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domingo, 11 de junho de 2023

Crónica de Maus Costumes 329

Indecisões

 dia disse a alguém que ninguém vinha para a nossa vida por acaso… Talvez precise de reformular a frase. São as circunstâncias e o acaso que trazem pessoas até nós, mas não em vão. Talvez todos os que se cruzam connosco venham para aprendermos algo com eles, mesmo com aqueles de quem gostamos menos…

Desde logo, aquilo que nos irrita no outro, a fiar no que nos diz a psicologia, pode ser projeção, ou seja, projetamos no outro emoções, qualidades e defeitos próprios. Pode ser gerador de conflitos. Eu fico em pulgas com essa ideia, porque há comportamentos de que não gosto, que tento a todo o custo evitar e que sei não ser projeção, mas nunca fiando… É preciso estar vigilante. Sempre. 

O ser que mais me desafia, no momento, é o meu aborrescente preferido, porque é único, porque veio do meu ventre, porque não admite com a sua sobranceria calada que o olhem sob um ponto de vista utilitarista. Ele nasceu para nada, de momento, porque ainda não o descobriu, talvez não tenha nascido para nada de importante, além de ser. E essa liberdade com que o faz tanto me irrita como me apaixona. O meu pequeno é rebelde por inação. Não contesta as recomendações, nem responde, mas no seu silêncio vai agindo como lhe apraz. Não tens de ser útil, meu filho, por enquanto, pelo menos. Tens de ser. E eu devo ajudar-te a ser com toda a proteção e toda a irritação de mãe. 

Tem os pés nas nuvens, o seu espírito não está cá. Disse-lhe, ainda hoje, que pusesse no papel um terço do que pensa. Nem me respondeu… Terá pensado que a mãe é doida… E tem tanto de mim quando se perde no seu mundo, calado, absorto. É aborrecido quando a realidade bate à porta e os afazeres de que não gostamos nos esperam. Eu sei, mas já ganhei estratégias para contrariar tudo isso. Há de procurar as suas. É do ar e exigem-lhe o chão. Terá de se adaptar. Esta minha pessoa desligada do mundo, que detesta a escola e que insiste que está organizada para formatar gente e os tornar meros assalariados e bons cumpridores de ordens, veio para me ensinar a reorganizar ideias e perceber que cada um tem o seu ritmo. Há quem insista que a vida não se compadece dos ritmos mais lentos. São os mais agitados produtores que tentam impor uma pressa opressiva, útil e produtora, numa sociedade voraz onde deixou de haver tempo. 

Não sei o que quererá, nem ele sabe. Sei que as escolhas lhe serão difíceis. São sempre difíceis para quem quer abarcar o mundo e sabe que uma escolha deita outras possibilidades ao lixo. Fruto deste mundo novo, falta-lhe resiliência e compromisso. Falta-lhe a maturidade de quem já tem objetivos estabelecidos. Ganha em sentido de humor e de calma, capaz de fazer inveja a um estoico pelo nível de ataraxia revelado.

Veio para ensinar a aceitação, a tolerância e a paciência. Saber que tudo tem o seu tempo e que o tempo dos outros é diferente do seu. Veio para ter a liberdade de ser e o coração de mãe aconselha a serenidade e a paciência, porque sabe que, um dia, tudo estará mais claro e no seu devido lugar. 


Nina M.

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