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sábado, 3 de novembro de 2018

Crónica de Maus Costumes 105


 Crónica de Maus Costumes 105

Amor nos Tempos de Cólera
(Que Gabriel García Márquez me perdoe e que abre com esta frase deliciosa: Era inevitável: o cheiro das amêndoas amargas lembrava-lhe sempre o destino dos amores contrariados.)
Acredito em absoluto que a solução para o mundo horrendo em que vivemos só pode ser o amor. O amor deveria fazer parte do currículo escolar. Ser injetado, macerado e trabalhado à exaustão, numa tentativa, que esperaria não ser infrutífera, de combate ao cinismo. Só com a contaminação dos mais pequenos pela bondade se pode contrariar uma série de coisas.
A educação, instrução e cultura são manifestamente insuficientes. Seria expectável que durante o século XXI, em plena era de avanço tecnológico, o ser humano conseguisse resolver o mais elementar problema do mundo: a fome. A míngua de uns por oposição à opulência desgovernada e vergonhosa de outros… O que aconteceu com o ser humano para não se deixar dilacerar pelas imagens chocantes que chegam à velocidade da luz, até nós?!
Um exemplo bastante elucidativo: recebi um vídeo escabroso, horrível, em que se pedia para ser repassado, no sentido de tentar encontrar o carrasco malfazejo. Retratava um bebé, teria por volta de um ano, sentado numa cadeira própria para fazer a sua refeição. Não chorava, não fazia barulho. Absolutamente tranquilo. Subitamente, sem razão, a não ser a crueldade pura e visceral, é agredido consecutivamente com bofetões e outras violências. Naturalmente, a criança chorava copiosamente. Não o vi até ao final, por ter ficado com um nó no estômago e náuseas. A maldade gratuita é capaz de me causar sintomas físicos. Nessa altura, a minha famigerada condição humana e vil esqueceu o amor e só me apetecia poder retaliar na exata medida das coisas. Eu sei. O amor não é isso, mas há gente que não o entende e não o merece e, por isso mesmo, nem gente é! Como se explica a violência gratuita?! Como se explica o fenómeno da maldade, da crueldade e do cinismo que se compraz na dor alheia?
Sobre o amor, nos seus mais variados sentidos, do mais lato ao mais restrito, já tenho pensado e é bom e recomenda-se em doses mesmo absolutamente exageradas, por não haver contraindicações. Porém, a maldade… Como explicá-la? Serão todos os que a praticam psicopatas ou sociopatas a quem não pode ser imputada toda a responsabilidade, uma vez que são fruto de erro biológico?!
O que dizer da experiência da artista sérvia, Marina Abramovic, que se sujeitou a estar durante seis horas imóvel e exposta, numa sala, onde a plateia poderia interagir com ela da forma como entendesse. Havia uma uma mesa colocada na sala com vários objetos: tintas, rosas, lâminas e até uma arma carregada. As pessoas, inicialmente, apenas observavam de perto, mas, depois, rapidamente perderam o controlo e a artista foi pintada, cortada, despida, molestada, até a performance ter sido encerrada pelos seguranças. Como explicar esta reação?
Efeito matilha? Banalização do mal e desresponsabilização pela sua prática em grupo? Qual a necessidade do ser humano em causar dor ao outro propositadamente, de forma gratuita, sem sequer retirar qualquer benefício?!
Não entendo e só me encho de perplexidade. Por que razão ninguém lhe falou? Ou agarrou a mão? Ou lhe depositou um beijo com carinho?
Há estudos científicos que apontam para o gene da bondade, certamente também haverá o do sadismo e que, ao que parece, se dissemina bem mais facilmente, para desgraça da humanidade.
Na realidade, designar de humanidade a espécie que de humano não tem nada é um belo paradoxo!
Nina M.

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