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sábado, 23 de fevereiro de 2019

Crónica de Maus Costumes 120


               Haja Esperança!

            Enquanto houver vida há esperança ou será exatamente o inverso, haverá vida, porque há esperança ?
            Parece-me que o sentimento de esperança é fundamental ao ser humano. Tão fundamental quanto o amor. Serão os dois pilares que conseguem manter o Homem equilibrado e que lhe permitirão, quem sabe, aceder ao caminho da felicidade.
            A frase com que Dante Alighieri se depara, antes de entrar no inferno é bastante sugestiva: “Ó, vós que entrais, abandonai toda a esperança.”
É um vaticínio claro de perda da vida para todo o sempre. Aqui a esperança representa a vida eterna que é negada, após passar aquela fronteira. Na realidade, os condenados ao inferno morreriam pela segunda vez. Tiveram a morte física da vida terrena e chegados ali, morrem uma segunda vez. Neste contexto, esperança poderá ser sinónimo de vida.
Não raramente, penso no fenómeno do Holocausto e dos seus sobreviventes e há sempre uma pergunta que me ronda o espírito e que poderá ter possíveis respostas: O que terá permitido que alguns conseguissem sobreviver ao horror, desumanização e desprovimento do ser, para além de uma condição e robustez física invejável? Sobreviver ao frio extremo, fome, falta de higiene, doenças contagiosas e torturas infligidas, só com uma saúde de ferro e muita sorte à mistura! Isto, sob o ponto de vista físico, porém, o Homem é também espírito e para manter a vida em determinadas circunstâncias é preciso almejá-la! O que levaria alguém a querer conservar a vida naquelas condições? O instinto de sobrevivência parece-me manifestamente pouco! Em certas situações, a desistência poderá ser pragmatismo.
Encontro apenas duas respostas que se poderão fundir numa só e que a meus olhos é a única via: o amor e a esperança! O amor a alguém, pela família, pelos filhos, por uma causa maior e a esperança de que o degredo vivido terá um fim, por se acreditar que a humanidade impediria tamanho horror! A esperança, o acreditar que esse dia há de chegar, permite conservar a dignidade, identidade do ser e a vontade de viver. A esperança de que um dia a luz triunfe sobre as trevas e o bem vença o mal.
A esperança, acredito, terá sido o móbil para a sobrevivência. Não a esperança vã, fútil ou caprichosa que se desvanece após se ver cumprida, porquanto se deseja o que não se alcança, mas aquela que depois de encontrada não se desvanece mais e sabe ganhar novos contornos que permitem responder aos novos desafios colocados. Depois da sobrevivência garantida, a esperança teve que se renovar para enfrentar demónios infindáveis: descobrir, muitas vezes, ser o único sobrevivente da família, ultrapassar os traumas que uma vivência dessas impõe, refazer a vida, começando do nada, reencontrar-se com uma identidade perdida e descobrir o seu novo ser. Ninguém passa por uma experiência dessas e permanece o mesmo!
Viktor Frankl, após ter adoecido no campo de concentração, consegue manter-se vivo, por força das notas para o seu livro. Buscava o sentido para a existência que acreditava poder ser encontrado, mesmo nas situações mais abjetas. A esperança de ser possível encontrar o sentido para vida e não se deixar abater pelo vazio existencial e pessimismo, salvou-o, trazendo uma nova perspetiva à psicanálise.
Quem se ausenta da esperança perde, portanto, a vida ainda que viva.
Nina M.


           






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