Presunção e água benta cada um toma a que quer
Gosto de
andar a pé. Uma das vantagens de trabalhar ao lado de casa é poder ir para o
trabalho a pé e a pé regressar, o que faço sempre que as condições climáticas
permitem e quando não tenho miúdos atrelados a mim para levar, o que faz com
que as vezes sejam menos do que as que gostaria.
Um
destes dias, em que fui e regressei a pé, passei por uns três sujeitos que
conversavam entre si, junto a umas moradias em construção. A determinada altura,
um deles convidou outro para ir a qualquer lado. Responde-lhe o fulano:
- Espera aí, deixa-me só trocar de
sapatos.
Não sei o que o outro lhe
respondeu, mas o anterior insistia:
- É depressa. Tenho na mala as
sapatilhas. Então, já viste, se me veem sair deste carro com estas botas… A
letra tem de bater com a careta, senão o que vão pensar de mim?
Já não estava longe de casa e vim
a sorrir o resto do caminho… Ora bem… O sujeito era alto e entroncado, careca,
falava muito alto e percebia-se a pouca instrução. Vim a pensar com os meus
botões qual seria o mal de o verem com uma botas grossas, de trabalho, e com
terra… Acaso o trabalho honesto, seja ele qual for, não dignifica o homem? A
questão do indivíduo é que conduzia um BMW, daqueles compridões e que eu chamo
de “à chefe de família” e que não aprecio nadinha (sou estranha, eu sei… O
Rodrigo fica incrédulo com a mãe, no que a carros diz respeito). Não sei dizer
se era modelo recente ou não. Não me pareceu, mas percebo pouquíssimo dessas
coisas, porque não as valorizo minimamente. O que me ficou na retina foi o azul
do carro… Um azulão que faísca com o sol. Gosto muito do azul do meu FCP, mas
com parcimónia e em certas peças de vestuário, em carros… Bem… É o que eu
apelido de gosto duvidoso… Ou seja, o sujeito não queria ser visto a sair do
seu BMW azulão de botifarras sujas, não fossem confundi-lo com um simples
operário. Ele, seria, por certo, o patrão! E patrão que se digne tem uma
reputação a manter… Só me lembrava da Joana Marques e da rábula que ela
construiria com isto… Nem de propósito, porque no dia seguinte, aparece-me uma
rubrica da radialista a brincar com o Celso LasKasas. A Joana já esclareceu que
os seus tipos preferidos são os egos inflados. Por isso, brinca tanto com a
Rita Pereira e brincou já mais do que uma vez com o Celso. Para quem não sabe,
o Celso é um empresário de Rebordosa, Paredes, um homem que se fez por si,
apesar de todas as dificuldades que a vida insistiu colocar-lhe. Nasceu no seio
de uma família pobre, o pai esteve preso, apenas tem o 6º ano de escolaridade.
Não gostava da escola e as dificuldades que sentia nesse meios eram muitas. Começou
a trabalhar cedo numa marcenaria do tio, aprendeu o ofício e teve a coragem de
se lançar por conta própria e a capacidade de saber gerir e de fazer crescer o
seu negócio. O Celso tem reconhecidamente mérito. Dá emprego a muita gente, tem
muitas lojas espalhadas pelo país e exporta muito. Para além de mobiliário,
também tem a oferta de design de interiores. Portanto, este empresário contrariou
o destino e teve, certamente, a inteligência de se rodear de gente com outros
conhecimentos para construir o império a que a sua marca está agregada. Por
tudo isto, o Celso tem o direito de estar satisfeito consigo mesmo, de se sentir
orgulhoso pelo seu trajeto. É inegável e de toda a justiça que assim seja.
Se assim é, porque brinca Joana
Marques? Por causa do ego do Celso, tal como brincaria com o fulano que se
recusou sair de um BMW de botifarras de obra. Procurem pelo “podcelso” do
Extremamente Desagradável para poderem compreender melhor… A dada altura o
Celso diz o seguinte: “Eu sei que o meu pack, o meu pacote é top! Eu sei que
qualquer mulher gostava de ter. Isto é a minha autoestima, o espelho a falar.”
Perante isto, a esposa, a interlocutora do “podcast”, apressa-se a dizer ao
mulherio que tenha cuidado porque ele já está ocupado… Mas as pérolas não
terminam aqui… Ora, diz o Celso que não servia para ter uma mulher “dondoca” em
casa, não porque não lhe pudesse dar um cartão ou dois, mas se calhar ao fim de
dois meses retirar-lhos-ia não só pelo que gastava, mas porque não era homem
para ter uma mulher loira de 1, 80 ou 1,90, toda jeitosa, para o acompanhar a
casamentos ou batizados, mas depois, em casa abria a boca e… Nisto a esposa
interrompe e diz-lhe, mas não estou a perceber… isso quer dizer que eu não sou
jeitosa?! A Joana marques pegou sobretudo nesta parte final para brincar e
dizer à esposa do Celso que a sorte dela foi ele não gostar de dondocas e ela
ser uma mulher trabalhadora, apesar de mais gasta…
Eu teria pegado na parte do
pacote top e de ir a casamentos e batizados com uma loira de 1,80!… É que ficamos
a compreender ao máximo que a vida social do Celso pode aspirar: ir a
casamentos ou batizados… Sei lá… Com o dinheiro que tem, poderia escolher
pavonear-se com a loira nas margens do Sena ou no Olympia, no Scala, em Milão,
ou então, nas galleria Uffizi, em Florença, no Royal Albert Hall, Londres, ou
ainda na Broadway, em Nova Iorque, mas não… Quando o Celso pensa em pavonear-se
com loiras é, no máximo, num casamento ou batizado… Vá, tenho para mim, que
teria perfil para mostrar o seu pack em Bora Bora, Maldivas ou coisa assim… Vá
lá, Celso, não sejas tão forreta… Um casamento… O que é isso? Olha que dessa
forma não serás assim tão apetecível!
Olha, eu por mim… Preferia o
empregado de mesa da rubrica de Os Gatos Fedorentos, apesar de dizer: “O livro
quais é?”
- Norman Mailer.
- Peço desculpa, mas aqui só
servimos russos… Pode ser um Dostoiévski, ou olhe… Um Tolstói, tcheckov… Um
Pushkin, uma Akhmatova, se gostar… Olhe, olhe, um Gogol! Agora, Mailer, tem de
ser naquela esplanada ali, está a ver?... Antes, lá só era permitido Flaubert,
mas esse tipo também… Pronto é assim… Aqui, Mailer, não pode ser…
Pois… Isto há gostos para tudo!
Nina M.
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