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sábado, 9 de julho de 2022

Crónica de Maus Costumes 285

 

 A importância dos famosos “rankings” das escolas

            Ontem e hoje, o assunto das redes sociais, mais uma vez, como todos os anos, desde que foram inventados, são os famosos “rankings” que ordenam as escolas do país pelos resultados dos seus alunos nos exames nacionais, nas mais variadas disciplinas.

            A partir desta ordenação, infere-se, numa análise pouco cuidada e pouco credível, apesar da objetividade dos resultados, quais as melhores escolas do país e quais as piores. Trata-se de uma depuração deturpada, porque insiste em comparar realidades incomparáveis. Desde logo mistura a escola pública com colégios privados, que como toda a gente de bom senso reconhece, tem alunos com perfis diferenciados. Os privados são procurados por famílias com condições económicas e sociais distintas, que conseguem proporcionar um acompanhamento escolar diferente aos seus filhos. Muitos dos alunos que frequentam o ensino privado procuram, ainda assim, a ajuda de explicadores externos (muitos deles trabalham na escola pública e são pessoas competentes) para colmatar uma ou outra dificuldade que possam ter. Não vejo qualquer mal naqueles que têm possibilidades económicas em escolher um privado do seu agrado e propiciar todo o auxílio de que o filho possa necessitar. Se o podem pagar têm toda a legitimidade para o fazer. Erradas são as análises subsequentes e considerar-se a escola x melhor do que a y, porque a média obtida pelos alunos nos exames realizados é mais elevada. Só poderemos estabelecer esse tipo de comparação quando as condições forem as mesmas e a verdade é que não são. A escola deixou de ser um elevador social há algum tempo. A maioria dos meninos que frequenta o privado pertence, no mínimo, a uma classe média alta e quando de lá sair a ela continua a pertencer. Estas escolas, na generalidade, escolhem os alunos e não são inclusivas. Com jeitinho, os seus professores não precisam de conhecer o Decreto-lei 54. Estas escolas não precisam de fornecer a única refeição quente do dia ao aluno, o suplemento alimentar para que as crianças possam tomar pequeno-almoço, nem solicitar a intervenção da CPCJ, não precisam de lhes incutir hábitos de higiene nem de garantir que, pelo menos, na escola, os meninos tomam banho. Estas escolas também não têm que lidar com os alunos que não querem estudar e que prefeririam estar a trabalhar. Obviamente, nem todos os alunos da escola pública têm este perfil. A escola pública alberga todos, porque é uma escola pensada para todos: do mais miserável ao mais burguês, do menos capacitado ao mais capacitado e, com a realidade que tem, cumpre o melhor que pode com os escassos meios que lhe são dados. Há muito se faz omeletes sem ovos na escola pública, com os esforço de toda a comunidade educativa, passando pela direção, pelos auxiliares (muitos deles autênticos tutores de certos alunos e merecem todo o reconhecimento) e, naturalmente, pelos professores. Comparar resultados de exames em universos tão distintos é uma falácia! Seria como comparar um atleta de alta competição em determinado desporto a um atleta amador. Gosto de fazer as minhas corridinhas, mas não preciso de testar para saber que se fosse correr com a Aurora Cunha, Rosa Mota ou Fernanda Ribeiro não seria capaz de aguentar o ritmo delas. Estabelecer comparações entre escolas sem atender à realidade económica e social dos seus discentes é ser apenas tonto. A melhor garantia de sucesso de um aluno continua a ser o meio social de onde provém e a sua família. É contra a desigualdade social que a escola pública se bate. Todos os dias se trabalha para que os alunos que a frequentam venham a ter melhor qualidade de vida do que as gerações anteriores. Pelos vistos, a escola pública está a perder a luta. Certo é que estes “rankings” servem apenas para estigmatizar as escolas que aparecem nos últimos lugares, como se não estivessem a cumprir bem o seu papel, à luz da ideia de que a competição e a meritocracia favorecem a aprendizagem. Ora acontece que a realidade de um menino a quem são proporcionadas viagens, explicações, instituto para o inglês, prática desportiva, para além de um acompanhamento familiar próximo é diferente daquele que abre o frigorífico e que o encontra vazio. Os primeiros partem seguramente em vantagem. Obviamente, não têm culpa disso, que saibam aproveitar a oportunidade, porque não fazem mais do que a sua obrigação. Grandes são os que conseguiram superar as adversidades injustas que a vida lhes colocou com o seu esforço. Esses têm, efetivamente, muito mérito. É essa a ideia constante que passo aos meus filhos. Eles frequentam a escola pública tal como a mãe, que é produto da escola pública, mas tanto eles, como eu, partimos com vantagem em relação a muitos. É bom lembrar-lhes isto. É bom que saibam que o sucesso não é inteiramente deles, mas também por um feliz acaso de nascimento e de criação. Já nasceram num meio que lhes inspira expetativas elevadas e têm condições para as realizar. Se falharem, peçam justificações a eles mesmos. Mesmo dentro da escola pública encontramos estas desigualdades, logo o que deve ser feito é conseguir proporcionar os meios de apoio aos mais desfavorecidos, para tentar equilibrar ou, pelo menos, minimizar as diferenças. Sirvam os “rankings” para se investir no ensino público, para que possa ser um efetivo ascensor social.

            Tudo o resto são vaidades, egos inflamados e pouco tino.

 

Nina M.

 

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