Cultura e lazer
Trouxe comigo “O meu
irmão” devidamente autografado e obtive umas pequenas informações sobre o
trisavô do escritor, de que precisava. Ainda não li nada de Afonso Reis Cabral,
mas fica a promessa de lhe pegar, ainda durante o verão. Rapaz simpático, muito
comunicativo, a quem o bichinho da palavra mordeu cedo e que publicou o seu
primeiro livro, de poesia, aos 15 anos. Questionado pelo moderador sobre o
processo de construção de um livro, lá foi esclarecendo sobre o trabalho de
partir pedra que é necessário fazer para se escrever. A inspiração não chega.
Pode haver um conjunto de páginas inspiradas, mas as restantes são fruto de
trabalho árduo e dos silêncios ruidosos do autor. Em “O teu irmão”, o narrador
relata a história entre dois irmãos e um deles é acometido pela inveja, porém,
Afonso Reis Cabral inverteu os termos. É o irmão mais inteligente, professor
universitário e bem-apessoado, aparentemente mais bem-sucedido, que sente
inveja do seu irmão que é portador de Síndroma de Down, mas que parece beneficiar
de uma predisposição para a felicidade. A literatura sempre a desconstruir e a
procurar o que foge ao tangível.
Não resisti perguntar-lhe, no final, se ele,
Afonso Reis Cabral, acreditava na existência de uma predisposição genética para
a felicidade, uma vez que o ser humano tende a procurar o hedonismo, ainda que
possa haver alguma confusão entre o que são momentos de prazer e o conceito de felicidade, porque esta
implica a vivência de momentos agradáveis e, se, por outro lado, essa
predisposição para a felicidade do irmão portador da síndrome, se prendia com a
questão da consciência infeliz de Pessoa, isto é, se tende mais à felicidade
aquele que preserva a sua inocência. Ouvi a resposta. Não haverá propriamente
predisposição genética, mas todo o ser humano deseja a felicidade. Ela aparece
sob a forma de desejo de algo que se pretende alcançar. O problema é saber no
que consiste a felicidade e que talvez a preservação da inocência, da pureza pueril
ajudasse. Foi uma pergunta difícil, eu sei. Não é questão à qual se consiga
responder com total convicção sem ter tempo para refletir, mas creio que esta
questão já lhe terá perpassado pelo espírito diversas vezes…
Depois, como
disse Pessoa, só os seres mais superficiais têm convicções absolutas. Parece
paradoxal, mas não é. Quem reflete sobre as coisas terá sempre mais dúvidas e,
como tal, poderia adormecer republicano e acordar monárquico. Afirmar-se
republicano e criticar veementemente a República… Assim, há sempre tempo para
analisar e reformular pensamentos e mudar de opinião, no caso de não sermos
superficiais.
Certo é que saí de
lá com mais dois livros, que serão para ler e não servirão apenas para enfeitar
estantes.
Nina M.
Sem comentários:
Enviar um comentário