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sábado, 27 de dezembro de 2025

Crónica de Maus Costumes 448

 

Palavra dada, palavra honrada

               O Natal foi regado com Moët & Chandon, espécie de promessa antiga que o meu mano decidiu pagar porque alguém o terá presenteado com uma. Não foi egoísta ao ponto de a beber sozinho e decidiu partilhar o néctar, sugerindo o assunto para a crónica.

            As reações não foram consensuais. Uma das cunhadas estremecia. Sabia-lhe a amargo. O pai declarava que preferia o seu Contemporal ou Raposeira meio-seco. Eu declarei logo que aprecio o meio-seco, mas que este bruto era bom, até porque não aprecio o espumante doce, do género Asti Gancia (acho que deveria cobrar publicidade nesta crónica). O champagne era brut e, como se sabe, deveria acompanhar refeição e não o doce, mas a garrafa era única e nós muitos, logo para acompanhamento de refeição, nem para um singelo bochechar chegaria. Eu já não me lembro como surgiu a promessa. Sei que num jantar qualquer em que nos encontrávamos todos, eu lá soltei qualquer coisa como se fosse uma Moët & Chandon é que era bom e o mano mais velho lá disse que não era coisa que não se pudesse experimentar e declarou, solenemente, que um dia traria uma. Ora… Se fosse um Dom Pérignon era bem mais caro, acrescentei, mas ainda assim, engolir trinta e tal euros, num pequeníssimo instante que rapidamente se esvai, era coisa que me custava. Isso e comida… Deus me livre! Não como que se justifique tal! Muito menos de momento, com as minhas intolerâncias! Eu faço logo as contas em livros (o mais barato) e em viagens (o mais caro).

Se andar atenta… Ainda por estes dias poderia ter comprado quatro livros por vinte euros. Não o fiz. Comprei um há pouco por esse valor, mas não o arranjava mais barato. Se usasse a Vinted, com jeitinho, conseguia cinco ou seis livros pelos trinta euros. Garantem-me horas de prazer e conhecimento e são peças únicas que enfeitam as minhas estantes e por lá permanecem. Se me apetecer, posso revisitá-los, enfim… Os livros são coisas sólidas e perenes. De modo que entre gastar dinheiro em vinho ou em livros, eu fico com os livros! Além disso, como dizia o senhor Claudino: É vinho!

            Certo é que quem nasceu para lagartixa nunca chega a jacaré, logo, meus caros familiares, tendes é jeito para pobres, porque quem experimenta Moët & Chandon e faz caretas ou prefere Raposeira, está bem como está. É o pé que puxa para o chinelo… Nada a fazer… E se eu fosse o caco Antibes do Sai de Baixo, diria: “Detesto pobre!”, “Tenho horror a pobre!”

            Agora, que a promessa foi cumprida, tarde ou nunca voltarei a beber do mesmo, pelo menos que seja eu a comprar… Enfim…

O meu irmão mais velho tem destas coisas. Gosta de agrados e, por isso, para todos os sobrinhos, o tio Paulo é que é fixe. Também cumpriu a promessa de lhes fazer a francesinha, no dia 23, quando se celebrava os 58 anos de casados dos avós. Não sei que lhe deu para cumprir tudo de enfiada… Eu acho que foi para pagar a penitência do que me agastava quando éramos pequenos! Era uma melga que me arreliava fortemente. Andávamos sempre pegados e era certo e sabido que a mãe, já sem paciência e farta de nos aturar, distribuía uns chapotes a cada um para resolver a questão. Irritava-me sobremaneira! Chateava-me a cabeça e ainda levávamos por cima! Se fosse hoje, eu haveria de ficar caladinha, sem pestanejar, mas quê… Inocência… Éramos o cão e o gato, mas sempre um atrás do outro. O mais velho e a do meio. O mais novo não entrava nestas guerras.

            Esse meu irmão mais velho dá-lhe para pancas! Ainda solteiro, comprou uma moto, apesar de ter carro. Não sei se uma Susuki ou Kawasaki, mas era daquelas que se deitam nas curvas, a parecer moto de pista e queria levar-me a dar uma volta. Nunca! Primeiro, sabia que ele gostava de  dar gás e, depois, lembrava-me bem dos dois grandes tombos que tinha dado com ele na bicicleta e que me deixaram toda arrebunhadinha! Ainda hoje tenho os joelhos impróprios de uma “lady” à conta dos tombos! Um deles foi nos pavilhões (assim designávamos), o largo da escola primária em que andámos e que era um pavilhão de madeira provisório, constituído por duas salas, que perduraram mais de vinte anos, talvez. Imediatamente atrás da escola, era monte, com eucaliptos enormes que deixavam o terreno cheio de bugalhas. Claro que o meu irmão teve a ideia de jerico de me levar com ele na sua bicicleta, que tinha um selim comprido, onde cabiam dois rabos magros de petizes. Éramos ambos escanzelados, portanto, cabíamos perfeitamente… Bem lhe gritava para ir devagar, mas quanto mais lhe dizia, mais ele pedalava… Logicamente, uma derrapadela nas bugalhas foi a morte dos dois artistas! Joelhos, cotovelos e mãos numa desgraça!  A outra vez foi em Fundo de Vila. Não sei que recado foi levar ao senhor Claudino, mas não queria ir sozinho e lá me convenceu a acompanhá-lo, mais uma vez de bicicleta. Fi-lo jurar que ia devagar, mas claro que depressa se esqueceu e, mais uma vez, houve tombo e arranhadelas em barda. Não admira que em pouco tempo rasgasse as calças que a minha mãe lhe comprava. Era catraia, admite-se, agora, moça já nas casa dos vinte, já não me apanhou na moto. Nunca! Nem uma única vez! Não fosse o Diabo tecê-las... Deixei isso para a minha cunhada que é corajosa ou inconsciente, vá lá saber-se! A fronteira entre ambos é ténue…

            À medida que o tempo foi passando, desapareceram as implicâncias e sobrou a irmandade. Quando um chegava a casa e o outro não estava a primeira pergunta que se fazia à mãe era: O João Paulo?  (no meu caso) ou a Sónia? (no caso dele). Hoje, é o irmão que me vai levar e buscar ao aeroporto, por morar a 10 minutos dele, e ainda me oferece almoço ou jantar. Sempre amigo de fazer vontades.

Acho que deve estar a pagar por todas as arreliadelas causadas… Se pensar bem… Com jeitinho, mano, só com uma Dom Pérignon te podes redimir!

 

Nina M.

 

 

 

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