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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Oração



Como fina flor
Em solo fértil
Assim repousa o meu coração
Deitado sobre as Tuas mãos
À espera de reanimação
Essa esperança tão ânsia
Desígnio dos crentes

sábado, 22 de fevereiro de 2025

Crónica de Maus Costumes 409

 

(Des)governos…

            A crónica de hoje chega com atraso, mas vem sempre a tempo, porque neste país, normalmente, não se acautela para evitar que o pior aconteça, ou seja, não se aposta na prevenção, há é sempre uma reação ao problema e a escola pública é sempre um exemplo fácil…

            Há vários anos, os sindicatos alertaram para o problema que as escolas vivenciam neste momento: a falta de professores em determinadas zonas do país, mas que se alastrará a outras, fruto do envelhecimento da classe docente. Ninguém ouviu e pior, os professores foram diabolizados, enxovalhados, quis ganhar-se a opinião pública, que continua ganha, mas a que preço e com que custo para o país e os mais jovens!

            Entre 1990 e 2005, Portugal fez um esforço sério por formar profissionais competentes e profissionalizar os que já estavam no sistema, mas que não eram professores. Surgiram os cursos via ensino (o caso do meu), que obrigava a quatro anos de estudo nos bancos da Universidade e um ano inteiro na escola, orientados por professores experientes, mas com duas turmas a nosso cargo. No total, ao longo do ano letivo, tive a modesta quantia de quarenta aulas assistidas, vinte a Português e outras tantas em Francês, quer na minha turma quer nas turmas dos orientadores, com os devidos seminários semanais e feedback do trabalho realizado. Tínhamos de entregar, antecipadamente, ao orientador, o plano e a descrição de aula. Nos seminários, fazia-se a auto e heteroavaliação das aulas assistidas e competia ao orientador elaborar o relatório avaliativo pormenorizado do avaliando. Os ainda universitários eram postos no terreno, com acompanhamento, exercendo também a função de secretários de uma direção de turma para aprenderem o pragmatismo do ofício e tinham, obviamente, assento nas reuniões de grupo disciplinar (na altura não havia departamentos). Com o tempo, para evitar pagar o salário de quinhentos euros aos estagiários, as regras do jogo foram mudadas. Os alunos em final de curso deixaram de estar na escola a tempo inteiro e o estagiário passou a ter de cumprir umas assistências nas turmas dos orientadores e, também, a ter de lecionar algumas aulas. Deixou de estar o tempo integral na escola, no terreno, a compreender e a apreender o seu funcionamento por dentro. Os últimos estágios remunerados, com os professores-estagiários a tempo integral, datam do ano 2005. No entanto, nos tempos seguintes, os estagiários que ainda apareciam eram de cursos via ensino, havendo a garantia de alguma qualidade. Neste momento, basta que alguém com curso superior, com um determinado número de créditos em certas disciplinas, se candidate a um mestrado em ensino e saem mestres… Da mula russa, acrescentaria… Acredito que as pessoas façam o seu melhor, mas acontece haver gente com cursos ligados à Higiene e segurança no trabalho a fazerem mestrados em Geografia, por exemplo, sem perceber nada de alguns conteúdos que têm de ministrar no 11º ou no 12º ano. Gente que escreve deploravelmente e os orientadores universitários pedem aos orientadores da escola que os ponham a escrever! Eu… Nem sei o que diga quando confrontada com estas realidades, que me vão fazendo chegar… Ou melhor… Penso no desperdício que se está a fazer e no bom trabalho que foi deitado pelo ralo. Não se forjam professores à pressa e sem qualidade, mas é o que está a acontecer. No tempo do excesso, exigia-se tudo e mais o que houvesse, no tempo das vacas magras, a qualidade dos profissionais não importa. O que interessa é manter a escola pública a funcionar para os pais depositarem as crianças e seguirem para o trabalho. Tudo o resto se esboroa na imbecilidade dos corredores do poder, esses senhores tantas vezes irresponsáveis, que não conhecem ou fingem desconhecer a realidade.

