O Homem e a sua inexpugnável estupidez
Vi, hoje, nas notícias, tal como
muitos de vós, com repugnância e revolta, a vandalização premeditada do Museu
do Prado e de um dos quadros de Goya, com a intenção de sensibilizar a
sociedade para a questão do aquecimento global. A ação concertada repetiu-se
por outros lados, com o mesmo objetivo.
Por mais que as questões ambientais
suscitem a minha preocupação e a minha simpatia, não deixei de sentir repúdio
pelo ato de vandalismo e pelos seres que o perpetraram. O Prado é património
dos espanhóis, mas também de toda a humanidade e querer chamar a atenção para
as alterações climáticas, por meio de ações selvagens é de uma indignidade
inqualificável! Temos o dever de proteger o Planeta e a Natureza, mas a arte é
também uma expressão da natureza humana e não é meramente uma manifestação
cultural, mas a epifania transcendente do Homem, que lhe permite tornar
tangível o sublime. A arte, independentemente da forma escolhida para a sua
concretização, é a suprema realização humana! Não compreendê-lo e, sobretudo,
ofendê-la é um comportamento simiesco, que em nada abona em favor dos
executantes. Portanto, meus caros, os que se atrevem a profanar o que de melhor
o Homem é capaz de produzir não passam de uns símios, independentemente, das
suas razões. Talvez o planeta agradecesse a sua não existência.
Esta conduta faz-me recordar a
conversa com o meu adolescente de quinze anos, que afirmava categoricamente que
mais valia o Homem não ter evoluído, porque apesar do incremento intelectual,
continuava estúpido. Eu concordo em parte, isto é, o Homem continua parvo. Quis
saber o havia por detrás da sua declaração. Começa, então, por explicar que o Homem
vai destruir-se a si mesmo, uma vez que vai destruir o planeta e, por
consequência, a espécie. Acrescentou que os homens vivem para se explorarem
mutuamente, com a ambição do dinheiro e que talvez os primitivos fossem mais
felizes. Não havia ambições económicas desmedidas. Rebati o seu argumento, já
que é a melhor forma de o fazer pensar e desenvolver um raciocínio. Lembrei-lhe
que as gerações mais recentes, aquelas que já foram educadas para terem
preocupações ambientais e desenvolverem comportamentos amigos da Natureza,
talvez sejam as que comportam maior pegada ecológica. São os incapazes de
andarem cem metros a pé, os que trocam de telemóvel a cada ano, os que não
abdicam um pouco do seu conforto… Reforcei que não imaginava o retrocesso
civilizacional, porque já ninguém está disposto a voltar ao tempo das cavernas.
Se ficar sem as tecnologias, que são já uma quase extensão do seu corpo, é para
elas um terror, que dizer do restante… Afirmei que a estupidez humana vivia ao
lado da inteligência e que o necessário era que a última vencesse.
Acabou a sua intervenção com um
suspiro, afirmando que todos iríamos morrer, logo a vida é inútil. Olhei séria
para ele e vi-lhe a angústia da existência, na puerilidade dos seus quinze
anos. Respondi que enquanto isso não acontece, enquanto o fim não chega, a
nossa missão é fazer com que nos cumpramos na vida, dar-lhe um sentido e um
propósito. O que acabava de me dizer, a constatação do absurdo que também
preenche os nossos dias era uma questão filosófica que tinha assolado os
existencialistas do século passado, logo era um assunto muito importante e que merecia ser por ele pensado.
Aproveitei para lhe dizer que tinha de estar atento para descobrir o atribuía
sentido à sua vida. Sei a razão da sua angústia: reconhecer a importância do estudo
e de pouco gostar de estudar. A tremenda dificuldade que representa para ele contrariar
a sua preguiça e abdicar dos seus prazeres. Não me ocorreu falar-lhe dos estoicos
nem das virtudes de Aristóteles, talvez noutra altura se proporcione. Procura o
teu talento e talvez descubras um dos sentidos que justifique a tua existência e
atribui-lhe um propósito, porque todos temos algum sem que, muitas vezes, seja algo
propriamente palpável. Uns concretizam-nos através da arte, outros pelo desporto,
outros pela capacidade de pensar, outros pela sua extrema generosidade… As possibilidades
são muitas, meu adorado filho, procura e descobre para que não te sintas perdido.
Ouviu-me. Não respondeu. Não sei o que
pensou. Sei que é demasiado cedo para tão grande descoberta. Espero que descubras
a estupidez que em todos mora e a saibas contrariar pelo uso da razão.
Nina M.
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