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sábado, 22 de janeiro de 2022

Crónica de Maus Costumes 262

 

 Panorama Político

          Atualmente, olhar para o painel dos políticos que se gladiam na arena televisiva para tentarem conquistar o nosso voto é um desconsolo. Mil vezes a “Quadratura do Círculo” ou “Circulatura do Quadrado”, como se designa agora, por imperativo de mudança de canal. O programa conta com a presença assídua do Pacheco Pereira, do Lobo Xavier e perdeu com a morte repentina do Jorge Coelho. A bem da paridade, o seu lugar foi ocupado pela Ana Catarina Mendes, mas devo confessar que não gosto tanto desta última.

           Parecem-me mais carismáticos estes senhores, que já tiveram responsabilidades políticas noutros tempos, do que qualquer outro candidato atual. São comentadores políticos, mas prestam melhor serviço por discutirem ideias com civismo e educação, sem ruído, do que muitos do que estão sentados na Assembleia. Na minha opinião, a senhora Ana Catarina Mendes ainda evidencia uma ligação umbilical forte ao partido, que inviabiliza maior arrojo na discordância, se for caso disso. Evidentemente, cada um deles tem a sua preferência partidária (todos as conhecemos), mas têm também a liberdade para do partido discordar, sem seguir uma cartilha. Depois, são homens absolutamente cultos. Oradores exímios e seres pensantes. Gosto particularmente de Pacheco Pereira, que foi uma espécie de “enfant terrible” dentro do seu partido, por não se deixar coartar na sua liberdade. São homens que conhecem a História e a Literatura e que, nessa justa medida, me cativam. Não se veem mais homens ou mulheres carismáticos: um Adriano Moreira, um Freitas do Amaral, um Mário Soares ou um Álvaro Cunhal ou Manuel Tiago (se preferirem o pseudónimo literário, que ainda não li), de cuja ideologia me afasto, mas a quem reconheço a coerência e que não deixa de causar admiração… Faz-nos falta um General Ramalho Eanes de ar sisudo, mas convincente e é doloroso ter-se perdido uma Natália Correia, uma mulher enorme, uma açoriana cheia de cor, de exuberância e de poesia, num Portugal cinzento e triste. Alegrava a capital e promovia a cultura no seu “Botequim da Liberdade”… Ó escândalo! Houve depois uma Sophia, sempre discreta, uma senhora clássica, o oposto de Natália (dizem as más línguas que não se estimavam… Coisas entre duas musas da poesia…) mas nitidamente deslocada no hemiciclo, longe do lugar que lhe era mais natural: a sua poesia.

O último D. sebastião terá sido Francisco de Sá-Carneiro, a quem a morte, supostamente acidental, elevou a mito. O homem sobre quem depositaram todas as esperanças, num Portugal recém-democrático. Eu tinha cinco anos aquando a morte de Sá-Carneiro e lembro-me perfeitamente da consternação dos meus pais ao ouvirem a notícia da sua morte, na pequena televisão a preto e branco. Eu estava no cimo das escadas, dependurada na grade, junto à marquise (que, pelos vistos terá sido mandada fazer para sossego da avó, que se via aflita com a menina da casa, que corria desenfreada e poderia cair da varanda abaixo) e perguntava se tinha morrido o senhor Carneiro, aquele a quem eu já dera um beijo, no aperto opressivo de uma multidão, ao colo de uma das minhas primas, já moça casadoira. Os políticos, naquele tempo, moviam multidões… Lembro-me, mais tarde, das eleições para as presidenciais entre o Freitas do Amaral e o Mário Soares. Houve segunda volta e Mário Soares venceu. Tinha, nessa altura onze anos. O país inteiro estava mobilizado e até nós, miúdos, sem nada perceber e sem argumentação sólida e de qualidade, discutíamos política. Porém, o país tinha saído de uma ditadura e a liberdade era valorizada. Não sei por que motivo tenho estas memórias tão presentes, apesar da tenra idade… Tenho a certeza de que não serei a única. Ainda no outro dia lia uma entrevista ao deputado europeu socialista, Sérgio Sousa Pinto, por quem nutro simpatia, que dizia o mesmo… Cresceu a ouvir falar de política. No caso dele, cresceu no epicentro político. Como não apreciar alguém que escolhe como heróis Churchill, Orwell, Mário Soares e Vasco Pulido Valente?! O último nome causa-me um sorriso, pela distância ideológica que os separa! A simpatia não era a melhor qualidade do filósofo que se doutorou em História.

Para além disso, há duas ou três perguntas fundamentais que ficaram por fazer aos candidatos nas entrevistas televisivas: O que andam a ler no momento? Que livros e autores destacariam como essenciais? Quem são os seus heróis?

A resposta a estas perguntas ajudar-me-iam a tomar uma decisão. Temo que o Diabo as pudesse tecer e ouvir como resposta que a leitura do momento seria o programa político do partido ou um livro de autoajuda, do género: “Saiba como tornar-se um líder carismático”! Valha-me Deus… Ou o Diabo!

 

Nina M.

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