão de se escolher se a queremos tentar minimizar, encurtando o tempo de duração da epidemia e obrigar as pessoas a ficarem em casa ou deixar que a economia definhe e pereça lentamente. O resultado final será o mesmo, mas às pinguinhas. Há pessoas com negócios que preferiam assumir os prejuízos agora e fecharem por duas ou três semanas, numa ação concertada, do que viver neste impasse de manterem portas abertas com poucos clientes e todas as contas para pagar!...
Quanto aos inconscientes que se pavoneiam por cafés, restaurantes, bares e discotecas, só me apetece esbofeteá-los, porque a estupidez humana exaspera!
Já agora, há agrupamentos de escolas que também não devem ter compreendido a gravidade e a dimensão do problema, pois insistem em colocar os professores nas escolas a cumprir horário sem alunos, com tarefas que podem ser feitas a partir de casa. Tal comportamento é de uma insensatez inqualificável, para além de um insulto, porque é presumir que, a partir de casa, os professores não cumprem com o que lhes é solicitado! Desenganem-se, porque se no seio da classe há incompetentes, como em todo o lado, na larga maioria, temos profissionais dedicados e responsáveis. E depois, o que importa mais: a saúde de todos ou se os meninos têm tarefas escolares para cumprir? Que esquizofrenia é esta? Querem explicar isso aos pais da menina de dezassete anos internada no S. João, em estado muito debilitado? Andamos de boca cheia com os resultados da Finlândia, em que os alunos só têm 4 horas de aula por dia e agora há que não dar folga aos miúdos nem professores, porque ninguém está de férias?! Pois, muito bem. Passo a explicar: continuo a trabalhar à distância com os meus alunos com conta, peso e medida. De forma sensata e sem histerismos, até porque há outros colegas que lhes pedem o cumprimento de outras tarefas. Não adiantarei a matéria, antes farei consolidação e antecipação, porque há coisas que são feitas na sala de aula, com a certeza de que todos têm igualdade de oportunidades e de que todos assistem à aula. Se houver reposição de aulas, muito bem, se não houver, mas eu considerar necessário marcá-las a bem dos meus alunos, também o farei sem hesitar, sem precisar de qualquer normativo ou recado do senhor Ministro da Educação, que finalmente saiu de quarentena, mas apresentou um discurso tão mal formulado, tão ambíguo, com prejuízo de coesão e de coerência, que deu aso a interpretações insensatas de quem é mais papista do que o papa! Ainda bem que não sou eu a avaliá-lo na competência da oralidade!
Resta-me, por fim, reconhecer o bom trabalho a quem o faz. A Sra. Diretora da minha escola (que muitos de vós identificais perfeitamente) tem o corpo docente a trabalhar com os seus alunos à distância, sem trejeitos pidescos, que desagregam mais do que congregam. Bem-haja o seu bom senso e a sua sensibilidade tão necessária a quem lidera! Às vezes, não é o que se solicita, mas antes como se solicita! Alguns não sabem solicitar nem exigir!
Foquemo-nos todos no que verdadeiramente interessa: combater a epidemia!
Pelo bem de todos, fiquemos em casa!
Nina M.

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