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sábado, 5 de janeiro de 2019

Crónica de Maus Costumes 113



Procrastinação Emocional    
  
Primeira crónica de 2019! Falhou a última de 2018, pelo que peço desculpa aos leitores habituais, mas a alma às vezes entra em procrastinação emocional e também tem direito aos seus retiros! Na verdade, foi mais por falta de oportunidade, vivenciou-se muito e escreveu-se menos.
Tem sido uma época especial, como é sempre a época natalícia. Este ano, serviu para brindar a amizade longa e forte, que se propaga pelos anos fora e que, apesar da distância não se extingue. É engraçado verificar e olhar para trás e recordar o passado com algum saudosismo, porque é trazido com felicidade. Não somos as mesmas, já. Nem eu nem ela, mas o essencial permanece. Um laço criado há mais de vinte anos sem o menor soluço ou tropeço que a pusesse em causa. Já uma altura referi que a amizade é uma forma sublime de amor, porque se for verdadeira é livre de interesse e zela-se sempre pelo bem-estar de quem se quer bem. Ficou encontro marcado para o verão. Desta vez longo, para matar saudades que são sempre imortais, bem diferente da frágil condição humana. A consciência de que não nos teremos eternamente deveria fazer com que arrepiássemos caminho na pressa quotidiana, porém, é sempre mais fácil falar do que haver um comprometimento sério para encontrar as soluções necessárias que travem o ritmo louco e alucinado em que vivemos e que não nos deixa tempo para o que é essencial, a começar pelo encontro com a nossa interioridade, quanto mais com amizades que não desaparecem.
            Segundo Pascal, o Homem precisa do divertimento para escamotear as suas misérias. Se o Homem for confrontado consigo mesmo de forma séria e imparcial é capaz de descobrir algumas coisas sobre si de que não gostará, como a infelicidade. O divertimento, o tumulto e o ruído são, por isso, uma forma de alienação. Compreenda-se a palavra na aceção filosófica do termo: afastamento de si mesmo. Não gostando do que vê, o homem aliena-se de si, refugiando-se na diversão. Confesso que uso pontualmente esta estratégia, quando a procrastinação e o cansaço emocionais se tornam mais difíceis de suportar. Devo, porém, deixar a ressalva de que pouco adianta, apenas concebe uma folga e alarga a malha que nos estrangula momentaneamente, porque mais tarde ou mais cedo o confronto com o “eu” terá de ser feito, a menos que se consiga fazer a proeza de transformar a vida numa festa constante. Não é o caso. Preciso do recolhimento, da solidão escolhida e do silêncio onde me reconheço e onde me encontro. É aí que sempre vejo a minha interioridade com mais rigor e nitidez, nem sempre com facilidade e muito menos com entusiasmo. Gosto de fazer este exercício e de ter esta exigência constante.
Li algures que não devemos ter a vaidade de nos considerarmos bons, mas antes tendencialmente bons. Concordo. Sempre que damos algo por adquirido está-se a um passo da derrota. Temos de ser polícias de nós mesmos para que o bem surja cristalino e fresco. Ninguém admite o ciúme, a pontinha de inveja, a mesquinhez, mas ninguém está imune a emoções menos nobres que devem ser monitorizadas para as podermos banir. Desta forma, quem se considerar uma pessoa de bem está a um passo de relaxar e fazer menos do que o que deve, uma vez que se considera que o objetivo já foi alcançado.
Esta semana ouvi um elogio muito bonito que guardei cuidadosamente, porque alguém me elegeria como irmã se pudesse escolher uma. Não se fica indiferente a estas palavras e uma pontinha de vaidade surge, mas que deve ser eliminada de imediato, para cumprir com a ideia de que todos seremos apenas tendencialmente pessoas de bem, mas que é preciso fazer mais e melhor, para que a bondade possa ser uma realidade efetiva e não apenas uma potencialidade.
É deste comprometimento de que a amizade e o amor necessitam para que possam subsistir. Brindemos a ambos para que se imponham no ano que agora desponta.
Nina M.



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