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sábado, 1 de fevereiro de 2025

Crónica de Maus Costumes 406

 

Diz que parece uma crónica futebolística

            Quem me conhece razoavelmente sabe o meu gosto futebolístico, que nunca escondi nem escondo. Parafraseando a minha tão querida amiga “Dra. Isabel”, como carinhosamente a tratava desde os tempos de caloira, “herdei o bom gosto do senhor meu pai” e tal como ela, que ia lembrando o pai que já tinha partido para lugar melhor, dos triunfos dos dragões, chegou o momento, querida Isabel, de te dizer que atravessamos o deserto, mas que estou esperançosa no futuro. Roma e Pavia não se fizeram num dia, mas estou certa de que o nosso FCP continuará a dar-nos alegrias, apesar do momento difícil que vivemos. Se há coisa que caracteriza o ADN do clube é nunca desistir das suas ambições.

            Parece que às vezes o meu excelente gosto pelo clube, aliás, bem herdado de família: pai, mãe e irmãos e, agora, filhos e sobrinhos para lhe dar continuidade, vai desgostando algumas pessoas, mas isso… Paciência… Não sou responsável por expetativas alheias.

            Esta semana aconteceu algo que me fez rir, mas também refletir a propósito do ocorrido. Comentei a publicação de um colega, a propósito da vitória da seleção portuguesa de andebol contra a Alemanha, que mostrava o último golo marcado por Portugal e que garantiu a vitória e o apuramento. A par das imagens, havia uma pergunta: “Como é que se descreve um sentimento destes?” Oh! Nada mais fácil para mim! A primeira coisa que me ocorreu e escrevi no comentário, dirigido ao meu colega, que, casualmente, tem o mesmo bom gosto futebolístico, duplamente azulado, pois também o clube da sua terra escolheu esta bela cor. Sem hesitar, respondi que descrevia muito facilmente: Kelvin, minuto 92!

            Obviamente, não sendo ingénua, sabia dos riscos, mas às vezes, talvez seja um bocadinho Kamikaze… Não faltou muito tempo para alguém considerar inapropriado o exemplo, pois claro, e replico as palavras do autor: “comparar Portugal ao Porto, não só é despropositado como é muito baixo. Mais respeito pela Seleção!” Lá tive de explicar ao senhor que eu não comparava o FCP à Seleção, mas o sentimento perante uma vitória difícil e importante ao cair do pano! E que poderia ainda citar como exemplo a Liga dos Campeões, conquistada em 87, depois de uma reviravolta no jogo, com o magnífico calcanhar de Madjer, que imortalizou para sempre esse jogo. Portanto, a alegria sentida pelos jogadores da seleção portuguesa de andebol deve ter sido semelhante àquela que eu senti nos momentos referidos. Era disso que falava a publicação, como descrever esse sentimento. Obviamente, não adiantou de nada, continuei a ser acusada de clubite para justificar o meu sentimento em relação à Seleção. O senhor não percebeu nada (e não fui eu que não me fiz entender). Nem sequer estava em causa o meu sentimento pela seleção e a sua justificação, mas apenas a capacidade de compreender muito bem os sentimentos daquela equipa, naquele momento, por comparação a vivências e alegrias semelhantes ou até maiores, porque o minuto 92 do Kelvin valeu um campeonato, um troféu, ao contrário do jogo da Seleção. Ri-me bastante com o sucedido. Nunca me irrito neste casos, porque bem analisado, a clubite e a mágoa eram do senhor. Ele é que interpretou como uma comparação entre o clube e a seleção e, depois, veio a mágoa, porque o meu clube, referenciado através de exemplos, feriu de morte, ao ponto de deixar de joelhos o timoneiro do clube do seu coração. Na verdade, acusou-me daquilo de que ele próprio padece e mostrou a sua incapacidade para compreender o que eu, cristalinamente, escrevi: a alegria dos jogadores portugueses terá sido igual à que eu mesma senti no final daquele jogo, concretamente, no minuto 92. Foi isto o que eu disse. Foi isto que o senhor não percebeu ou não quis perceber.

