Ser ou não ser feliz
eis a questão!
-
O meu pai diz que tenho de ser médico ou engenheiro e o teu?
- O meu diz
que tenho de ser feliz.
Fui surpreendida por este breve
diálogo, acompanhado de uma imagem bastante sugestiva e contemplada,
naturalmente, com imensos “likes” na rede social mais usada pelos mais
velhotes, a confiar nos meus filhos…
Estagnei perante a mensagem. Naturalmente,
todos os progenitores que se prezem querem que os seus filhos sejam felizes. Eu
também, obviamente. Depois de refletir um pouco, chego à conclusão de que nem
uma nem outra premissa serão corretas, mesmo tendo em conta que tais desabafos
serão tidos a pensar no que será melhor para os filhos.
O
primeiro, mais facilmente se percebe o desacordo. Ao desejar que um filho seja
isto ou aquilo mais não se está a fazer do que a projetar as nossas ambições goradas
nos descendentes. Os filhos são pedaços da nossa alma, mas não são a nossa
extensão, portanto, eu quero que os meus sejam aquilo que quiserem ser e que se
sintam realizados profissionalmente, apenas. Preferencialmente, que lhes
permita também algum desafogo económico, no sentido de poderem ter uma vida
digna com o mínimo de conforto. Quanto ao ser feliz, a história é outra.
Obviamente que os quero felizes, porém, será de uma inconsciência atroz pensar
que os filhos que nós tanto amamos e protegemos com todas as nossas forças
serão sempre felizes. Isso não existe, basta olhar para as nossas vidas.
Poder-se-á ter uma vida maioritariamente tranquila, sem grandes sobressaltos,
mas a dor e a perda fazem parte dela. Inevitavelmente. Certamente, os meus
filhos, como todos os humanos, terão momentos, segundos, de verdadeira e pura
felicidade que poderão cristalizar para que os acompanhem ao longo da vida. Por
isso uma mãe se lembra tão bem da primeira vez que olhou os rebentos e os
segurou nos braços, ainda na refrega do parto. Esquece a dor, se a houve, e dá
primazia à emoção do momento mais feliz de toda a sua existência, porque nada
lhe é comparável. Absolutamente nada. No entanto, esses instantes de êxtase só podem
ser eternos meramente na memória. A vida também é feita de perdas e de derrotas
que temos de saber suportar e superar. Ninguém é feliz o tempo todo e
dizer-lhes: quero que sejas feliz é incutir-lhes a ideia errada de que esse
estado emocional de extremo bem-estar é possível a todo o momento. Prefiro
dizer que quero que os meus filhos sejam resilientes. A probabilidade de serem
felizes mais tempo será maior. Esta qualidade implica saber lidar com o
fracasso, levantar-se do chão as vezes necessárias, ter dois dias de depressão
e de autocomiseração, mas reerguer-se ao terceiro, não se dando por vencidos. Implica
pensamento, racionalização e inteligência emocional. É não virar a cara à luta,
mas saber também quando é hora de desistir, de largar, porque há circunstâncias
em que uma perda pode ser ganho!
Depois,
obrigatoriamente, deveríamos questionar o conceito de felicidade. Aconselho
vivamente Zygmunt Bauman, que a propósito da felicidade, diz que “para cada ser
humano há um mundo perfeito feito para ele ou para ela”. Significa que a
felicidade deve ser construída por cada sujeito e que a receita é individual e
só pode ser encontrada por cada um de nós. A mesma receita não serve para
todos. Poderei também lembrar Mário Sérgio Cortella que indica a máxima
filosófica para definir felicidade: realidade menos expetativa ou como “instantes
em que se sente que a vida nos está a levar ao máximo”. “A felicidade não é euforia,
não é consumo, é simples e se não for simples não é felicidade, é inchaço.”
Também
quero que os meus filhos sejam felizes, mas antes devem compreender que esse
caminho é construído por eles, na sua individualidade. Devem saber que uma vida
feliz não elimina a dor e que, portanto, é preciso que tenham a resiliência
para a superarem e persistirem na busca.
Finalmente,
é importante que compreendam o que é essencial. O essencial é distinto do
fundamental. O essencial será o amor, a amizade, a lealdade, a sexualidade,
entre outras coisas e nunca o dinheiro, porquanto este possa comprar a ternura,
mas não o amor; poderá comprar a reciprocidade, mas não a amizade, poderá
comprar o sexo, mas não a sexualidade. Então, o dinheiro poderá ser fundamental,
mas não essencial e a felicidade advém do essencial, pelo que não pode ser
comprada, ofertada como algo que está sempre à mão de semear, tem de ser
construída por cada um, com as ferramentas que este conseguir reunir ao longo
do seu trajeto existencial.
Nina
M.
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