            Mais do que resolver bem os problemas que surgem, interessa continuar a fazer o mesmo com menos dinheiro, a qualidade do ensino, se diminuir, não vem mal ao mundo, siga a banda e as ideias peregrinas dos maestros!

            Este ano, com a implementação tão desejada do digital, decidiram facultar uma prova-ensaio, para ver a aplicabilidade da mesma. Suspeito que não passou de manobra de diversão, apesar da aparente preocupação… Ou seja, o plano está em marcha, as provas são para serem realizadas, fica bem para a opinião pública, dar a entender que se está a acautelar problemas, mas… Quer estes existam quer não, a decisão já está há muito tomada! Nem falo da fuga de informação sobre a prova nas redes sociais nem do facto de não terem sido realizadas no mesmo dia e à mesma hora para todas as turmas, nem sequer do facto de termos vinte e cinco alunos numa sala, dois a dois, com toda a facilidade para espreitar o computador do vizinho… Quem quer saber? É só uma prova-ensaio, mas ainda há quem entenda poder usá-la para avaliação… O nome ensaio deveria dizer tudo…

            Desvalorizando tudo o que atrás foi mencionado, por se tratar de um mero ensaio, vamos ao cerne da questão: apliquei a bendita prova a três turmas. Numa delas, só seis alunos conseguiram entregar; na outra, três não conseguiram entregar. Note-se que todos tinham tempo de fazer a prova, se a Internet funcionasse sem falhas… Acontece que não… Só numa das turmas, os alunos entregaram todos, mas ainda assim, as condições de igualdade não foram garantidas, porque nem todos iniciaram ao mesmo tempo, já que a Internet não o permitiu. Só uma turma de cada vez estava a realizar a prova, agora, imaginemos o que seria com todos os alunos de nono ano a resolver em simultâneo. Depreendo que consigam imaginar o problema… Pois bem, pelo que percebi, a minha escola não foi caso único…

Eis o meu espanto quando leio que o senhor ministro diz que houve alguns constrangimentos, mas que foram residuais e que as escolas resolveram! Não brinquemos com coisas sérias, senhor ministro! As soluções encontradas pelas escolas não poderão ser aplicadas no exame! Até à partilha de Internet, a partir de telemóveis se recorreu para se testar! O que deveria acontecer, no final do ano, caso os senhores não permitam que as escolas resolvam os problemas de alicerces (Internet funcional em todas as salas, sem quebras de maior), porque a casa não se começa pelo telhado, e se houver estes problemas “residuais” de uns alunos entrarem no primeiro minuto e outros passados apenas vinte, os pais deveriam responsabilizar e interpor um processo judicial ao MECI, por incapacidade de garantir a igualdade de circunstâncias para todos os alunos. Numa situação de exame, em que eles já estão, naturalmente, sob pressão, não precisam de fatores externos que os condicionem! Quando penso que já vi de tudo, o MECI continua a surpreender!

            No entanto, não chega este desvario… Os senhores ainda querem professores voluntários (o mesmo que dizer dispostos a trabalhar de graça, numa altura em que tratam das suas próprias avaliações) para a correção do item de resposta extensa! Para quê? Não queriam o ensaio? Está ensaiado e saiu uma valente porcaria! Deixem para lá as correções, porque ninguém quer saber! O que faziam bem era pensar em resolver verdadeiramente a questão e ou reforçam a Internet, porque a verba que chegou não foi suficiente ou voltem ao papelinho que dizem que é como o algodão: não engana!

 

Nina M.

           

 

 

 

 

 

sábado, 15 de fevereiro de 2025

Crónica de Maus Costumes 408

 

Noite de pesar para os portistas

               A crónica deste fim de semana seria sobre outra coisa, mas fui tristemente surpreendida pela notícia que sabia que haveria de chegar um dia…

A nação portista vê, hoje, sábado, dia 15 de fevereiro, aquele que foi o seu presidente, durante 42 anos, partir. É um dia triste. Seguir-se-ão as exéquias e a despedida final.