            No entanto, a partir daqui, pude elaborar outros raciocínios… As pessoas tendem a querer moralizar as emoções e os sentimentos alheios. Note-se que ao acusar-me de baixeza por comparar o Porto à Seleção (interpretação errada da sua parte) e de me sugerir mais respeito pela mesma, é o mesmo que me dizer que, obrigatoriamente, eu tenho de valorizar mais a seleção do que o FCP! Com que direito e por que razão me recrimina por não ter a sua visão de mundo? Isto é o mesmo que dizer que sou obrigada a gostar mais dos escritos de Saramago do que dos de Victor Hugo ou Dostoiévski, porque o primeiro é português e os outros, não! Homessa! Não haveria de faltar mais nada!

Vamos ver se a gente se entende… Podemos educar e exercitar a consciência e a racionalidade, podemos educar comportamentos, mas os sentimentos e emoções, esses têm vida própria e são rebeldes. Podemos falar em maus sentimentos: ciúme, inveja, ódio, frustração, entre outros… Sabemos que são prejudiciais e, nesse caso, podemos fazer um trabalho de racionalização e de consciência para que esses sentimentos não conduzam a efeitos destrutivos. No entanto, apesar do trabalho que possamos fazer sobre eles, eles não desaparecem nem deixam de existir por decreto. Não adianta tentar moralizar o sentimento da inveja. Ele não se vai embora. Devemos é saber lidar com ele. Reconhecer que é um mau sentimento, que ele reflete o fracasso do próprio e fazer da fraqueza força. Poderemos dominar os nossos comportamentos se o caso se justificar, mas nunca os sentimentos e se os mascararmos, ninguém tenha ilusões sobre isso, estamos a agir de má-fé para connosco mesmos e a enganarmo-nos a nós mesmos.

            Assim, o indivíduo que se achou no direito de me fazer um reparo moral não o fez por paixão à seleção de andebol, mas antes por paixão ao seu clube (que eu compreendo e, por isso, relevo), mas não lhe concedo o direito de me dizer como eu tenho ou devo sentir, ainda para mais numa questão que não traz qualquer prejuízo a quem quer que seja!

            Para ser mais cristalina, para mim, no desporto, a minha paixão é tão somente o FCP! Gosto muito do Paços de Ferreira e também da Seleção e desejo sempre que ganhem, mas não me façam escolher, porque ao contrário de muitos, não tenho quaisquer pruridos morais em relação a isso! Vibro muito mais com as grandes conquistas do FCP do que com as da Seleção! E nem se deem ao trabalho de me dizerem o que quer que seja. É uma questão de sentimento e eles não são moralizáveis nem negociáveis. O coração fica com quem lhe acende a alma. Desportivamente, quem mais me acende a alma é o FCP. Sempre foi. Sempre será.

Se assim não fosse, a esse mesmo senhor que me quis puxar as orelhas, poderia dizer-lhe que alguém que é natural de outro distrito do Norte do país, é imoral ser benfiquista, que deveria ter escolhido o clube da sua região. Certamente, não estará de acordo e talvez, se tiver a capacidade de ser verdadeiro consigo mesmo, talvez conclua que gosta mais do seu clube do que da Seleção. Também poderá não ser assim e eu aceito com naturalidade. Não aceito é que me queira impor regras ao meu sentir ou tecer juízos fundamentados numa moral bacoca! Não haveria de faltar mais nada!

            Concluindo: compreendo muitíssimo bem a alegria dos jogadores de andebol. Felizmente, já a senti várias vezes enquanto adepta, das quais se destacam o minuto 92, final de 1987, final de 2003 e de 2004. De intensidade menor, mas ainda assim bastante alegria, todas as subidas de divisão do Paços e o euro de 2016.

            Gosto de ser correta, mas gosto pouco do politicamente correto.

Nina M.

P.S. Isto não é sobre futebol.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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