A crónica
de hoje pretende fazer um agradecimento público a um dos maiores humoristas
portugueses, Ricardo Araújo Pereira (RAP). Verei se consigo fazer-lhe chegar a
missiva.
Julgo
falar em nome da maioria dos professores portugueses. De repente, no meio de
tantos mimos com que o Governo e a população em geral têm brindado os
professores, eis que surge uma voz lúcida, através do tom jocoso e humorístico
que lhe é característico! Ainda no programa de ontem, Governo Sombra, Ricardo mostrou-se um indefetível defensor dos
professores, quando seria mais fácil, no meio de tanta crítica, atirar mais uma
pedra. Mostra uma consciência plena das dificuldades da profissão, sabe que os
professores não ganham balúrdios nem trabalham pouco e compreende a campanha
vergonhosa e torpe, o atentado ao bom nome e à dignidade da classe. RAP
considera justa a recuperação do tempo de serviço (942) que os professores tanto
reclamam, porque efetivamente o trabalharam e porque foi o que ficou estipulado
pelo Governo e a sua geringonça no Orçamento de Estado. Querer fugir disto,
nada mais é do que mentir descaradamente.
Assim,
quando os seus colegas de painel, não discordando em absoluto de RAP, são mais
cautelosos, afirmando, no caso de Pedro Mexia, agora António Costa já vai
dizendo que não há dinheiro e que tem que tratar por igual todos os funcionários
públicos, só me apetece responder: que tivesse pensado antes de usar a retórica
política para colher os seus louros!
Quanto
a João Miguel Tavares e ao seu não argumento de que há professores que são mal
pagos relativamente ao que fazem e os que recebem mais do que o merecido, só
posso responder que, não deixando de haver um fundo de verdade, tal situação é
transversal a todas as profissões! Insistir na tónica de que não há avaliações,
por favor! Estou à espera de aulas assistidas para poder progredir! Todos os
anos somos avaliados e com quotas que limitam a atribuição da menção “Muito Bom”
ou “Excelente”!
Mais,
João Miguel Tavares, os professores são, na sua larga maioria, pessoas
dedicadas ao ofício e aos seus alunos! Uma pequena parte não pode pôr em causa
uma classe inteira! Os professores também se preocupam com questões
preponderantes da Educação, para além do seu salário! Não queremos trinta
alunos por turma! Colaboramos na implementação de novas políticas sem séria
discussão e auscultação da opinião de quem está no terreno! Vamos introduzir o
modelo da flexibilização curricular em turmas gigantescas! Ninguém se preocupa
em resolver o problema da indisciplina que grassa nas escolas! Deixe que lhe
diga… Por incrível que pareça, essa indisciplina, normalmente, excetuando casos
raros, também não é da responsabilidade do professor! Há algo que mais que se
chama meio social e que quando o invocamos junto de alguns teóricos do eduquês,
preferem enfiar a cabeça na areia e dizer que o meio não pode servir de
justificação! Provavelmente, nunca estiveram dentro de uma sala de aula! Nunca
tiveram que amparar alunos vítimas de violência, de abusos, filhos de pais alcoólicos,
oriundos de famílias completamente desestruturadas e que a última coisa que
lhes interessa é a escola! Posso garantir que muitas vezes, com esses meninos,
não lhes fica na memória o que é um sujeito subentendido ou a mensagem de Os
Lusíadas, mas lembrar-se-ão do professor que percebeu que ele não estava
bem e que o tentou ajudar com os meios de que a escola e ele mesmo dispunham! Esta
é a vida real em boa parte das escolas públicas portuguesas. Todos os problemas
existentes na sociedade chegam até nós, professores, nas escolas! Somos bem
mais do que o mestre que orienta e ensina: somos pais, psicólogos, amigos,
assistentes sociais e tudo mais o que possa imaginar! Acha mesmo que o mais
incompetente dos professores não merece o seu salário, tendo de lidar com estas
situações?! Devemos ser a classe mais resiliente e resistente de que já ouviu
falar. Não merecemos ser desconsiderados desta forma!
Um nível
de um país também se vê pelo respeito que dedica aos seus professores…
Quanto
ao RAP, uma vez mais, um sentido obrigada por ser a voz dissonante numa
comunicação social desinformada e tóxica!
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