               Jorge Nuno Pinto da Costa, o Presidente dos presidentes, marcou a Instituição Futebol Clube do Porto, marcou sucessivas gerações de portistas, marcou uma cidade, marcou o país e a história do futebol português no panorama internacional (o que muitos não lhe perdoam).

               Indomável como a cidade que o viu nascer, o legado que nos deixa será, talvez, irrepetível, mas como o próprio presidente gostava de dizer: “ninguém diga impossível”. Pinto da Costa é um homem de paixões e foi a paixão pelo Futebol Clube do Porto, que começou a acompanhar no estádio, por influência de um tio, às escondidas da mãe, que norteou a sua vida para o bem e para o mal.

               Homem polémico, irónico, combativo ao centralismo numa época em que era imperioso fazê-lo (e em muitas coisas continua a sê-lo, nomeadamente, na cultura), nunca deixou nada por dizer. Acertou muitas vezes. Errou algumas. No legado que deixa aos portistas, o saldo é positivo, apesar da situação atual em que o clube se encontra. Se há princípio que Pinto da Costa deixa ao clube é o de nunca virar a cara à luta. Nunca desistir, porque as árvores morrem de pé. Acredito ter sido esse um dos motivos pelos quais decidiu recandidatar-se. Um erro de cálculo que lamento profundamente. Gostava que tivesse saído de outra forma, mas Pinto da Costa decidiu sair como viveu. Emocionei-me, na noite das eleições, apesar de entender que os resultados eram aqueles que melhor serviam os interesses do Futebol Clube do Porto, naquela altura, mas creio que todos os sócios e portistas sentiram alguma fratura na alma. Não era a despedida que queriam, mas foi a que o presidente escolheu. Talvez, por isso mesmo, sob o peso da derrota por número expressivo, o seu nome foi entoado no estádio, foi entoado enquanto se dirigia para o carro, visivelmente emocionado. O momento mais triste para todos. A partir de então, ainda agora, o universo azul não curou as feridas. Sirva a partida do maior símbolo do clube para a unificação da nação portista, para devolver as alegrias aos adeptos e para honrar o legado que nos deixa.

               O futebol é o só futebol, nada mais do que isso, mas apesar da sua insignificância nas coisas realmente sérias da vida, é capaz de proporcionar as maiores alegrias e as maiores tristezas. Com Pinto da Costa, os portistas provaram ambas, mas foram maiores as alegrias do que as tristezas. Para muitos, quase o único presidente que conheceram. Tomou conta do clube em 1982 e em 1985 (eu tinha dez anos) ganhou o seu primeiro título de campeão nacional, equipa liderada por José Maria Pedroto. Dois anos mais tarde, o Futebol Clube do Porto venceria a Taça dos Campeões Europeus, a Taça Intercontinental e a Supertaça Europeia. Vi as duas finais: o calcanhar mágico de Madjer e o golo da arma secreta: Juary, na primeira, e os golos de Fernando Gomes (o bibota) e, novamente, Madjer, na segunda. Com Pinto da Costa, o Futebol Clube do Porto viria a repetir a façanha, em 2004, sob o comando de Mourinho e, já em 2003, também Mourinho tinha vencido a Taça UEFA. Ganharia, ainda a Taça Intercontinental, sob a liderança técnica de Victor Fernández. O atual presidente, André villas-Boas, viria a vencer, enquanto treinador, a Liga Europa, em 2011. As conquistas internacionais do Futebol Clube do Porto, o clube português mais titulado internacionalmente, que tanto orgulha os portistas, foi conquistado durante a liderança do presidente que, hoje, decidiu descansar. Houve títulos nacionais, muitos! Muita alegria e muita euforia.

