Mulheres
Han Kang,
escritora sul-coreana, ganhou o Prémio Nobel da Literatura 2024. Caso para
dizer que filha de peixe sabe nadar. O seu pai é também um reputado escritor.
Nunca li nada de Han Kang nem me lembro de ter cruzado com os seus livros,
apesar de haver traduções, em Portugal, de alguns deles. Elogiam-lhe a prosa
poética e a capacidade de expor a fragilidade humana.
Dois anos depois de Annie Ernaux, o
mais prestigiado galardão literário é entregue novamente a uma mulher. Motivo
para celebrar. Olho para estes sinais, no mundo ocidental, e penso que possa
ainda haver esperança, isto é, que possa servir de exemplo e de estímulo a
outros locais onde a mulher ainda é tratada como um ser inferior, uma
mercadoria que se compra e vende, que serve de moeda de troca, cujo corpo é
usado e abusado conforme os apetites da boçalidade.
Ainda que na sociedade ocidental, ao
longo dos tempos, principalmente desde o século XX, o papel da mulher se venha
tornando preponderante, a verdadeira igualdade de género permanece por cumprir,
para além de não convencer outras realidades e outras culturas a ter um olhar
justo e um tratamento digno em relação às suas mulheres. De modo que, de cada
vez que uma mulher se destaca, seja em que área for, é motivo de alegria e de
apreço. Há quem olhe para a discriminação positiva como uma desigualdade, mas
não passa de uma ideia falaciosa. Uma sociedade evoluída e justa entende que é
importante trazer a mulher que revela competências para o centro de decisões. Tal
como o general Eanes disse, não só é desejável, como também é necessário. Dever-se-á,
por isso, atraí-las para certos setores da sociedade, como por exemplo, a
política. Se tiver de se criar quotas específicas para a mulher, pois seja
feito, até que se normalize a sua presença e ela possa ombrear com o homem nos cargos
políticos. É necessário começar a mudança … Estes pequenos passos são sinais de
uma eventual transformação. Espero que Kamala Harris possa vir a ser a
presidente dos Estados Unidos da América (EUA). Uma mulher, ainda por cima,
filha de pai jamaicano e mãe indiana, liderar uma potência mundial, seria um
sinal e um exemplo para o mundo. Já houve uma Tatcher uma Merkel, mas estar à
frente dos desígnios da Inglaterra ou da Alemanha, apesar da enorme importância,
não tem a mesma carga simbólica que liderar os EUA.
O mundo precisa destes sinais. Portugal
precisa destes exemplos. Em cinco décadas de democracia, Portugal apenas teve
uma primeira-ministra: Maria de Lourdes Pintassilgo, em 1979. Depois disso, os
números não enganam: em 41 anos (até 2015), 25 governos e 15
primeiros-ministros diferentes, foram nomeados para funções governativas 1609
homens e apenas 127 mulheres, 92,7% contra os parcos 7,3%. Depois de Lourdes
Pintassilgo, Portugal só voltaria a ter uma mulher ministra, em 1985, quando Cavaco
Silva nomeou Leonor Beleza para a pasta da saúde. Após abril de 74, foram
feitas apenas 31 nomeações de mulheres para o cargo de ministra (as que
frequentam a Assembleia são, na maioria, secretárias ou subsecretárias de
estado), o que abre caminho a homens menos qualificados, permitindo que se
instalem nos corredores do poder. Segundo o professor de Ciência Política,
Michael Baum, há mais mulheres licenciadas e muitas têm doutoramento, logo, são
altamente qualificadas, mas a sociedade portuguesa ainda é muito tradicional no
que respeita aos papéis familiares.
Atualmente, em 2024, o governo
apresenta 24 mulheres, em 59 membros, dez ministros e sete ministras, o
terceiro Governo com mais mulheres na história da democracia. Mesmo assim,
ficamos aquém do panorama mundial.
É uma questão cultural, como o
professor Baum destacou, mas que é preciso combater e contrariar. Prende-se
também, naturalmente, com os interesses da própria mulher, mas que me parece essencial
uma mudança de paradigma, não tenho a menor dúvida. Plantemos a semente para
que a vocação possa surgir.
Mães e pais, eduquem os vossos filhos
na igualdade de género. Capacitem as vossas filhas de que tanto podem ser
educadoras, médicas ou professoras quanto primeiras-ministras, astronautas ou
presidentes da república. Os rapazes já sabem por natureza que podem aspirar ao
que quiserem, pois, está na hora de as meninas pensarem da mesma forma. Fala
quem se interessa por política, mas nunca sentiu o apelo por esses meandros.
Olhai para o que eu digo e não para o que eu faço...
Nina M.
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