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sábado, 26 de novembro de 2022

Crónica de Maus Costumes 301

 

Bibota, o gigante!

            Cinco campeonatos, três taças, uma taça de campeão europeu, uma supertaça europeia, uma taça intercontinental. São estes os triunfos coletivos com a camisola do Futebol Clube do Porto envergada e o eterno número nove estampado. Seis vezes o melhor marcador do campeonato, duas botas de ouro, 451 jogos e 355 golos. É este o palmarés desportivo do gigante que, hoje, deixou a família portista destroçada.

            A crónica de hoje não poderia ser outra. Teria de ser dedicada ao meu único ídolo dos tempos de criança: Fernando Gomes. Já anteriormente, eu escrevi sobre o bibota e não quero repetir-me. Nunca conheci o capitão, número nove. Nunca tive oportunidade de lhe dirigir a palavra e, no entanto, a sua partida significa deixar um lugar vazio no coração que só ele poderia ocupar. Escrever sobre o bibota é recuar no tempo e recordar a idade da inocência e a pureza. É lembrar dos penáltis marcados no sofá que servia de baliza e dos gritos de golo, como se estivessem a ser relatados, com o nome Fernando Gomes no final. É lembrar que não admitia que alguém se atrevesse a criticar o meu ídolo e que nem mesmo quando surgiram outros com fogo nos pés e que fizeram história no clube, como Rabah Madjer e Paulo Futre conseguiram destroná-lo no meu apreço. Escrever sobre o Gomes é recuar a 1987 e à final de Viena, na qual não pôde jogar por lesão e à qual assistiu pela televisão com Lima Pereira, também lesionado. A sua equipa ganhou-a por ele, com a assinatura do calcanhar de Madjer e de Juary, a arma secreta. É lembrar do despertador para as quatro da manhã para ver o jogo da taça intercontinental. Essa, o Gomes não falhou e marcou um dos golos; o outro foi do Madjer. Escrever sobre o Gomes é voltar à magia pueril onde os heróis são perfeitos. De maneira que depois do Gomes não voltei a ter qualquer ídolo. Nem mesmo na adolescência, em que os atores, jogadores ou cantores da moda faziam as delícias das meninas. Nada. Houve outros jogadores do FCP que me granjearam e granjeiam a admiração, mas nenhum deles foi capaz de ocupar o lugar do capitão, número nove.

            Lembro-me de contar isto a um colega portista. Lecionava em Chaves e ele, a certa altura, lá deixou escapar que era vizinho ou conhecia o bibota, já não me lembro bem… Sei que nunca mais esqueci a sua frase quando, em tom muito sério, deixa cair que o futebol é irracional, porque se fosse racional, só haveria portistas… Ri-me muito com a tirada. Olhei-o e disse-lhe que o Gomes era o meu ídolo de infância. Eu gostava tanto dele! E lá levou com a história dos penáltis e de eu encarnar o Gomes e os meus irmãos que nem tentassem ficar com o nome do capitão! Já se riam e já sabiam que o nove era meu! Garantiu que quando se cruzasse com ele lhe contaria, porque ele ficava feliz com estas histórias. Não cheguei a saber se o fez, mas, neste momento, e apesar de não mudar nada, espero que tenha tido a oportunidade de lho dizer.

Não sou de ídolos, mesmo agora. Não idolatro ninguém, porque com a queda do anjo em nós percebemos os pés de barro dos humanos. Há gente que admiro muito e com reverência, mas a paixão esgotou-se com o capitão. Mesmo quando saiu para o Sporting, onde jogou as suas duas últimas épocas, e me deixou de coração partido, gostava que o Gomes brilhasse, apesar de querer as vitórias do FCP. O lugar ídolo é seu por direito. Sempre foi.

Hoje, quando me deparei com a triste notícia, os meus olhos embaciaram, rasos de água. O nosso capitão não venceu a luta final contra a doença que o consumia. Parte a matéria, fica a memória e o legado. Para sempre eternizado no museu do clube e no coração dos portistas, em especial daqueles que com ele cresceram. Gostaria que o número nove não voltasse a ser usado no FCP, após o término da época, em sinal de respeito pela memória do maior goleador da história do clube.

Para mim, será sempre o meu único ídolo. Agradeço-lhe todas as alegrias, todos os golos de dragão ao peito, toda a dedicação ao seu clube.

Descansa em paz, eterno bibota. Um senhor! Dentro e fora de campo.

 

Nina M.

 

 

 

 

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