Loucura
Das duas, uma: ou
o mundo está do avesso ou a louca sou eu, mesmo sendo bastante lúcida!
Vive-se uma era
onde se afirma a importância do ser humano, onde se julgou necessário criar uma
carta que consagrasse os Direitos Humanos, documento inalienável e garantia do
exercício do humanismo e da civilidade. Documento que estabelece o que é ou não
aceitável no trato do ser humano, após as atrocidades dadas a conhecer e perpetradas
pelos nazis durante a Segunda Grande Guerra. Aplaude-se a ideia, considera-se
mesmo necessária a fim de evitar horrores semelhantes no futuro. Parece
racional e absolutamente lógico. O que torna tudo o que se segue ainda mais
inaceitável e de difícil digestão.
Vejamos, depois
das câmaras de gás, dos trabalhos forçados, fome, insalubridade e torturas
impostas aos judeus e outras minorias étnicas impostas pelos nazis, o que já não
aconteceu de semelhante, sob os olhares serenos dos grandes líderes mundiais,
para quem as razões económicas se sobrepõem ao valor da vida humana?
Se quiser começar pelo drama mais recente, que já
conta com uns anos sangrentos, poderemos referir a Síria, mas há outros
passados arrepiantes: logo no pós-guerra, Estaline expulsou os alemães dos
territórios anteriormente dominados por Hitler. Resultado: famílias alemãs
dizimadas. Na Polónia, mais de um milhão de alemães morreu. Caso para dizer:
quem com ferros mata, com ferros morre. Forçou a Ucrânia e o Cazaquistão a
exportar todos os seus alimentos, matando os nativos de fome. Populações
inteiras de outros países foram desalojadas e exiladas na Sibéria; cerca de 20
a 25 milhões de mortos. Podemos lembrar o Camboja e a época do ditador Pol Pot,
entre 1975 e 1979; Podemos recordar o massacre de Ruanda, Da Bósnia e outros
que se queiram encontrar, à disposição de um clique! Podemos, atualmente,
relembrar as crianças com menos de dez anos aglomeradas em campos de refugiados
deploráveis que tentam o suicídio! Mas o que é isto?!
Vive-se, portanto, numa sociedade hipócrita, onde
importa mais o parecer do que o ser, onde se faz de conta que se agiliza para
que estes horrores não voltem a acontecer na história da humanidade, mas onde a
palavra escrita não tem qualquer valor e, consequentemente, tudo o que se diz
ser inaceitável aos olhos do homem dos séculos XX e XXI repete-se!
Recuso-me a aceitar que uma boa parte da população
viva em situação de pobreza extrema, passe fome, sem acesso a cuidados de saúde
e de educação básicos, em nome do enriquecimento insustentável de alguns países,
que mesmo assim não evitam as graves assimetrias sociais internas e onde o
desperdício de alguns tem o cheiro fétido da desumanidade! Recuso-me a aceitar
a corrupção que grassa por todo o lado, desde os países desenvolvidos aos de
terceiro mundo, onde ainda será pior, o que rompe o tecido social e a alma
humana, pelo descrédito perante o cinismo. Recuso-me a aceitar a hipotética
ideia de ver um Bolsonaro chegar ao poder e que faz o ridículo Trump parecer um
menino de coro! Recuso-me a aceitar os Putin e os Assad e o autoproclamado Estado
Islâmico que mais não querem do que poder, poder, poder, à custa do controlo do
cidadão, mantendo-o na ignorância e na ausência de espírito crítico! Recuso-me
que haja seres humanos tão estúpidos que continuem a pensar que a violência
extrema se combate com outra! Irra! Enerva-me, porque ou desconhecem totalmente
a História ou são tão desprovidos de interesse e de intelecto que não refletem
sobre o que se pode aprender com ela!
O que eu vejo é a incapacidade do Homem em aprender
com os próprios erros ao longo dos séculos! Vejo o Homem que se deixa
continuamente seduzir pelo poder e pelo dinheiro. Vejo uma sociedade podre, que
aceita tudo o que lhe querem impor, que não se mobiliza na defesa do direito do
seu semelhante, que afinal também é o seu… Vejo uma sociedade sem capacidade crítica
e autocrítica, que se mantém de ilusões e onde cada um se fecha sobre si mesmo
e no seu burguesismo, vivendo para as suas pequenas ou grandes vaidades, sem
nada questionar! Vejo gente a quem nada dói, porque nada do que vê lhe diz
respeito, a não ser a vida do vizinho mais próximo! Vejo uma sociedade de
mentecaptos com a qual não me identifico e não quero integrar!
Serei, talvez, eu a louca que afinal circula em
contramão! Serei, talvez, eu a louca que precisa de recriar um mundo só seu de
onde possa erradicar todo o mal! Caso para dizer, só um momento, vou ali cortar
os meus pulsos e já venho!
Nina M.