Juventude,
Irreverência e Uma Dose de Loucura
Em conversa cá de
casa, recordava os tempos de juventude, já início de vida adulta e laboral, a
propósito de exporem as minhas idiossincrasias. Costumo dizer que já fui bem
pior, ainda que os traços distintivos permaneçam e amadureçam, vincando-se de
outro modo, fruto do tempo.
A irreverência da
juventude associada à santa ingenuidade de acreditar piamente que sempre tudo
corre bem é agora, à distância de duas décadas, verdadeiramente assustador. O
que mudou? Sou mãe e a consciência e noção dos perigos agudizam-se
sobremaneira.
Não adianta,
porque os filhos farão o seu trajeto como nós fizemos o nosso, sem pedir
permissão e omitindo-nos pormenores que só nos agastariam e tirariam o sono e,
como tal, é bem melhor permanecer na ignorância. A consciência é terrível!
A minha parceira
de fado já pagou a sua parte, uma vez que um dos filhos já é um jovem adulto e
sabe bem como é difícil.
Apesar da leveza
que a tenra idade aportava, a responsabilidade nunca deixou de estar presente. As metas a atingir e que tinham de
ser cumpridas para não sobrecarregar os progenitores eram presença constante,
porém, sobrava tempo para tudo! Na juventude, o tempo sobeja e parece sempre
largo. A velhice é algo muito distante e a morte só acontece aos outros… Há uma
sofreguidão de vida e de experiência que, com critério de seleção, como convém,
tudo quer abarcar. Em mim, a sede de vida persiste, mas o tempo, essa unidade
de medida tão castradora já não é assim tão longínqua. Subitamente,
apercebemo-nos de que talvez metade do trajeto esteja feito e que tudo passou
tão rapidamente! Olha-se para o que ainda se quer fazer e fica-se com a ideia
de que o tempo pode não ser suficiente. Gastamos as nossas energias em tarefas de
que muitas vezes não gostamos, que nos sugam as emoções e que depois não deixam
disposição emocional para se cumprir com o que verdadeiramente nos apraz fazer.
O tempo que é já tão pouco e tão continuamente desperdiçado!…
Empurra-se
tudo com a barriga e o que é de facto premente fica sempre para depois.
Às vezes, sou
acusada de má gestão do tempo, de priorizar coisas que deveriam ficar para mais
tarde. São ainda resquícios de uma juventude que não morreu por completo e uma
forma, talvez infrutífera, de mostrar à vida que ainda tenho uma palavra a
dizer e que se me apetecer alterar a ordem das coisas, mesmo que transtorne a
realidade sempre alinhadinha e arranjadinha, sou bem capaz de o fazer. Neste
momento, seria bem mais avisado estar a corrigir mais uns trabalhos, mas como
detentora de livre-arbítrio (bem menos do que o que gostaria) decidi que seria
bem mais importante a escrita destas linhas que, em abono da verdade, não terão
importância nenhuma. De qualquer forma, apeteceu-me e eu ainda mando alguma
coisa!
Desconfio que é a
mesma dose de loucura que me meteu, juntamente com a amiga, num carro alugado
por outro turista continental, que desconhecíamos, para descobrir S. Jorge. O
pobre, quando se deu conta, foi despojado do volante e ia sentado no banco de
trás, porque a regra era sempre que uma conduzisse, a parceira de alegrias ia
no lugar do morto. Sem lugar para discussões. Ficamos todos a ganhar: ele com a
companhia de miúdas divertidas e nós que passeamos pela ilha sem desembolsar um
tostão. No final, jantar e um bom resto de férias! Evidentemente que o indivíduo
não era nenhum Mike Tyson (felizmente!) e parecia gente de bem, mas… O que dizer?
Ingenuidade de quem ainda desconhece o cinismo da vida… Porém, sem riscos, a existência
também é bem menos atrativa…
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