Setembro
Chegou o setembro e as suas rotinas.
Veio envolto na melancolia trazida pela chuva, a lembrar que o outono está
próximo e que é tempo de voltar às rotinas ou, nalguns casos, reinventá-las e
construir outras.
Associamos a rotina ao aborrecimento,
a algo que se cumpre por obrigação, por ter de ser e algumas são mesmo
aborrecidas, porém, na verdade, é delas que a vida é maioritariamente feita e
não dos pequenos interregnos que fazemos para as quebrar. De modo que quando
algumas delas se quebram, por força dos acontecimentos, damos por nós a
desejá-las, talvez, a ter a possibilidade de repetir aquele almoço ou o café,
de repetir o trajeto para o trabalho, de sentar em silêncio após o jantar, em
frente a uma televisão desligada, de pegar tranquilamente num livro para ler,
de dar o abraço apertado de sempre ou o beijo a quem se quer bem… Pequenos
gestos do quotidiano, esquecidos, que não valorizamos, que muitas vezes nos
incomodam, mas quando os perdemos, sentimo-nos desancorados.
Só valorizamos o trabalho que nos
aborrece quando o perdemos ou quando não temos saúde para o poder fazer; só
percebemos o valor do gesto, quando deixamos de poder abraçar aqueles que
sempre tivemos como certos ao nosso lado… Lembro-me ainda, enquanto fui professora
contratada, de todos os inícios de setembro serem estranhos. As colocações
tardias e a chegada a uma nova escola e, para mim, muitas vezes a uma nova
terra, deixavam um certo vazio, uma certa falha, por não estar a cumprir com o
que eu era profissionalmente. Tendemos a identificar-nos com o que fazemos, ou
seja, a reconhecermo-nos no ofício. Aprendi, com o tempo, que estava errada. Todos
nós somos outra coisa. A profissão é o que se faz e não o que se é. Seremos as
mesmas pessoas se mudarmos de ofício. Talvez a profissão possa contribuir para
o que cada um de nós é, mas não nos define. No entanto, essa ausência de rotina
deixava o seu vazio.
Terei de me lembrar deste texto,
quando o despertador começar a tocar cedinho e eu o amaldiçoar em silêncio, em
pensamento, por incapacidade de verbalização matinal. E lembrar-me das palavras
do meu “aborrescente” que, pelos vistos, aprecia a rotina diária de tropeçar
com a mãe e a irmã na cozinha, para tomar o pequeno-almoço, trocando apenas um
bom-dia quase inaudível. Entenda-se: a mãe saúda e obtém de volta uma espécie
de grunhido, que devolve o cumprimento. Os adolescentes rapazes quase não
falam. Menos ainda ao pequeno-almoço. Todos agradecemos o silêncio matinal até
que o café cumpra com a sua missão de nos ajudar a salvar o dia.
Um dia, sentirei falta desta rotina e
até do grunhido… Que fazer na falta delas? Não nos sobra outra alternativa
senão a de criar outras…
Chegou setembro, cheio de melancolia
trazida pela chuva a lembrar o outono e eu sou primavera/verão… Tempo, para
mim, de criar outras rotinas até que as próximas férias de verão nos separem.
Está quase a chegar o outono/inverno
e eu sou primavera/verão…
Bom recomeço para todos.
Nina M.
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