Ministro, escuta! Os professores estão em luta!
O subtítulo era um dos gritos de ordem de ontem, na manifestação que juntou entre vinte e cinco a trinta mil professores, a quem o tempo ajudou.
Começo
com um agradecimento aos colegas de Vilela, Paredes, que se organizaram para
fretar um autocarro e que foram parceiros de viagem e de luta. Foi um dia longo
e cansativo, naturalmente, e que começou muito cedo. Não foi fácil para os
professores, nesta altura, irem a um sábado a Lisboa, mas foi necessário e
bonito de se ver. Finalmente, os professores obtiveram atenção e cobertura
televisas. Parece que o país, tal como quem nos governa só vai ouvindo quem se
junta em multidão considerável em frente à Assembleia, a casa da Democracia, em
protesto e apupo. Cheguei a temer pelo movimento, pois assim que se chegou,
havia alguns colegas, mas não em número que permitisse perceber a dimensão da
manifestação. À hora marcada, os professores começam a surgir das várias
artérias que levam ao Marquês. E assim que se inicia a marcha em direção à
Assembleia, com regozijo, começamos a perceber a mole humana que se estendia
ordeiramente, em protesto. Passamos pela Mortágua cidadã, que se abeirou no
passeio, mas não se contou com a presença dos vários partidos que costumam
colar-se a estes movimentos. Talvez pensassem que seria pouco expressivo, dadas
as condições em que aconteceu. O S.T.O.P., organização sindical a quem o
Governo e as outras associações sindicais prestam pouca atenção e acusam de
radicalismo, soube compreender a insatisfação da classe, que é grande, e
mobilizar as pessoas. Este sindicato é pequeno, pouco expressivo, mas talvez cresça
depois disto. Lembrar que os milhares de professores que ali se encontravam não
são todos associados do S.T.O.P. Muitos deles não terão qualquer filiação
sindical, outros serão filiados noutras associações e, outros, por certo,
pertencem mesmo ao sindicato que ajudou a dar voz ao descontentamento e o
galvanizou. O posicionamento dos cidadãos em relação ao panorama político mudou.
Continuamos a ter os indefetíveis defensores partidários, mas a quantidade de
pessoas que se desliga desses movimentos e se orienta pelo que o seu espírito
crítico e consciência lhes ditam tem vindo a aumentar, para a ser a realidade
nos próximos tempos. Não há razão para se impugnar a liberdade de escolha face
a uma posição partidária com a qual não se concorda. Acredito que os cidadãos,
principalmente, as novas gerações, cada vez mais, farão as suas opções sem
atenderem a cores partidárias, como acontecia no tempo dos meus pais, nos anos
conturbados pós abril. Significa que se assim funciona relativamente à vida
política do país, também acontece na mesma medida noutras organizações,
portanto, não se pode medir a força de um movimento de sublevação pelo apoio
que é dado pelos maiores representantes sindicais. Já em 2008, na famosa
manifestação dos cem mil professores e que quase derrubou a senhora ex-ministra
cujo nome evito pronunciar pela urticária que ainda me causa (julgo que ainda
não surgiu político que me tivesse conseguido espoletar tanta ira), o
descontentamento nasce no seio da classe e é, depois, cavalgado pelas
organizações sindicais. Porém, a revolta é genuinamente das pessoas, a quem os
sindicatos se associaram e bem, pois é para isso que existem: defender a classe
profissional que representam e não agendas partidárias ou próprias. Estamos
perante uma situação similar e os nossos representantes têm de se habituar a
ouvir a voz da população. Ministro, em latim, significa aquele que serve e é
para isso que eles são eleitos, para servir os que os elegeram e não para se
servirem deles. Ninguém serve bem o outro se não o souber ouvir, acolher as
suas preocupações, dialogar e chegar a consensos, de boa-fé. Marcar reuniões
que não conduzem a lado algum, porque já se estipulou que “vale mais um mau
acordo do que acordo algum”, questiono, para quem?! Para o Governo ou para os
reivindicam? Não, senhor ministro, o que vale mais é defender aquilo em que se
acredita. Não queremos um mau acordo. Queremos que o Governo e os Sindicatos
com maior expressão compreendam isto: os professores não estão dispostos a
fazer um mau acordo! Não desta vez. Temos vindo a ter sucessivos mais acordos
desde 2008 e estamos fartos! Apetece dizer: Chega! Basta! Quero usar a palavra
chega sem qualquer receio de outras conotações. Chega de os professores serem
lesados e feridos na sua dignidade! Chega de atropelos! E se surge um sindicato
pequeno, mas que é capaz de dar voz ao ditado “vale mais partir que torcer”,
pois ainda bem, já que só assim parecem combater a surdez com que se imunizam!
Ontem,
o senhor ministro já concedeu entrevista. Estava nervoso. Transpirava. Não
creio que fosse apenas pelo calor do estúdio, mas porque percebeu que a
contestação engrossa fileiras. Como todos os governantes, o João Costa preferiu
cerrar dentes e não mostrar fraqueza antes de negociar, quis estabelecer linhas
vermelhas com um microdiscurso orientado para persuadir a opinião pública e não
os seus professores. A profissão docente tem as suas especificidades, pelo que
não é comparável com outros serviços públicos. Um professor contratado ou de
quadro desenvolvem o mesmo tipo de trabalho, independentemente dos cargos que
cada um exerce. O cargo de direção de turma é dos que mais trabalho e
responsabilidade implicam e é dos que menos importância se lhe atribui e, no
entanto, sem ele, as escolas não funcionariam. Ninguém o deseja e quase todos o
fazemos, contratados e gente do quadro. Os que não desempenham este desempenham
outros, portanto, senhor ministro, há hierarquias, mas não há “chefias” no
sentido literal do termo, com papéis absolutamente distintos. Um diretor de
turma, um coordenador de departamento, um coordenador de projetos, um
coordenador de cursos profissionais, professores que integram grupos de
trabalho diferenciados e afins continuam todos a cumprir a principal função e a
mais prazerosa: dar aulas. O senhor sabe-o. Tem essa obrigação, pelo que vir
falar para a opinião pública, dando a entender que os professores não podem ser
diferentes de outros serviços públicos não passa de um sofisma ou não teríamos
um Estatuto Próprio a que o senhor quer pôr termo. Depois, mente ao tentar
desvalorizar o movimento gerado nas redes sociais, fazendo crer que não passa
de populismo. Trata-se de descontentamento, indignação e revolta e ficou o
aviso. Por último, talvez fosse bom enviar para as televisões o documento
emanado do Conselho de Ministro para que se perceba quem mente. O cerca de
trita mil professores que estiveram presentes na manifestação, senhor ministro,
não são nem iletrados nem ignorantes. Sabem ler e interpretar. Importa mais o
que não está escrito do que o que ficou redigido. A sua garantia verbal de que
não haverá professores selecionados pela autarquia vale zero, quando pela
redação do documento tudo é possível! E é verdade. É mesmo isso que o senhor
está a pensar. Não! Os professores não confiam nem em si nem no seu Governo.
Por
último, colegas, é tempo de união. Precisamos de todos, porque só com todos
evitaremos a hecatombe. É tempo de unir e não de separar. Professores (do
público e do privado) e Associações sindicais é tempo de agirmos coletivamente,
pois a luta ainda agora começou. Centremo-nos no que importa: a escola, os
alunos e os seus professores.
Nina
M.
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