Sou grata a Pinto da Costa por todas as alegrias, especialmente, por ter visto o FCP agigantar-se nas competições internacionais e a vencê-las. Pinto da Costa, goste-se ou não, nasceu com uma capacidade de liderança invulgar e uma forma única de olhar para as questões. Em Tóquio, debaixo de neve, com o campo em condições dificílimas, Pinto da Costa quis jogar e as suas palavras para o árbitro foram decisivas: “o senhor tem a oportunidade de deixar o seu nome ligado a uma Taça Intercontinental. Caso se revele impossível, pode sempre cancelar o jogo por falta de condições ou pode decidir adiar sem sequer tentar.” O resto da história escreveram-na os jogadores, sob o comando técnico de Ivic.

Estas alegrias são inesquecíveis para um adepto e, mesmo hoje, o coração sorri quando as pensa. Por tudo isto, Pinto da Costa ganhou o carinho e o respeito dos adeptos. Por tudo isto é a figura maior do clube. Por tudo isto sempre será recordado com respeito e saudade. Por tudo isto lamentamos a sua partida e a sua despedida. Por tudo isto, o Dragão fica mais pobre sem a sua presença assídua.  Por tudo isto será inesquecível, ainda que também tenha errado, sobretudo, no último ano, mas como não esquecer e perdoar os deslizes de quem já deu tanto, de quem deu tudo de si?!

Guardo a imagem de um homem com a lucidez desarmante de olhar a morte nos olhos e de a enfrentar sem medo nem lamento, de olhar para trás e de ver uma vida cheia, com acertos e erros, como a de qualquer ser humano, mas que afirma, sem titubear, a sua satisfação de dever cumprido, com a tranquilidade de quem está preparado para partir quando a hora chegar.

Pinto da Costa era crente, portanto, Deus lhe dê o eterno descanso. Por cá, não haverá um portista que não o lembre, não haverá um portista que deixe esquecer o seu legado. Ao clube, associados e adeptos compete honrar o legado e a união que faz a força.

Muito obrigada, senhor Presidente! Até sempre.

 

P.S. Quem estiver a pensar em prestar a última homenagem, não se esqueça dos cachecóis e camisolas azuis brancas. Pedido do presidente.

 

Nina M.

              

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

sábado, 8 de fevereiro de 2025

Crónica de Maus Costumes 407

 

Crónica de um mundo ensandecido

               O Homem parece não querer curar a insanidade do mundo. À medida que nos adentramos na maturidade, ficamos com a sensação de que a realidade piora a olhos vistos, mas para usar uma expressão da moda, talvez não passe de um erro de perceção.

            Guerras sempre existiram. O século XX foi sangrento e o primeiro quarto deste século não está a ser melhor… No entanto, o cenário não é propriamente novo: a sede de poder, a luta pelo controlo e pela hegemonia económica continua a mesma e alguns dos atores também.  Os donos disto tudo não prestam e nunca prestaram e continuam a mexer as suas peças no tabuleiro de xadrez, para fazer o seu xeque-mate.

            A luta do Homem começa a ser a de dotar a sua vida de sentido e de propósito num mundo esquizofrénico. O problema é que a preservação da sanidade parece exigir o afastamento da mundanidade e a vivência de um mundo interior muito próprio. No entanto, não se trava a batalha sem perdas, pois não somos sozinhos, não subsistimos sozinhos, somos seres gregários e a nossa preservação depende da preservação da comunidade. Começa a ser verdadeiramente difícil olhar para os corredores do poder neste momento. O conflito israelo-palestiniano que parece não ter fim; a guerra desencadeada pela Rússia contra a Ucrânia; a luta pela hegemonia económica entre a China e os Estados Unidos da América; a vitória de Trump que deveria envergonhar todos os estadunidenses, uma vez que o país gosta de tecer loas à sua democracia. Eu continuo sem entender como um povo é capaz de eleger uma triste figura que admitiu ter fugido aos impostos, prejudicando todos os seus concidadãos e, sobretudo, ter incentivado um ataque ao Capitólio em que, para além de dano patrimonial, houve morte de pessoas. Não entendo como um país democrático, que revela imenso orgulho na sua democracia e na sua liberdade, possa permitir que um indivíduo, promotor de uma rebelião e assalto à casa da democracia, possa voltar a candidatar-se. Espanta-me que o sistema judicial o permita e espanta-me que um partido, para ganhar eleições, o escolha e o apoie. Não me espanta que alguns, muitos líderes deste mundo se predisponham a baixar-lhe as calças e a mostrar-lhe o rabinho. Esse loiro imbecil já queria anexar o Canadá e a Gronelândia e transformar Gaza numa espécie de Riviera americana com o apoio de outro troglodita, o Netanyahu! E o que pretendem fazer aos palestinianos? Acaso o genocídio levado a cabo não chega? A destruição massiva não é, por si só, castigo suficiente? A expansão sucessiva dos colonatos que mais não é do apropriação de terra palestiniana continuará até à expulsão total? O líder de um povo que repete o que outros fizeram com ele, no século XXI, não é digno de liderar ninguém.

