Procrastinação Emocional
Primeira
crónica de 2019! Falhou a última de 2018, pelo que peço desculpa aos leitores
habituais, mas a alma às vezes entra em procrastinação emocional e também tem
direito aos seus retiros! Na verdade, foi mais por falta de oportunidade,
vivenciou-se muito e escreveu-se menos.
Tem
sido uma época especial, como é sempre a época natalícia. Este ano, serviu para
brindar a amizade longa e forte, que se propaga pelos anos fora e que, apesar da
distância não se extingue. É engraçado verificar e olhar para trás e recordar o
passado com algum saudosismo, porque é trazido com felicidade. Não somos as
mesmas, já. Nem eu nem ela, mas o essencial permanece. Um laço criado há mais
de vinte anos sem o menor soluço ou tropeço que a pusesse em causa. Já uma
altura referi que a amizade é uma forma sublime de amor, porque se for
verdadeira é livre de interesse e zela-se sempre pelo bem-estar de quem se quer
bem. Ficou encontro marcado para o verão. Desta vez longo, para matar saudades
que são sempre imortais, bem diferente da frágil condição humana. A consciência
de que não nos teremos eternamente deveria fazer com que arrepiássemos caminho
na pressa quotidiana, porém, é sempre mais fácil falar do que haver um
comprometimento sério para encontrar as soluções necessárias que travem o ritmo
louco e alucinado em que vivemos e que não nos deixa tempo para o que é
essencial, a começar pelo encontro com a nossa interioridade, quanto mais com
amizades que não desaparecem.
Segundo Pascal, o Homem precisa do
divertimento para escamotear as suas misérias. Se o Homem for confrontado
consigo mesmo de forma séria e imparcial é capaz de descobrir algumas coisas
sobre si de que não gostará, como a infelicidade. O divertimento, o tumulto e o
ruído são, por isso, uma forma de alienação. Compreenda-se a palavra na aceção
filosófica do termo: afastamento de si mesmo. Não gostando do que vê, o homem
aliena-se de si, refugiando-se na diversão. Confesso que uso pontualmente esta
estratégia, quando a procrastinação e o cansaço emocionais se tornam mais
difíceis de suportar. Devo, porém, deixar a ressalva de que pouco adianta,
apenas concebe uma folga e alarga a malha que nos estrangula momentaneamente,
porque mais tarde ou mais cedo o confronto com o “eu” terá de ser feito, a
menos que se consiga fazer a proeza de transformar a vida numa festa constante.
Não é o caso. Preciso do recolhimento, da solidão escolhida e do silêncio onde
me reconheço e onde me encontro. É aí que sempre vejo a minha interioridade com
mais rigor e nitidez, nem sempre com facilidade e muito menos com entusiasmo. Gosto
de fazer este exercício e de ter esta exigência constante.
Li
algures que não devemos ter a vaidade de nos considerarmos bons, mas antes
tendencialmente bons. Concordo. Sempre que damos algo por adquirido está-se a
um passo da derrota. Temos de ser polícias de nós mesmos para que o bem surja
cristalino e fresco. Ninguém admite o ciúme, a pontinha de inveja, a
mesquinhez, mas ninguém está imune a emoções menos nobres que devem ser
monitorizadas para as podermos banir. Desta forma, quem se considerar uma
pessoa de bem está a um passo de relaxar e fazer menos do que o que deve, uma
vez que se considera que o objetivo já foi alcançado.
Esta
semana ouvi um elogio muito bonito que guardei cuidadosamente, porque alguém me
elegeria como irmã se pudesse escolher uma. Não se fica indiferente a estas
palavras e uma pontinha de vaidade surge, mas que deve ser eliminada de
imediato, para cumprir com a ideia de que todos seremos apenas tendencialmente
pessoas de bem, mas que é preciso fazer mais e melhor, para que a bondade possa
ser uma realidade efetiva e não apenas uma potencialidade.
É
deste comprometimento de que a amizade e o amor necessitam para que possam
subsistir. Brindemos a ambos para que se imponham no ano que agora desponta.
Nina
M.
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