Um
amigo especial, com quem tenho conversas profundas que me fazem pensar, e
portanto, crescer e evoluir, sugeriu-me como tema para a crónica a crueldade
imposta às crianças, a propósito do que se vem passando nos Estados-Unidos da
América. Os imigrantes ilegais veem-se afastados dos seus filhos,
independentemente da idade que estes possam ter, e assistem ao seu enjaulamento
como se se tratassem de animais amestrados, a quem se garante o direito a
alimentação e pouco mais. Se tal tratamento não é admissível com um animal, o
que dizer com crianças?!
Reconheci
a minha dificuldade em abordar tais questões, pela minha particular
sensibilidade ao tema. Se a sonegação dos direitos fundamentais a qualquer ser
humano me indigna, quando se trata de crianças, seres indefesos e sem
capacidade para avaliar ou sequer compreender a situação em que se encontram
envolvidos, fico estarrecida, revoltada, irada e vulnerável à dor que me causa
insónias, retira o sossego e me cria uma sensação de vazio deixado pela minha
impotência objetiva. Infalivelmente, comovo-me e sinto as gotas de orvalho
morno a lavar-me o rosto, sempre que leio, ouço e vejo relatos de
comportamentos ignóbeis e cobardes. De forma egoísta, vou-me protegendo,
evitando o assunto que me incomoda terrivelmente.
Hoje,
não poderá ser, porque mesmo tendo resistido num primeiro impulso, várias
pessoas me lembraram dos factos ao longo do dia. Sirva, pelo menos, para minha
catarse.
Começo
então por lembrar alguns dos direitos fundamentais da criança, aprovados pela
ONU, em 1959, catorze anos após o Holocausto.
1-
Todas as crianças, independentemente
de cor, sexo, língua, religião ou opinião, têm os direitos a seguir garantidos.
2-
A criança será protegida e terá
desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social adequados.
6- A criança precisa de amor e compreensão.
7- Toda criança terá proteção contra atos de discriminação.
Parecem-me todos de fácil interpretação. Assim, sendo o país
do Sr.Trump um dos membros da ONU e o principal responsável pela sua criação e cuja
sede primeira se situa em Manhattan, Nova Iorque, como pode ele desrespeitar,
em primeiro lugar as crianças, mas também a memória do seu antecessor e promotor
da organização “Franklin Roosevelt?” Como pode o Sr. Trump fazer desrespeitar
todos os direitos acima citados sem se interrogar o motivo pelo qual eles foram
criados? Será que o Presidente dos Estados-Unidos é cínico além de louco?!
Não pode valer tudo na proteção das fronteiras, na tentativa
de evitar a imigração ilegal! Concedo-lhe o direito de proteger o seu país do
excesso de imigrantes ilegais, mas não de forma grosseira, desumanizada e vil.
Um país que não sabe guardar nem proteger a inocência de qualquer criança, independentemente
da sua cor, sexo, língua, religião ou opinião, não merece o epíteto de estado
de direito, quando tudo vai torto!
Terá esse senhor consciência dos danos psicológicos causados
às famílias, mas especialmente às crianças, que não compreendendo o que se
passa, julgam-se abandonadas pelos progenitores?!
Poupem-me, por favor, ao argumento fácil e torpe que se lê
nas redes sociais a culparem os pais destes meninos por os terem colocado nessa
situação, sabendo o que acontece no caso de serem apanhados! Eu não posso, em
consciência, condenar alguém que busca melhores condições de vida!
Olho inevitavelmente para trás e vejo o mesmo semblante
aterrorizado, de incompreensão e de dignidade perdida dos judeus do Holocausto.
Auschwitz não terminou, continua vivo e exposto aos olhos do mundo! É isto a
civilização?! A bruteza e adormecimento dos sentidos? Onde estão os restantes
estados-membros da ONU para exigirem bom senso e correção?!
A hipocrisia do mundo é absolutamente insuportável! Criam-se
regulamentos e direitos para que possam ser quebrados ao sabor arbitrário dos
que mandam nos desígnios de um país. Enquanto assim for, as crianças do Congo
continuarão a extrair o cobalto, nos países assolados pela guerra, continuarão
a existir crianças-soldados, continuarão a casar meninas com velhos repugnantes
ou a usá-las para fins de turismo sexual, continuarão a ser privadas de
educação e forçadas a trabalho escravo, enfim… Continuarão a ser exploradas,
sem o direito de serem apenas o que são: crianças!
Se isto não é o fim de uma civilização, deverá estar muito
próximo. É precisa boa vontade para humanizar a humanidade e se não é motivo
para que todos sintamos náuseas, então, eu sou a grande deslocada deste mundo!
Nina M.
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