            Estas ideias que nos parecem absurdas e que não são para serem levadas a sério, vindas de quem vem, devem deixar-nos alerta, porque um louco com poder é capaz de tudo e não faltam exemplos históricos a comprová-lo.

A diferença entre Trump, Putin, Netanyahu e Xi Jinping é nula! O valor maior é o dinheiro e o poder. Valores como humanismo, justiça, empatia, proteção dos mais frágeis passam-lhes ao lado. Não olham a meios para atingirem os seus fins. Se alguns livros terão lido, um deles terá sido, por certo, O Príncipe, de Maquiavel. Em caso de conluio entre Trump e Netanyahu para ocupação de alguns territórios de Gaza, se tal vier a acontecer, o mundo estará perante uma situação maior de hipocrisia inqualificável e nojenta. Espero, sinceramente, que o resto do mundo e, principalmente, a Europa não fique de braços cruzados, impávida e serena. Para além de que tal comportamento, seria uma espécie de carta branca para a China poder invadir Taiwan e um respaldo moral para a Rússia!

Eu sei que os estadunidenses só se preocupam com a economia, uma sociedade onde vigora um capitalismo selvagem, onde a ideia de sucesso se faz pela ostentação dos bens materiais que se possui, onde reina a tese da meritocracia sem atender à equidade, fazendo com que a população acredite que com muito trabalho todos podem melhorar a sua vida, mas infelizmente não é assim. Há outros fatores e circunstâncias decisivos, desde logo a sorte ou o azar ditado pelo meio onde se nasce. Trump nasceu com o rabo virado para a lua. Já era muito rico, antes de se tornar, muito, muito rico. É um privilegiado arrogante, que se afasta da elite intelectual, mais pobre do que ele, é certo, mas ao pé da qual não vale um chavo, conseguindo a simpatia de uma classe média e trabalhadora, por vezes ressentida com as dificuldades da vida e com as elites que deveriam garantir maior equidade, mas que falham no propósito. As elites têm, por isso mesmo, um trabalho reflexivo a fazer. Trump chega ao poder através da divisão e da polarização da sociedade, com a promessa de uma economia forte nem que isso implique falta de ética nas relações com os outros países. Eu desejo que o partido democrata se possa reencontrar rapidamente para fazer uma oposição séria e contundente a este lunático que aterrou, mais uma vez, na cadeira do poder.

Quanto aos europeus, a verdade é que não podem continuar a colocar o seu destino em mãos alheias e só uma Europa unida e fraterna pode ter condições para se bater de igual para igual com outras potências. A Europa de valores vincados, na única em que me reconheço: democrática, livre, culta, tolerante, respeitadora, mas que se faz respeitar, opositora a todo e qualquer regime autocrático, mais justa e mais equitativa na distribuição da riqueza que produz e promotora de paz.

