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sábado, 16 de março de 2024

Crónica de Maus Costumes 365

 

Panorama nacional
No rescaldo das eleições, o país preocupou-se e o comentário político diário não ajuda a serenar os ânimos. De certa forma, estranho o espanto. A votação espartilhada já era esperada. Não previa que o CHEGA alcançasse os 19,4 de votação, mas conseguiu-os, talvez junto dos ressentidos e de uma parte da anterior abstenção. Representam cerca de um milhão de eleitores e estes não serão todos, com certeza, racistas, xenófobos e fascistas.
Certo é que eles têm cerca de cinquenta deputados no hemiciclo e é certo também que que Luís Montenegro terá de dialogar e negociar com Ventura, medida a medida. O acordo parlamentar está fora de questão: Não é não. Esta situação que parece de quase ingovernabilidade, na realidade, se fosse num país de democracia verdadeiramente solidificada, que olha mais ao bem comum do que à partidarite crónica e aguda, seria resolvida com boa vontade. A AD e o PS juntos apresentam 63,81% dos votos. Para mim, a mensagem passa cristalina: os portugueses querem partidos e gente moderada à frente do destino do país (o que me deixa satisfeita). Significa que os cidadãos eleitores estão a dizer a ambos que deveriam deixar as partidarites e olhar aos reais interesses do país. Para isso, o novo governo e o maior partido da oposição deveriam conseguir entender-se e chegar a um pacto de regime relativamente a três áreas fundamentais: saúde, educação e justiça, para ver se não andamos constantemente em experiências que não chegam a ser avaliadas. Se os partidos não conseguirem dialogar e chegar a consensos, isso dirá muito sobre a faceta democrata e a (ir)responsabilidade de cada um. Este cenário é comum na Europa. Por exemplo, o sistema eleitoral alemão faz com que seja difícil que um só partido forme governo. Têm de, obrigatoriamente, formar coligações. Para que a composição de maiorias não seja comprometida pela presença de partidos pequenos e até minúsculos, existe a cláusula de exclusão, a barreira de 5%. Neste momento, o governo alemão é formado por três partidos: os partidos Social-Democrata (SPD), Os Verdes e Liberal Democrático (FDP). Atualmente, o governo do Luxemburgo é uma coligação do Partido Socialista dos Trabalhadores de Luxemburgo (LSAP), Partido Democrata (DP) e o Partido Verde. A Bélgica é governada por uma coligação de sete partidos, de várias orientações, incluindo liberais, socialistas, verdes e democratas-cristãos, dirigida por De Croo, que pertence ao partido liberal-democrata flamengo. A Dinamarca é governada pelos sociais-democratas, pelos liberais e (o partido centrista) Os Moderados, numa coligação dirigida pela social-democrata Mette Frederiksen. Poderia continuar com os exemplos. Uma pesquisa rápida mostra-nos que a Bulgária, a Chéquia, a Estónia, a Irlanda, a croácia, a Grécia, entre outros, são também governos de coligação. Se os partidos rivais de outros países conseguem pôr-se de acordo, por que razão Portugal não há de fazer o mesmo? A pluralidade é o melhor para um estado democrático saudável, desde que se tenha o verdadeiro sentido da política: o serviço público em prol do bem comum e isso implica deixar de lado egos partidários que não cabem mais num parlamento que se quer desempoeirado e moderno. Ficou claro que grande parte dos portugueses quer uma viragem e quer responsabilidade no hemiciclo. O partido que deixa o Governo tinha uma maioria e foram os seus desmandos que atirou o país para a crise política e a necessidade de eleições. Creio que é preciso que os partidos se mentalizem para a nova realidade: os portugueses, finalmente, perceberam que as maiorias são prejudiciais. Criam vícios e governos surdos, demasiadamente afastados do país real. É preciso que os parlamentares saiam das suas bolhas e vejam com olhos de ver o país em que vivem. Quando os ouço falar das opções políticas tomadas e da situação do país, parece-me que vivem num lugar que eu desconheço e que não é a mesma nação que a minha!
As eleições não foram inventadas para satisfazer partidos, mas para que o povo soberano expresse a sua vontade. O dever do hemiciclo é cumpri-la. Assim se vive em democracia e os partidos serão julgados, futuramente, pelo seu comportamento. Parece-me ainda que se o Partido Socialista quiser realmente evitar uma ação preponderante e decisiva do CHEGA nas decisões para o país, só pode tomar um caminho e esse será o do entendimento, caso contrário, poderá ser responsabilizado por ter contribuído e fomentado a instabilidade governativa, por um lado e, por outro, promover um papel de relevo do partido que tanto criticam, para que as medidas preconizadas por quem agora chegou possam ser implementadas.
Acompanharemos os desenvolvimentos.
Resta-me deixar uma palavra de apreço aos jornalistas que fizeram greve, algo que não é usual na classe. Vivem tempos complicados e um país precisa de bom jornalismo de investigação, que contribua para o bom funcionamento das instituições democráticas. Seria uma perda irreparável o desaparecimento de certos órgãos de comunicação social. O ideal seria encontrar uma solução que não implicasse a injeção de dinheiros públicos, pois, por um lado, ficaria sempre a pairar a nuvem negra da tentativa do controlo dos meios de comunicação e, por outro, a injeção de capital público em empresas privadas tem a sua bizarria. No entanto, a existência de uma imprensa capaz e livre é absolutamente indispensável. Não sei o que a sociedade poderá fazer como coletivo, mas sei que tem o dever de agradecer aos que, mesmo sem salários, têm continuado a trabalhar com o profissionalismo de sempre. Bem-haja!
Nina M.

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