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sábado, 15 de abril de 2023

Crónica de Maus Costumes 321

 

E a luta continua…

                Luís Sottomaior Braga, professor de História e subdiretor de um Agrupamento de Escolas da Abelheira, em Viana do Castelo, encontra-se em greve de fome desde as 24h00 de segunda-feira.

            Já lhe agradeci o gesto, através das redes sociais, assim como a sua determinação, força e coragem na defesa da escola pública e de todos os professores. O Luís faz o que eu não conseguiria fazer. Como diz alguém: “Viva a fartura que a fome, ninguém atura!” Eu aturo mal a fome. Se a sinto, tenho de a saciar naquele momento e pode ser até com pão seco! Não importa se a refeição que vai ser servida prestes é um manjar… Quero é consolar o estômago que se lamenta da falta de alimento e, depois, se não apetecer comer tanto, come-se menos ou nada. Com a fome, chega a impaciência e a irritabilidade; também é verdade que depois de uma certa altura, se não alimentarmos o corpo, a sensação de fome parece desaparecer. De qualquer forma, sei que não seria fácil colocar-me nessa situação. Para além deste incómodo, há todos os riscos que uma greve de fome implica. Certo é que esta decisão foi tomada por um conjunto de pessoas. O Luís dá o corpo às balas, mas há um grupo de retaguarda que lhe presta todo o apoio e que merece também o nosso agradecimento.

            O colega em questão não é consensual. Pelo que percebo e vou lendo, há os que dele gostam e os que o detestam. Há quem o acuse de uma certa hipocrisia, pois defende com afinco a sua classe, o que é inegável, mas no exercício das suas funções, acusam-no de autoritarismo e alguém que cria mau ambiente na escola. Não teço juízos de valor sobre quem não conheço e eu não conheço o colega. Certo é que o Luís foi um dos professores representantes da Iniciativa Legislativa de Cidadãos (ILC), tendo sido o porta-voz na audição da Comissão da Educação e da Ciência (CEC), em 2019, tendo defendido sem medo e sem papas na língua a recuperação do tempo de serviço, perante a arrogância insuportável e bacoca dos deputados que estavam presentes. Estes senhores esquecem-se          que ocupam os lugares com os votos dos cidadãos (muitas vezes uma minoria de cidadãos votantes) e que foram eleitos para os servirem e não para se servirem deles. Depreendo, pelo que vou lendo, na maioria, textos escritos pelo punho do próprio Luís, que se trata de um colega com uma cultura muito acima da média e com um conhecimento bastante sólido de legislação, quer pela natureza do cargo que ocupa, quer pela formação em administração escolar quer pelo curso de Direito que também chegou a frequentar, mas que não concluiu. Não que o seu currículo possa interessar para o efeito, mas também não se pode esquecer que é um elemento de uma direção a desencadear ativamente várias formas de luta. O Sottomaior Braga tem contribuído com ideias e tem espoletado várias formas de luta e não é de agora. Quem acompanha o movimento dos professores e as razões do seu descontentamento há muito lê ou ouve o colega. Foi um dos intervenientes, juntamente com o Paulo Guinote, num debate televisivo sobre a escola pública e que teve como convidada a Maria de Lurdes Rodrigues, que teve a desfaçatez de dizer que não sabia como se tinha chegado até aqui, no que concerne a falta de professores. Há muito que se pode acompanhar o Sottomaior Braga através do facebook. Certo é que nunca o vi desistir da luta começada ou deixar de lutar. Essa determinação e essa coerência têm de lhes ser concedidas. A partir deste momento, creio que o colega pode ficar de consciência tranquila quanto à sua participação no movimento pela dignificação da carreira docente.

            Ao longo da semana, o Luís foi sendo noticiado. Obteve alguma visibilidade, mas a luta da classe começa a desinteressar à Comunicação Social. O objetivo, dito pelo próprio, não é tanto a visibilidade nos media, mas espoletar uma ação política do senhor Presidente da República, apelando ao veto do diploma dos concursos, que não obteve qualquer acordo com nenhuma das organizações sindicais. Este gesto seria significativo, mas até ao momento, o senhor Presidente da República não teve tempo de dirigir umas palavras ao professor em greve de fome. Ele, que comenta tudo sobre todos, que está sempre disposto a tirar umas fotos com o populacho, porém, neste caso concreto, faz-se de cego, de surdo e de mudo, porque na falta de argumentos para justificar o que o Governo faz aos seus professores, vale mais o silêncio. Alguém tem de ser sacrificado em nome da estabilidade. Portanto, ficamos com a sensação de que esta maioria incompetente pode fazer o que bem entender, que não há escândalo capaz de fazer com que o senhor Presidente dissolva a Assembleia. Podemos desperdiçar milhões em indemnizações, podemos fechar os olhos a nomeações de familiares, às mentiras, perdão, à falta de memória de um governante que não se lembrava de ter sido informado sobre o que quer que fosse relativamente à senhora Reis, enfim, podemos relevar quase tudo, exceto a possibilidade de eleições antecipadas. Este Governo está a merecer há muito um enorme puxão de orelhas e de ser travado em relação a algumas opções políticas. Compete ao Presidente da República esse papel. Se entende não o dever fazer, entendo eu tal comportamento como cumplicidade e acordo com a ação governativa.

Os professores pedem o veto do diploma, senhor Presidente. Estão de olhos postos em si. O professor em greve de fome fê-la com esse propósito: sensibilizar para o problema e desencadear uma ação política, mas palavras não chegam, professor Marcelo. Precisamos de ações concretas. Mostre com ações que a razão está do lado dos professores, como já declarou. Sem tergiversar, sem meias-verdades e com toda a consciência. Uma palavra dirigida ao colega corajoso também não lhe ficaria mal.

 

Nina M.

 

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