Espero que soprem ventos favoráveis para os que sofrem os terrores deste tempo e quanto a mim, por vezes, apetece-me a imperturbabilidade dos jogadores de xadrez de Ricardo Reis, a ver se o consigo…

 

Nina M.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

sábado, 1 de fevereiro de 2025

Crónica de Maus Costumes 406

 

Diz que parece uma crónica futebolística

            Quem me conhece razoavelmente sabe o meu gosto futebolístico, que nunca escondi nem escondo. Parafraseando a minha tão querida amiga “Dra. Isabel”, como carinhosamente a tratava desde os tempos de caloira, “herdei o bom gosto do senhor meu pai” e tal como ela, que ia lembrando o pai que já tinha partido para lugar melhor, dos triunfos dos dragões, chegou o momento, querida Isabel, de te dizer que atravessamos o deserto, mas que estou esperançosa no futuro. Roma e Pavia não se fizeram num dia, mas estou certa de que o nosso FCP continuará a dar-nos alegrias, apesar do momento difícil que vivemos. Se há coisa que caracteriza o ADN do clube é nunca desistir das suas ambições.

            Parece que às vezes o meu excelente gosto pelo clube, aliás, bem herdado de família: pai, mãe e irmãos e, agora, filhos e sobrinhos para lhe dar continuidade, vai desgostando algumas pessoas, mas isso… Paciência… Não sou responsável por expetativas alheias.

            Esta semana aconteceu algo que me fez rir, mas também refletir a propósito do ocorrido. Comentei a publicação de um colega, a propósito da vitória da seleção portuguesa de andebol contra a Alemanha, que mostrava o último golo marcado por Portugal e que garantiu a vitória e o apuramento. A par das imagens, havia uma pergunta: “Como é que se descreve um sentimento destes?” Oh! Nada mais fácil para mim! A primeira coisa que me ocorreu e escrevi no comentário, dirigido ao meu colega, que, casualmente, tem o mesmo bom gosto futebolístico, duplamente azulado, pois também o clube da sua terra escolheu esta bela cor. Sem hesitar, respondi que descrevia muito facilmente: Kelvin, minuto 92!

            Obviamente, não sendo ingénua, sabia dos riscos, mas às vezes, talvez seja um bocadinho Kamikaze… Não faltou muito tempo para alguém considerar inapropriado o exemplo, pois claro, e replico as palavras do autor: “comparar Portugal ao Porto, não só é despropositado como é muito baixo. Mais respeito pela Seleção!” Lá tive de explicar ao senhor que eu não comparava o FCP à Seleção, mas o sentimento perante uma vitória difícil e importante ao cair do pano! E que poderia ainda citar como exemplo a Liga dos Campeões, conquistada em 87, depois de uma reviravolta no jogo, com o magnífico calcanhar de Madjer, que imortalizou para sempre esse jogo. Portanto, a alegria sentida pelos jogadores da seleção portuguesa de andebol deve ter sido semelhante àquela que eu senti nos momentos referidos. Era disso que falava a publicação, como descrever esse sentimento. Obviamente, não adiantou de nada, continuei a ser acusada de clubite para justificar o meu sentimento em relação à Seleção. O senhor não percebeu nada (e não fui eu que não me fiz entender). Nem sequer estava em causa o meu sentimento pela seleção e a sua justificação, mas apenas a capacidade de compreender muito bem os sentimentos daquela equipa, naquele momento, por comparação a vivências e alegrias semelhantes ou até maiores, porque o minuto 92 do Kelvin valeu um campeonato, um troféu, ao contrário do jogo da Seleção. Ri-me bastante com o sucedido. Nunca me irrito neste casos, porque bem analisado, a clubite e a mágoa eram do senhor. Ele é que interpretou como uma comparação entre o clube e a seleção e, depois, veio a mágoa, porque o meu clube, referenciado através de exemplos, feriu de morte, ao ponto de deixar de joelhos o timoneiro do clube do seu coração. Na verdade, acusou-me daquilo de que ele próprio padece e mostrou a sua incapacidade para compreender o que eu, cristalinamente, escrevi: a alegria dos jogadores portugueses terá sido igual à que eu mesma senti no final daquele jogo, concretamente, no minuto 92. Foi isto o que eu disse. Foi isto que o senhor não percebeu ou não quis perceber.

            No entanto, a partir daqui, pude elaborar outros raciocínios… As pessoas tendem a querer moralizar as emoções e os sentimentos alheios. Note-se que ao acusar-me de baixeza por comparar o Porto à Seleção (interpretação errada da sua parte) e de me sugerir mais respeito pela mesma, é o mesmo que me dizer que, obrigatoriamente, eu tenho de valorizar mais a seleção do que o FCP! Com que direito e por que razão me recrimina por não ter a sua visão de mundo? Isto é o mesmo que dizer que sou obrigada a gostar mais dos escritos de Saramago do que dos de Victor Hugo ou Dostoiévski, porque o primeiro é português e os outros, não! Homessa! Não haveria de faltar mais nada!

Vamos ver se a gente se entende… Podemos educar e exercitar a consciência e a racionalidade, podemos educar comportamentos, mas os sentimentos e emoções, esses têm vida própria e são rebeldes. Podemos falar em maus sentimentos: ciúme, inveja, ódio, frustração, entre outros… Sabemos que são prejudiciais e, nesse caso, podemos fazer um trabalho de racionalização e de consciência para que esses sentimentos não conduzam a efeitos destrutivos. No entanto, apesar do trabalho que possamos fazer sobre eles, eles não desaparecem nem deixam de existir por decreto. Não adianta tentar moralizar o sentimento da inveja. Ele não se vai embora. Devemos é saber lidar com ele. Reconhecer que é um mau sentimento, que ele reflete o fracasso do próprio e fazer da fraqueza força. Poderemos dominar os nossos comportamentos se o caso se justificar, mas nunca os sentimentos e se os mascararmos, ninguém tenha ilusões sobre isso, estamos a agir de má-fé para connosco mesmos e a enganarmo-nos a nós mesmos.

            Assim, o indivíduo que se achou no direito de me fazer um reparo moral não o fez por paixão à seleção de andebol, mas antes por paixão ao seu clube (que eu compreendo e, por isso, relevo), mas não lhe concedo o direito de me dizer como eu tenho ou devo sentir, ainda para mais numa questão que não traz qualquer prejuízo a quem quer que seja!

            Para ser mais cristalina, para mim, no desporto, a minha paixão é tão somente o FCP! Gosto muito do Paços de Ferreira e também da Seleção e desejo sempre que ganhem, mas não me façam escolher, porque ao contrário de muitos, não tenho quaisquer pruridos morais em relação a isso! Vibro muito mais com as grandes conquistas do FCP do que com as da Seleção! E nem se deem ao trabalho de me dizerem o que quer que seja. É uma questão de sentimento e eles não são moralizáveis nem negociáveis. O coração fica com quem lhe acende a alma. Desportivamente, quem mais me acende a alma é o FCP. Sempre foi. Sempre será.

Se assim não fosse, a esse mesmo senhor que me quis puxar as orelhas, poderia dizer-lhe que alguém que é natural de outro distrito do Norte do país, é imoral ser benfiquista, que deveria ter escolhido o clube da sua região. Certamente, não estará de acordo e talvez, se tiver a capacidade de ser verdadeiro consigo mesmo, talvez conclua que gosta mais do seu clube do que da Seleção. Também poderá não ser assim e eu aceito com naturalidade. Não aceito é que me queira impor regras ao meu sentir ou tecer juízos fundamentados numa moral bacoca! Não haveria de faltar mais nada!

            Concluindo: compreendo muitíssimo bem a alegria dos jogadores de andebol. Felizmente, já a senti várias vezes enquanto adepta, das quais se destacam o minuto 92, final de 1987, final de 2003 e de 2004. De intensidade menor, mas ainda assim bastante alegria, todas as subidas de divisão do Paços e o euro de 2016.

            Gosto de ser correta, mas gosto pouco do politicamente correto.

Nina M.

P.S. Isto não é sobre futebol.